O dia foi longo no Ministério das Infraestruturas e da Habitação, em Lisboa, para se tentar chegar a um acordo de mediação do conflito entre a ANTRAM e Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas. E acabou com um desfecho que o Governo “obviamente não estava à espera”. “Infelizmente uma das partes quis definir resultados antes de a mediação começar. Não é assim que se faz um processo de mediação”, atirou o ministro Pedro Nuno Santos à saída da reunião com o sindicato. Ou seja: o acordo para uma mediação falhou.
De tarde, e à entrada do edifício do Ministério das Infraestruturas e da Habitação para reunir com os motoristas, Pedro Nuno Santos tinha dito aos jornalistas: “Acho que a telenovela já acabou”. Mas, mais tarde e no rescaldo do encontro, ficava claro que a “telenovela” estava para durar, apesar de ter assegurado que o Governo “fez de tudo para garantir que nenhuma das partes exigia pré-condições” e que o processo de mediação seria levado para a frente.
“Domingo todos ficámos com a esperança de que se podia dar início ao fim deste processo”, admitiu o governante, relembrando também que o Governo não está “do lado de nenhuma das partes em particular”. Pedro Nuno Santos informou ainda que “a ANTRAM deixou cair a pré-condição que tinha imposto na sexta-feira”, lamentando que o mesmo não tenha acontecido da outra parte.
“Lamentamos muito tudo isto que está a acontecer desde abril e temos o direito de exigir que se respeite um processo de mediação”, acrescentou Pedro Nuno Santos, reforçando ainda que “os resultados de uma mediação devem ser encontrados no fim e não antes de ela começar”.
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Depois de ter reunido durante a manhã desta terça-feira com o Governo e depois de ter sido iniciada a reunião entre o Executivo e o Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas, que no domingo decidiu desconvocar a greve depois de um plenário, a ANTRAM voltou a ser chamada ao Ministério das Infraestruturas e da Habitação. Esperava que fosse alcançado um acordo de mediação, mas o resultado foi o aposto: os patrões foram informados de que “o sindicato não aceitou o processo de mediação proposto”, dizia o porta-voz da ANTRAM, André Matias de Almeida, aos jornalistas.
André Matias de Almeida disse que o sindicato impôs duas condições ainda antes de o processo de mediação começar e que, por isso, este possível acordo caiu. “Tudo nos leva a crer que o que aconteceu no domingo não passou de mais um número lamentável”, atirou o porta-voz da ANTRAM, acusando ainda o sindicato de “impor uma espada sobre a cabeça da ANTRAM” e defendendo que é no processo de mediação que se apresentam as propostas. “Não estamos disponíveis para avançar resultados antes da mediação”, acrescentou.
Logo a seguir, do lado do sindicato e também à saída do encontro no Ministério, Pedro Pardal Henriques também falou aos jornalistas. “A única coisa que pedimos à ANTRAM foi que as horas extraordinárias fossem pagas e que isso ficasse estabelecido hoje”, referiu. Essas condições, acrescentou, eram relativas à cláusula 61 que ia obrigatoriamente pagar estas horas e um aumento do subsídio de ADR para quem manuseia matérias perigosas. “Quanto aos 40% a que a ANTRAM se referiu, falamos de um acréscimo de 50 euros tributados para 800 pessoas”, alertou.
Sem confirmar se o sindicato vai mesmo avançar com uma nova paralisação, o porta-voz disse apenas que os motoristas de matérias perigosas “vão agora dar seguimento ao que foi definido no plenário de domingo” e que esta quarta-feira irão anunciar novas formas de luta. Mas não descartou a hipótese de uma nova greve: “A ANTRAM não quis evitar estas novas formas de luta ou de uma possível greve por 50 euros”.
O documento da ANTRAM dizia que estavam disponíveis para o processo de mediação desde que fosse aquilo que foi apresentado à FECTRANS e imposto ao SIMM [Sindicato Independente de Motoristas de Mercadorias]. Achamos que o mínimo de dignidade destes trabalhadores não estava assegurada”, acrescentou Pardal Henriques.
Voltando atrás, e logo à entrada da reunião com o Governo, Pedro Pardal Henriques tinha já deixado uma crítica ao dizer que estava preocupado com o facto de o Governo ter reunido com a ANTRAM primeiro. “Estamos apenas preocupados porque, mais uma vez, o Governo reuniu com a ANTRAM sem a nossa presença”. No entanto, acrescentou o porta-voz, o sindicato disse que iria “dar o benefício da dúvida de que tudo decorrerá da forma como a ANTRAM demonstrou, de boa-fé”. “Assim como nós estamos de boa-fé”, sublinhou Pardal Henriques em declarações à SIC Notícias.
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No domingo, depois de a desparalização ter sido desconvocada, Francisco São Bento alertou ao mesmo tempo que poderá voltar a ser convocada uma greve “às horas extraordinárias, fins-de-semana e feriados”, no caso de a ANTRAM “demonstrar uma postura intransigente na reunião”.
Já André Matias de Almeida tinha apontado disponibilidade para um acordo semelhante ao que foi alcançado com o SIMM e a FECTRANS. Reconheceu que “os recibos de vencimento destes trabalhadores não são normais quando comparados com os do resto do país, com muitas rubricas”, mas relembrou que as empresas de transporte “perdem há três anos a esta parte”. “Temos de estar adaptados ao paradigma do país”, relembrou, dizendo que não vale a pena chegar a entendimentos que acabam por redundar em “despedimentos coletivos ou empresas que fecham”.
(Em atualização)