Os automóveis elétricos deveriam ser vistos como os telefones celulares, uma tecnologia revolucionária que melhorou a vida das pessoas e que hoje está plenamente disseminada. Este é um cenário de sonho para todos os players do setor automóvel e também para a sociedade, em geral, dados os benefícios da redução de emissões nocivas para a atmosfera.

A transição no mercado automóvel já não é uma questão de “se”, mas apenas de “quando” vamos abandonar os modelos convencionais, com motor a combustão, para adquirir ou alugar um automóvel elétrico.

Embora atualmente existam medidas fiscais para estimular as vendas de veículos elétricos em quase todos os estados membros da União Europeia, a natureza dos benefícios e o valor monetário dos incentivos ainda é muito variável. Estima-se que o custo dos investimentos necessários para cumprir as metas climáticas, para o setor automóvel, possa representar cerca de metade do valor das multas por incumprimento.

Logo, é preferível subsidiar a compra de automóveis elétricos do que registar prejuízos elevados pela venda de modelos com motor de combustão interna. Graças a um programa arrojado de incentivos, a Alemanha registou um aumento de 9,1% nas vendas, atingindo os 57.533 veículos elétricos, em novembro de 2019, altura em que ultrapassou a Noruega.

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Fica claro que a procura de veículos elétricos não é alheia às políticas de estímulo e apoio adoptadas pelos governos. Os impostos decididos pelos países também influenciam, de forma significativa, as escolhas dos consumidores em cada estado membro. Os níveis de emissões de CO2 nos carros novos são mais elevados no Luxemburgo e na Estónia, onde ainda são permitidos valores médios acima de 140 gCO2 / km.

Portugal e os Países Baixos lideram a tabela dos menos poluentes, exigindo valores médios mais baixos, na ordem de 106 gCO2 / km. Em Portugal a quota de mercado de veículos elétricos tem vindo a aumentar de modo exponencial, graças ao chamado “incentivo verde” que se traduz em diversas vantagens financeiras para as empresas. Os Países Baixos também registam uma enorme procura de veículos elétricos, estimulada por reduções nos impostos e por subsídios que impulsionam as vendas de modelos não poluentes.

Na Suécia encontramos a maior quota de veículos elétricos, incluindo modelos a bateria e híbridos plug-in, entre os estados-membros da União Europeia, com 8,4% do total de vendas de veículos, seguida pelos Países Baixos, com 6,8%. A Noruega é, de facto, o país onde cerca de metade do parque automóvel já é formado por automóveis elétricos (31%) e modelos híbridos plug-in (19%). Embora não pertença à União Europeia, a Noruega aderiu ao protocolo de regulação de emissões de CO2, fazendo com que as vendas de carros elétricos no país possam contribuir para os objectivos do Green Deal já a partir deste ano.

No setor das frotas, a transição também está a acelerar, graças aos vários incentivos em vigor na Europa, de Portugal à Roménia, bem como ao aumento dos apoios dedicados a iniciativas de mudança climática, como o incentivo ou “bónus” ambiental da Alemanha para veículos movidos a bateria.

O Stress da Autonomia

Os incentivos são apenas uma pequena parte da história. Este ano promete mais e melhor inovação no que diz respeito aos próprios veículos e à infraestrutura necessária para carregá-los. A alemã Ionity [https://ionity.eu/] promete ser a maior e mais rápida rede de carregamento de veículos elétricos do mundo, quando estiver concluída. Este ano deverá ser concluído o plano de instalação de 400 postos, estando nesta altura activas 206 estações e mais de 50 em construção em diferentes países europeus.

Os preços e o desenvolvimento da infraestrutura de carregamento assumem um papel crucial no momento da decisão de mudar para um veículo elétrico. Muitos consumidores mostram-se relutantes por causa do stress da autonomia, um tipo de ansiedade já identificada em utilizadores que se debatem com a dificuldade de completar viagens por falta de bateria.

Este stress de autonomia deveria, contudo, ser irrelevante para a maioria dos condutores europeus cujo percurso médio diário fica bastante abaixo do limite de autonomia de qualquer eléctrico. Um estudo recente indica que a distância percorrida diariamente pode ultrapassar 80 km em Espanha e na Polónia, contrastando com o valor mais baixo de apenas 40 km no Reino Unido.

Também estão a crescer as startups que se dedicam a integração de carregadores em postes de iluminação pública, como forma simples e eficiente de ampliar a infraestrutura de rede mais depressa e com menor custo.

Incentivos verdes

Atualmente existem incentivos em 24 dos 28 estados da União Europeia para motivar a compra de automóveis movidos a electricidade, total ou parcialmente. Contudo, apenas 12 estados membros da UE garantem o pagamento de bónus ou prémios aos compradores, dado que nos outros 12 países apenas são concedidas reduções, ou isenções, de impostos e taxas na compra de carros elétricos.

Vejamos uma breve panorâmica dos principais mercados europeus

Portugal

O Fundo Ambiental prevê a atribuição de um incentivo no valor de 2250 euros pela compra de um veículo novo 100% elétrico. Além deste apoio, as empresas ficam isentas de tributação autónoma e deduzem o valor do IVA da aquisição. Há outros benefícios como o estacionamento gratuito, ou com grandes descontos consoante as cidades, encontrando-se em estudo novas medidas de estímulo à mobilidade elétrica.

Espanha

Os incentivos no mercado espanhol podem ir até 5.500 euros para os automóveis eléctricos, 6.000 euros para veículos comerciais, 8.000 para veículos médios e 15 mil euros para os pesados. Há apoios para instalação de postos de carregamento em casas e empresas, mas não há qualquer isenção ou dedução de IVA, que é de 21%. Além disso, algumas medidas são variáveis em função das diferentes regulamentações aprovadas pelas diversas comunidades administrativas.

Noruega

Os carros eléctricos registam uma procura crescente na Noruega, onde representaram mais de 40% das vendas no ano passado, um recorde mundial para o Estado que foi o primeiro a oferecer incentivos para reduzir o número de automóveis com motor de combustão.

Na Noruega os compradores de veículos eléctricos beneficiam da isenção de IVA, numa taxa de 25%, além de outros impostos sobre a venda de automóveis como as taxas de importação e de circulação. Ao mesmo tempo oferecem estacionamento gratuito, isenções em portagens e permissão para circular nas faixas BUS das cidades.

O governo norueguês vai prolongar todas as isenções fiscais até ao final de 2021, apesar de alguns partidos políticos já terem apresentado pedidos para uma redução gradual dos incentivos a partir de 2022.

Suécia

Quem adquire um veículo eléctrico na Suécia pode receber um bónus até 60.000 coroas suecas (5.619 euros).

Dinamarca

No caso dinamarquês, o governo limitou-se a aumentar os valores das deduções fiscais para quem utiliza veículos eléctricos.

Países Baixos

O governo planeia conceder vantagens fiscais durante os próximos cinco anos, como forma de estimular a procura pelos modelos eléctricos de forma tão intensiva que permita ter um parque automóvel ecológico, constituído apenas por veículos eléctricos, até 2050. Nos Países Baixos mantém-se a isenção de impostos e taxas sobre veículos eléctricos até 2025. Os consumidores podem receber até 5.000 euros, mas se o investimento for realizado em autocarros e camiões elétricos, aquele valor pode ir até 40.000 euros por veículo. No final do ano passado, o governo neerlandês decidiu reduzir os benefícios fiscais para as empresas, a partir de 2020. De acordo com o novo plano, as taxas aplicáveis aos contratos empresariais vão aumentar, gradualmente, até estarem equiparadas às dos particulares em 2026. Os limites no valor de aquisição desceram para os 45.000 euros, este ano, passando para os 40.000 euros em 2021.

Reino Unido

O governo britânico reduziu os subsídios para carros elétricos no final de 2018, mas ainda é possível obter descontos até 3.500 libras (4.125 euros) em 31 modelos de veículos. O segundo maior mercado da região também sofre com a incerteza do Brexit. As vendas de carros elétricos cresceram mais do dobro até novembro de 2019, para 32.911 unidades, representando apenas 1,5% do mercado total. Para serem elegíveis, os carros devem ser capazes de viajar 112 km (70 mi) sem emissões, isto é, em modo totalmente eléctrico. O Reino Unido é um dos poucos países europeus onde todos os modelos da Tesla são elegíveis para efeitos de desconto.

Alemanha

Para os alemães a compra de veículos elétricos conferia direito a um subsídio de 4.000 euros, enquanto os compradores de híbridos plug-in recebiam 3.000 euros. Estes valores são comparticipados em partes iguais pelos construtores e pelo governo alemão. Em novembro passado, o governo fez saber que pretende aumentar os subsídios em 50% até 2025, encontrando-se a aguardar que a Comissão Europeia aprove a medida. Atualmente, para os automóveis eléctricos com preço até 40.000 euros existe um subsídio compensatório até 6.000 euros. Em geral, os construtores alemães querem triplicar as suas gamas de carros elétricos, para cerca de 150 modelos diferentes até 2023. O governo também pretende promover a infraestrutura de rede de carregamento que, até 2025, deverá contar com um milhão de postos.

França 

No mercado eléctrico, o Renault Zoe destaca-se como o veículo elétrico preferido pelos franceses em 2019, com uma quota de mercado de 43%, à frente do Model 3 e do Nissan Leaf. Em termos de apoios do Estado, o comprador recebe até 6.000 euros, mais um bónus de conversão para compradores que troquem um carro com motor de combustão por um carro elétrico. Na região metropolitana de Paris, estes apoios são reforçados pela combinação de subsídios dos governos central e regional, podendo assim chegar aos 14.500 euros.

Itália

Muito atrás dos outros grandes mercados europeus, com menos de 8.000 veículos elétricos a bateria vendidos nos primeiros nove meses do ano, segundo a Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis (ACEA) , os italianos ainda não têm acesso a um programa competitivo de incentivos. Com os modelos elétricos a custar cerca de 30.000, é mais fácil optar por modelos equivalentes com motor de combustão, vendidos em Itália por valores entre 10.000 e 15.000 euros. Embora já tenham sido revelados planos do governo para implementar incentivos que podem chegar a 6.000 euros por veículo, já há quem defenda que o valor não é suficiente para seduzir os condutores italianos. Espera-se contudo que as vendas subam graças à entrada em cena dos primeiros modelos elétricos de construtores italianos.

Europa exemplar

Considerado um plano de políticas públicas sem precedentes, o Green Deal prevê que seja  alcançada a neutralidade carbónica até 2050. Os construtores vão ser cada vez mais confrontados com o dilema de desenvolver e colocar rapidamente no mercado automóveis novos com zero emissões, portanto sem motor de combustão interna, ou ter de pagar multas avultadas em função da poluição gerada pelos modelos que ainda tenham no mercado.  A maioria dos construtores está a investir muitos milhões para desenvolver e lançar novos modelos eléctricos, tão cedo quanto possível, seja para responder à procura crescente ou para evitar o quadro de penalizações aplicáveis às emissões de gases nocivos.

A Europa está assim preparada para liderar o crescimento global das vendas de carros elétricos ao longo deste ano, à medida que os governos de toda a região forem implementando programas de incentivo à compra de novos veículos. O mercado europeu é actualmente o segundo maior do mundo, depois da China, mas bastante à frente de países como os Estados Unidos da América ou o Canadá.

No Velho Continente, as vendas de carros totalmente elétricos e híbridos plug-in devem crescer 35% nos primeiros nove meses deste ano, até setembro. A propósito, é relevante salientar que a venda de veículos totalmente elétricos suplantou, há muito, a dos modelos híbridos plug-in nos principais mercados: China, EUA e Canadá.

Este artigo integra o projecto desenvolvido em parceria com a Renault que visa a promoção da mobilidade sustentável. 

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