Este é o orçamento da inércia, não é um orçamento de continuidade“, como diz o primeiro-ministro, critica António Bagão Félix, ex-ministro das Finanças e da Segurança Social que estranha a ambição “modestíssima” demonstrada na proposta de Orçamento do Estado para 2020, desde logo porque é o primeiro orçamento da legislatura. “As grandes reformas fazem-se no primeiro orçamento e no último orçamento [de cada legislatura]”, pelo que “se esperava muito mais de um Orçamento do Estado que é o primeiro de uma legislatura”.

Entrevista a Bagão Félix

Em entrevista à Rádio Observador, no programa Explicador, transmitido nesta manhã de quarta-feira, Bagão Félix elogia o “simbolismo relevante e histórico” de se prever um excedente das contas públicas no próximo ano, sobretudo pelo histórico de boa execução orçamental. Mas este é um orçamento, na opinião de Bagão Félix, que tem vários “problemas”: e o principal é que os ganhos obtidos com base no crescimento (mais receita fiscal e menos despesa com prestações sociais) deviam ser mais “repartidos” pela sociedade, “para não ir tudo para o Estado” e dar um sinal, mesmo que simbólico (e, necessariamente, prudente) às famílias e às empresas, isto é, alívio da carga fiscal.

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Devia haver uma distribuição dos ganhos, reconheço que tem de ser prudente, mas pelo menos simbólica”, diz Bagão Félix.

O ex-ministro diz que os problemas da economia portuguesa precisam que se olhe “com distância. E este orçamento não vê nada à distância” — desde logo na questão da atualização dos escalões do IRS com a taxa de inflação deste ano e não do próximo ano, o ano em que os rendimentos vão ser efetivamente recebidos e gastos. “Quem é mais prejudicado por esta deficitária atualização são as pessoas qualificadas, que respondem melhor, a meritocracia leva uma pancada”, diz Bagão Félix.

Bagão Félix critica o Governo, também, pela introdução “estranhíssima” de uma nova contribuição extraordinária para os fornecedores de dispositivos médicos e continua a considerar um dos “grandes erros” do Governo a redução do horário de trabalho para as 35 horas, o que teve impacto sobretudo na Saúde e vai engordar ainda mais um Estado que já é “demasiado grande”.

Por outro lado, o Governo não se comprometeu ainda com um plano para o IVA da energia, sobretudo quando na legislatura anterior se preferiu uma opção pela baixa do IVA da restauração, que não é um bem de consumo essencial, quando se podia ter baixado logo o IVA da energia, esse, sim, um bem de primeira necessidade para famílias e empresas. Mas António Costa “fez mal” e optou pela hipótese mais “demagógica”, sobretudo porque depois poucos restaurantes terão repercutido essa baixa do IVA nos preços.