Yanela Sanchez, uma criança das Honduras, chora enquanto a sua mãe, Sara Sanchez, é revistada pelas autoridades fronteiriças em McAllen, Texas, nos Estados Unidos, a 12 de junho de 2018. As duas viajaram durante um mês pela América Central e o México antes de chegarem aos Estados Unidos à procura de asilo, numa altura em que Donald Trump anunciou uma política de “tolerância zero” na fronteira com o México, onde vários migrantes tentam entrar em território norte-americano. Esta quinta-feira, a imagem que captou este momento foi anunciada como a fotografia do ano do World Press Photo 2019. Ainda no mais prestigiado concurso de fotojornalismo, o português Mário Cruz também foi premiado, arrecadando o 3.º lugar na categoria ambiente.

A fotografia que John Moore tirou na fronteira EUA-México correu o mundo, chegou a ser capa da revista Time — alterada com a imagem do Presidente dos EUA — e tornou-se numa imagem que representa a separação de famílias na fronteira, onde pais e filhos eram enviados para localizações diferentes. No caso de Yanela e Sara Sanchez, e ao contrário do que foi avançado inicialmente, mãe e filha acabaram por não ser separadas, confirmou na altura a Proteção das Alfândegas e Fronteiras dos Estados Unidos e o próprio pai da criança. A discussão e crítica pública sobre o assunto, no entanto, levaram a que Donald Trump revertesse a sua política fronteiriça, a 20 de junho do mesmo ano.

“Podia ver o medo nos rostos deles, nos olhos deles”, confessou na altura o fotojornalista da Getty Images, acrescentando numa entrevista à National Public Radio que à medida que as autoridades iam apontando o nome dos migrantes que lá estavam, uma mãe com a filha despertaram a sua atenção. Depois de ter tirado “algumas fotografias” do momento em que Sara Sanchez era revistada, o fotojornalista confessa que nunca mais soube do paradeiro desta família.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Acho que esta imagem tocou o coração de muitas pessoas, tal como aconteceu comigo, porque humanizou uma história maior”, descreveu o fotojornalista, citado num comunicado enviado pelo World Press Photo. Para a vice-presidente do júri, Whitney C. Johnson, “os detalhes na fotografia são interessantes. Desde as luvas que as autoridades do controlo de fronteiras estão a utilizar até ao facto de que os cordões das sapatilhas foram retirados”.

Já Alice Martins, fotojornalista e membro do júri, acrescenta que a fotografia “conta imediatamente muito sobre a história”. “E, ao mesmo tempo, faz-nos sentir tão conectadas com ela (…) Esta fotografia mostra um tipo de violência diferente, que é a psicológica”, referiu ainda.

O tema da imigração não ficou apenas com a fotografia do ano. Pela primeira vez, o World Press Photo introduziu a categoria de história do ano, que foi atribuída a Pieter Ten Hoopen, com um trabalho sobre uma caravana de migrantes que viajou da América Central até à fronteira dos Estados Unidos, em outubro de 2018. Começou com algumas dezenas de pessoas e acabou por transformar-se numa enorme caravana com milhares que se foram juntando pelo caminho. Durante três meses, atravessaram três países até chegarem à cidade mexicana de Tijuana.

Caravana. Quem são os migrantes à espera de entrar nos Estados Unidos?

Mário Cruz volta a ser premiado

Ao todo, foram analisadas 78.801 fotografias enviadas por mais de quatro mil fotógrafos nesta 62.ª edição do concurso. O fotojornalista português Mário Cruz, que em 2016 já tinha conquistado o primeiro lugar na categoria de temas contemporâneos com um trabalho sobre a escravatura de crianças no Senegal, conseguiu este ano o terceiro lugar na categoria ambiente, com o trabalho pessoal Living Among What’s Left Behind (“Viver entre o que foi deixado para trás”), que mostra uma criança que recolhe materiais recicláveis deitada num colchão rodeado por lixo que flutua no rio Pasig, que já foi declarado biologicamente morto na década de 1990.

“Muitas vezes vemos pessoas a fotografar lixo no areal, a questionarem como aquilo foi lá parar, e caímos no erro de nos preocupar com a microescala que nos afeta, mas o que encontramos é o resultado de algo que se encontra completamente descontrolado na outra ponta do planeta”, explicou Mário Cruz em entrevista ao Observador. O fotojornalista espera que o seu trabalho seja um “grito de alerta e um apelo à ação” para a consciencialização destes temas.

Mário Cruz: “Nunca publiquei um trabalho em Portugal e não foi por não querer”

A cerimónia da entrega de prémios realiza-se esta quinta-feira em Amesterdão. A partir do dia 27 de abril e até ao dia 19 de maio, todas as fotografias premiadas vão estar em exposição no Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa, das 10h às 20h.

(Veja acima a fotogaleria com todos os vencedores de cada categoria, bem como os 2.º e 3.º lugares)