O Governo aponta agora para um défice de 0,1% este ano — melhorando as previsões em uma décima face à apresentação do Programa de Estabilidade — e um saldo nulo em 2020, uma meta menos ambiciosa do que o previsto em abril (0,3%, num cenário de políticas variantes, ou 0,2%, com políticas invariantes). O ministro das Finanças muda também a previsão de crescimento económico para o próximo ano, em uma décima, esperando agora 2%, embora mantenha tudo na mesma para este ano.
Os dados revistos constam do esboço orçamental que todos os países têm de enviar para Bruxelas até esta quarta-feira. O governo sublinha que o documento prevê um “cenário de políticas invariantes”, ou seja, sem contar com novas medidas de política orçamental — que podem vir a ter lugar, na sequência das eleições legislativas e das negociações que possam agora existir com outros partidos.
Défice zero no próximo ano
As contas públicas deverão ter, de acordo com o Governo, um comportamento melhor do que o esperado este ano, com uma revisão positiva de 0,1 pontos percentuais (para -0,1% do PIB), que se justifica pelo melhor comportamento da receita; e um pouco menos de ambição para 2020, porque, apesar de prever um saldo nulo — que, a verificar-se, seria uma estreia na história económica da Democracia —, em abril o Governo previa um excedente de 0,3%.
“Em 2020, o Projeto de Plano Orçamental prevê uma evolução da receita em linha com o crescimento nominal do PIB, enquanto que a despesa pública evolui de forma consentânea com os compromissos políticos assumidos ao longo da legislatura que agora termina”, diz o Governo. “Salienta-se aqui o impacto orçamental decorrente da fase final do processo de descongelamento das carreiras da Administração Pública; os projetos de investimento público, entretanto autorizados e, nalguns casos, já em execução; e o crescimento das prestações sociais decorrente do reforço da prestação social para a inclusão, do subsídio de parentalidade e do abono de família”, acrescenta.
O nível dos impostos e das contribuições para a Segurança Social em percentagem do PIB — a famosa carga fiscal — deverá manter-se nos 34,9% em 2019 e baixar uma décima no próximo ano, para 34,8%.
Objetivo de défice estrutural não será cumprido
O Projeto de Plano Orçamental para 2020 não prevê o cumprimento das regras europeias para o saldo estrutural. As regras europeias mandam que cada estado-membro da União Europeia tenha um objetivo específico para garantir a sustentabilidade das contas públicas, com uma margem de segurança face aos 3% de défice. No caso português, o Objetivo de Médio Prazo é de zero por cento, depois de várias revisões da Comissão Europeia. No entanto, tanto para 2019 (-0,3% do PIB), como para 2020 (-0,5% do PIB), as metas do ministro das Finanças ficam àquem das obrigações perante Bruxelas, apesar de Mário Centeno ter dito, em março, que iria “cumprir os Objetivos de Médio Prazo no âmbito do tratado no exercício orçamental de 2019”.
Fonte governamental ressalva, no entanto, ao Observador que este documento ainda não tem previstas medidas de impacto orçamental e que só com a apresentação do Orçamento do Estado para 2020 (OE2020), depois das negociações com outros partidos, será possível perceber se o executivo vai ou não cumprir essas metas.
O Governo vai entregar a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2020 à Assembleia da República até um máximo de 90 dias a contar da tomada de posse.
Governo prevê redução mais lenta da dívida pública
Em relação ao rácio da dívida pública, o Governo antecipa que fique em 119,3% do PIB este ano e nos 116,3% em 2020. Trata-se de uma redução menor do que a que estava previsto no Programa de Estabilidade 2019-2023, apresentado em abril. Na altura, Mário Centeno apontava para um rácio da dívida de 118,6% em 2019 e de 115,2% no próximo ano.
No documento, o Governo refere o objetivo de “utilizar as receitas extraordinárias para acelerar a redução do rácio da dívida das administrações públicas” e assinala que de 2016 a 2018 o rácio da dívida pública em relação ao PIB diminuiu 10 pontos percentuais, para 122,2%.
“O Governo estima que em 2023 este indicador atinja um nível muito próximo de 100%. Para atingir esse objetivo, todas as receitas extraordinárias devem continuar a ser alocadas à redução da dívida pública”.
Crescimento acelera em 2020, mas fica na mesma este ano
O ministro das Finanças mantém a projeção de 1,9% para o crescimento do PIB em 2019, tal como no Programa de Estabilidade 2019-2023, publicado em abril: “Esta projeção representa uma desaceleração face a 2018, incorporando uma moderação do crescimento do consumo privado, um abrandamento do crescimento das exportações, e uma aceleração do crescimento do investimento”. No caso do abrandamento das exportações, o Governo aponta para a desaceleração dos principais parceiros económicos, “o que se traduz num impacto na procura externa dirigida a Portugal”.
Para 2020, o ano a que diz respeito este esboço orçamental, o cenário macroeconómico prevê uma ligeira aceleração do crescimento do PIB para 2%, tendo em conta o comportamento da Zona Euro. “Esta projeção assenta na antecipação de uma recuperação do crescimento económico na área do euro, em linha com as previsões de instituições internacionais, como o Fundo Monetário Internacional”, refere Mário Centeno. “A recuperação do crescimento na área do euro, principal parceiro comercial de Portugal, deverá refletir-se numa aceleração da procura externa e, portanto, do crescimento das exportações”.
Para já, “a economia portuguesa tem-se manifestado relativamente resiliente à desaceleração da área do euro e deverá, também por isso, ter boas condições para beneficiar de uma melhoria na conjuntura internacional”, afirma a equipa de Mário Centeno, acrescentando que “a aceleração do crescimento do investimento público (9,7% em 2019 para 16,2% em 2020) deverá ainda contribuir positivamente para o aumento do ritmo de crescimento da economia”.
O cenário macroeconómico de Mário Centeno pressupõe que o consumo privado abrande — um crescimento de 2,2% em 2019 e 2,1% em 2020 (depois de ter atingido os 3,1% em 2018). Nas exportações, espera uma subida de apenas 2,9% em 2019 (abrandamento face aos 3,8% do ano passado), e aceleração para 3,9% em 2020; enquanto as importações não deverão parar de abrandar: de 5,8% em 2018, para 5,4% em 2019, e 4,1% em 2020.
O Governo prevê ainda que o investimento na economia portuguesa tenha uma subida expressiva de 8,2% em 2019 (depois de uma subida de 5,8% em 2018), abrandando depois em 2020 (+5,0%).
Ao rever os números do PIB enviados a Bruxelas — ainda que em apenas uma décima no próximo ano —, Mário Centeno acaba por contrariar o que tinha defendido há pouco mais de 15 dias. Na conferência de imprensa em que atacou as previsões do PSD, a 30 de setembro, o ministro das Finanças foi questionado por que razão — ao contrário de 2015 —, o PS não apontava agora um cenário macroeconómico detalhado. Mário Centeno respondeu que não havia alterações na tendência, que já estava presente no Programa de Estabilidade para 2019-2023.
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