Vamos por partes. A Nissan estava falida em 1999, mercê da gestão dos quadros japoneses. A companhia era tão interessante, do ponto de vista do negócio, que ninguém a quis comprar. Ninguém, à excepção da Renault, cujo presidente à época, Carlos Ghosn, não só achou que era uma boa oportunidade de negócio, como conseguiu recuperá-la. Teve de despedir trabalhadores e fechou fábricas, o que aconteceu pela primeira vez no Japão, tal como foi a primeira vez que um estrangeiro liderou uma grande empresa local. Mais recentemente, partiu da própria Nissan a acusação que viria a desencadear a detenção de Carlos Ghosn, libertado há dias, para aguardar julgamento em prisão domiciliária.

À parte dessa guerra entre construtor e CEO, que continuará a arrastar-se nos corredores da justiça, sabe-se agora que a Nissan, de regresso às mãos dos japoneses, registou pela primeira vez uma quebra de lucros, posicionando-os abaixo dos anunciados pela Renault, cujas vendas são consideravelmente inferiores.

Após salvar a Nissan, convencendo a Renault a investir numa marca afogada em dívidas e sem produto, Ghosn foi promovido a herói nacional e até surgiu em banda desenhada

Segundo a Automotive News, as vendas da Nissan caíram depois da prisão do “chefe”, sendo que os lucros (numa previsão preliminar) baixaram para 2,5 mil milhões de euros em 2018, em vez dos anteriores 3,6 mil milhões de euros (2017). Numa declaração à imprensa, os novos responsáveis pela Nissan assumiram que uma das consequências da prisão de Ghosn foi a redução das vendas, para os valores mais baixos desde 2010. A marca nipónica vai revelar os dados definitivos a 14 de Maio, mas não é de esperar grandes surpresas em relação a estas previsões.

Entretanto, no mesmo período, a Renault reivindicou 3 mil milhões de euros de lucro, o que coloca a Nissan abaixo da Renault, em termos de lucros, pela primeira vez nos últimos 10 anos. Esta redução dos ganhos vai desequilibrar ainda mais a relação entre os japoneses e franceses, que pende a favor destes últimos, pois não só controlam a Nissan (onde detém 43,4%), como a reduzida percentagem que a Nissan detém da marca francesa (15%) não lhe confere direito de voto. E será exactamente isto que a Nissan quer ver alterado, tendo “sacrificado” Ghosn no processo.

Em cima da mesa, nos próximos meses, vai estar o facto de a Renault pretender uma maior integração dos três construtores (Renault, Nissan e Mitsubishi) num grupo e não numa aliança, o que a Nissan (e muito provavelmente todos japoneses, da justiça ao Governo) quer evitar a todo o custo, por uma questão de nacionalismo e interesse estratégico. Esta quebra de lucros da Nissan não ajudará propriamente a sua causa, tanto mais que o seu futuro depende de motores e chassis gauleses.

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