“Bom dia, como está?”, perguntou António Costa. “Estou bem. Vamos chegar a acordo?”, respondeu Ana Rita Cavaco, dirigindo de imediato uma pergunta ao Chefe de Governo. “Estamos a negociar com os sindicatos”, devolveu de forma lacónica o primeiro-ministro enquanto sorria para de seguida continuar a cumprimentar os populares que o aguardavam à porta da novíssima Unidade de Saúde Familiar da Beira-Tejo, em Abrantes. A cena estabeleceu o tom da relação entre os dois para o que restava de visita.
À primeira e única provocação, Costa respondeu com uma frase que arrumou o assunto. Sem revelar se haverá acordo ou não entre as duas partes, deu a entender aquilo que por várias vezes já foi afirmando nos últimos meses: as negociações sobre as reivindicações dos enfermeiros são para ser mantidas com os sindicatos e não com a representante da Ordem dos Enfermeiros. Uma ideia que a Ministra da Saúde recuperaria no fim da inauguração desta nova unidade hospitalar. Mas já lá vamos.
A comitiva que acompanhava o primeiro-ministro em mais uma inauguração na área da saúde era composta por Marta Temido, pelo secretários de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, e pela ex-autarca de Abrantes e atual secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, Maria do Céu Albuquerque. A representar o PS estava o deputado Hugo Costa, eleito pelo círculo de Santarém. Todos acompanharam a visita que António Costa fez às instalações da unidade hospitalar. Enquanto entrava e saía das salas e cumprimentava a equipa de médicos e enfermeiras que vão servir cerca de 11.600 utentes na região sul de Abrantes, nem sinal de Ana Rita Cavaco.
A bastonária da Ordem dos Enfermeiros só era vista já depois da passagem dos socialistas. Visitava os mesmos espaços, seguindo exatamente a mesma sequência, mas já longe dos holofotes mediáticos e afastada da sombra do primeiro-ministro e da Ministra da Saúde. Conversava alegre com os profissionais de saúde, mas sempre com um olhar divido entre atenção às conversas que ia mantendo e o percurso que Costa e companhia iam seguindo.
A visita não durou muito tempo em parte porque as instalações desta nova unidade hospitalar, que se situa na localidade de Rossio ao Sul do Tejo, apesar de modernas não são especialmente grandes. Enquanto olhava para as unhas pintadas de um cor-de-laranja vivo – seria também isto uma provocação? -, Ana Rita Cavaco observava António Costa a dirigir-se para o palco improvisado onde faria o discurso durante a sessão de inauguração da USF Beira-Tejo.
Antes do primeiro-ministro, falou Marta Temido, que na ronda de cumprimentos não mencionou o nome de Ana Rita Cavaco. Seguiu-se António Costa, que também já ia lançado no discurso quando voltou atrás para corrigir a falha e cumprimentar “obviamente a senhora bastonária da Ordem dos Enfermeiros”, que também tinha ficado de fora da ronda inicial de cordialidades. Ambos os governantes congratularam-se com mais uma inauguração que serve, defenderam, para mostrar o empenho não só do Governo, mas também dos profissionais da saúde em apostar “no SNS e na descentralização”.
Terminada a visita, António Costa voltou a olhar para Ana Rita Cavaco, de quem se despediu de forma seca. Depois da tentativa falhada de falar com o primeiro-ministro, a bastonária da Ordem dos Enfermeiros voltou à carga com a Ministra da Saúde, que então se dirigia para a frente das câmaras de televisão e dos microfones em riste para fazer, perante a comunicação social, o balanço desta visita.
Depois de explicar que a reunião com o secretário de Estado Adjunto da Saúde, Francisco Ramos, tinha corrido “muito melhor” do que da última vez, Ana Rita Cavaco pediu para falar pessoalmente com a própria ministra, que solicitou que a contactassem pelas vias formais. “Já o fizemos”, garantiu a bastonária. “Então depois falaremos”, rematou Marta Temido antes de se despedir definitivamente da bastonária.
No fim, e pondo por palavras o que acabara de ficar visível para todos quantos estiveram atentos, a Ministra da Saúde explicou a posição do Governo perante a Ordem dos Enfermeiros. “Não confundimos o trabalho de uma ordem profissional com o dos sindicatos“, disse, sem querer revelar se vai aceitar o desafio lançado instantes antes por Ana Rita Cavaco. “Houve uma altura em que tivemos de dar um sinal, mas espero que agora haja respeito mútuo pelo nossos poderes”, enfatizou.