A decisão ainda é passível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, mas é uma primeira derrota para os acionistas e credores subordinados do antigo BES que contestaram na justiça a resolução do antigo banco adotada em 03 de agosto de 2014 pelo Banco de Portugal (BdP). Estes acionistas e credores apontavam uma série de inconstitucionalidades ao regime jurídico da resolução sobre o BES, entre eles a violaç̧ão da reserva legislativa do Parlamento e a violação do direito de propriedade privada e dos princípios da igualdade e da justa indemnização.

Também alegavam a violação dos princípios da boa-fé, da proteção da confiança e da proporcionalidade, bem como várias outras disposições do Direito Europeu. Por isso mesmo pediam a nulidade da deliberação do Banco de Portugal que resultou na criação do Novo Banco (o banco “bom”) e na separação dos ativos e passivos do BES.

Mais de 20 processos com esse fundamento, ou seja a alegar a nulidade da decisão do BdP, deram entrada no Tribunal Administrativo de Lisboa (TACL) na sequência da resolução. Devido ao número de processos, em maio de 2017 o juiz-presidente Benjamim Barbosa decidiu julgar apenas um dos processos, o n.º 2586/14.3BELSB, colocado por 19 fundos de investimentos internacionais, nomeadamente norte-americanos, que investiram em produtos do BES. A sentença desse processo seria válida para os restantes.

O juiz Benjamim Barbosa argumentou na altura que, apesar de alguns dos argumentos serem diferentes, a questão central era a mesma, o que tornava necessária “uma só resposta jurisdicional”, até para “evitar a prolação de decisões contraditórias que só desprestigiam a justiça”.

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Os restantes processos estavam desde então suspensos à espera da sentença do processo selecionado.

Num acórdão de 247 páginas, os juízes do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa argumentam que nenhuma das inconstitucionalidades descritas acima se verificou. Pelo contrário: garantem que a atuação do Banco de Portugal foi legal, constitucional e que a alternativa à resolução seria bem pior.

“Ainda que a medida de resolução seja de ultima ratio, ou seja, um ‘remédio’ muito forte, não significa que o cenário alternativo não seja ainda pior, o da ‘morte imediata’ de um banco, através de um processo de liquidação imediato e desordenado. Em boa verdade, sempre será menos gravosa uma tentativa de ‘tratar’ o que deve ser ‘tratado’, evitando designadamente um risco de ‘contágio’ a outros organismos que com aquele se relacionem”, pode ler-se no acórdão.

Por outro lado, o Tribunal salienta que “outra soluç̧ão, que não a da resolução ou a da liquidação, seria porventura mais benéfica para os acionistas e credores subordinados”. Contudo, “desvirtuaria a razão de existência da medida da resolução, que tende, primeiramente a salvaguardar o erário público das desventuras bancárias bem como aqueles que não assumiram riscos a troco de remunerações”.

Sobre as “desventuras bancárias”, o acórdão recorda que houve “ocultação ou simulação de dados contabilísticos” fornecidos pelo BES e que “o ‘regulado’ não se conformou com o Direito na sua relação com o regulador”. Ou seja, salienta que esta atuação “terá as necessárias repercussões na parcela de justiça que cabe à jurisdição comum, no âmbito penal e contra ordenacional”.

Por isso mesmo, conclui o tribunal, “não se poderia exigir ao Banco de Portugal, no quadro da regulação, uma atuação diferente da que teve”.