Há umas semanas toda a gente parecia ter a certeza: os Óscares deste ano iriam premiar “1917” como “Melhor Filme” e Sam Mendes na categoria de “Melhor Realização”. O volte-face deu-se: “Parasitas”, filme sul-coreano que era o favorito da crítica e que durante as últimas semanas foi ganhando notoriedade e popularidade em todo o mundo, acabou a noite de domingo para segunda-feira como grande vencedor.

“Parasitas” não só conquistou o Óscar de Melhor Filme Internacional, como levou para casa os Óscares de Melhor Filme (a estatueta mais desejada dos Óscares), Melhor Realização (pelo trabalho de Bong Joon-ho) e Melhor Argumento Original (o guião foi escrito a meias entre Bong Joon Ho e Han Jin Won). É a primeira vez que um filme falado numa língua que não a inglesa vence o Óscar de Melhor Filme e é também a primeira vez que um sul-coreano, no caso Bong Joon Ho, vence o Óscar de Melhor Realizador.

A reviravolta fez lembrar a disputa entre “Moonlight” e “La La Land: Melodia de Amor” em 2017: não teve a reviravolta dramática com o engano nos envelopes do vencedor, mas também este ano houve um David que bateu um Golias, um filme indie que superou um super favorito. “Parasitas”, porém, conseguiu ser ainda mais consensual, granjeando uma transversalidade entre especialistas de cinema e espectadores que precisava de ser robusta para permitir saltar barreiras de orçamento e sobretudo de idioma de modo a fazer história.

O elenco e equipa de produção de “Parasitas” depois da vitória no Óscar (@ Kevin Winter/Getty Images)

[O que explica o sucesso de Parasitas e a derrota de Joe Pesci, que “faz um papel muito melhor que Brad Pitt”. “O discurso de Joaquin Phoenix piorou as coisas”. E “a humilhação anual de Scorsese”. Pode ouvir aqui o Pop Up especial Óscares transmitido esta manhã na Rádio Observador, com Bruno Vieira Amaral, Maria Ramos Silva, Pedro Boucherie Mendes e Tiago Pereira]

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Um desfecho contra previsões antigas

Em nenhuma edição recente dos Óscares acontecera isto. Por um lado, como é habitual, havia um ou dois favoritos para o prémio maior de “Melhor Filme” — e este ano era mesmo um, absolutamente destacado, o “1917” de Sam Mendes que conquistara prémios atrás de prémios antes dos Óscares, desde logo o (importante, quase barómetro) de melhor longa-metragem dramática nos Globos de Ouro. Por outro lado, o leque de nomeados para “Melhor Filme” era excecionalmente robusto e ninguém estranharia muito se ganhasse um entre vários outros nomeados.

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Se fosse “Parasitas” a vencer? Seria histórico, porque nunca nenhum filme falado em outra língua que não a inglesa vencera o maior prémio de cinema de Hollywood — mas “Parasitas” não é um filme qualquer, tinha sido o grande vencedor nos prémios dos sindicatos dos atores e argumentistas da indústria norte-americana e foi ganhando fôlego nas últimas semanas como possível vencedor. Quem metesse o seu dinheiro em “Parasitas” nas casas de apostas antes da cerimónia não ficaria rico com pouco — o que era bastante sintomático.

E se fosse “Joker” o melhor filme? Até aqui, nenhum filme inspirado em banda desenhada vencera o galardão maior, mas não seria impossível: porque não se fora o filme com mais nomeações (teve 11, apenas menos três do que os três filmes mais nomeados de sempre, Eva, Titanic e La La Land: Melodia de Amor), aquele que bateu todos os recordes de bilheteira e mais alguns e que até reinventou criativamente o género de filmes que leva mais gente às salas de cinema, o de super-heróis?

E alguém ficaria com os parentes na leme se visse a Academia entregar a estatueta de Melhor Filme a “Era uma Vez Em… Hollywood”, filme cheio de estrelas (DiCaprio, Brad Pitt, Margot Robbie, Emile Hirsch, Timothy Olyphant… até Al Pacino faz uma perninha) de um dos mais consensuais realizadores do cinema norte-americano das últimas décadas, Quentin Tarantino? Quando um filme como “O Irlandês”, súmula de carreira de um cineasta maior como Martin Scorsese abrilhantada pela tripleta De Niro-Al Pacino-Joe Pesci, corria por fora e acabou de mãos a abanar, com zero estatuetas, está tudo dito.

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Afinal, havia mesmo outro. “Achava que por hoje estava feito…”

As hipóteses da Academia de cinema de Hollywood premiar como filme maior um outro que não “1917” existia, “Parasitas” até se vinha posicionando como o underdog mais forte, mas ninguém esperava um desnível tão grande nos prémios atribuídos ao filme do britânico Sam Mendes e ao do sul-coreano Bong Joon Ho. O primeiro, é verdade, ganhou três categorias técnicas: Direção de Fotografia, Mistura de Som e Efeitos Visuais. Mas se no argumento ficou de mãos a abanar ao contrário de “Parasitas”, o que já era mais ou menos esperado, quase toda a gente dava os galardões de Melhor Realizador e Melhor Filme como estando no papo para “1917” e Sam Mendes.

Surpresa: não foi nada disso que se viu. E quando na noite passada “Parasitas” somou ao Óscar de melhor argumento, dado pela astúcia narrativa do filme, o mais técnico galardão de Melhor Realização, o volte-face começou a adivinhar-se no Dolby Theatre, em Hollywood, local em que se realizou mais uma (a 92ª) cerimónia dos Óscares.

Bong Joon Ho parecia não acreditar que ia levar para casa a estatueta mais importante do ano, mesmo depois de ser considerado o Melhor Realizador de Hollywood este ano. “Depois de vencer o prémio de Melhor Filme Internacional, achava que por hoje estava feito. Estava pronto para relaxar“, começou por dizer o sul-coreano, num discurso emocionado em que recordou o início de carreira e uma frase que ouviu “quando era jovem e estudava cinema” e que “gravou no coração”: “O mais pessoal é o mais criativo”.

@ AFP via Getty Images

Nesse último discurso antes da festa final que se seguiria, o realizador de “Parasitas”, que nos Globos de Ouro prometera aos espectadores de cinema britânico e norte-americano que “assim que ultrapassarem a barreira de dois centímetros e meio das legendas, ficarão a conhecer muitos mais filmes fantásticos”, quis deixar uma palavra aos restantes realizadores nomeados.

A Martin Scorsese, disse que “estudou” os seus filmes e que se sentia honrado por partilhar o leque de nomeados com ele. A Tarantino, agradeceu porque “quando as pessoas nos EUA não conheciam os meus filmes, o Quentin falava deles, incluía-los nas suas listas” e enviou ainda uma mensagem carinhosa: “Quentin, adoro-te”. A Todd Phillips e a Sam Mendes também deixou elogios: “Grandes realizadores que admiro”.

Ainda sugeriu à Academia dividir o prémio de Melhor Realização em cinco e partilhá-lo com os outros concorrentes. Saiu do palco a dizer “obrigado, vou beber até de manhã” e é provável que o tenha feito: afinal, minutos depois ouviu Jane Fonda anunciar que tinha sido o seu “Parasitas”, nomeado para seis categorias e não para as 11 de “Joker” ou para as 10 de “1917”, “O Irlandês” e “Era Uma Vez em… Hollywood”, a vencer o Óscar de Melhor Filme.

Glória a Bong Joon-ho, glória aos “Parasitas”

Os atores vencedores, do “joker” Phoenix a Brad, Zellweger e Dern

Antes do filme de Bong Joon Ho roubar a noite, os protagonistas foram outros e as surpresas foram poucas. Entre os atores vencedores — principais e secundários — não houve qualquer surpresa, nos masculinos e femininos.

Joaquin Phoenix, considerado quase consensualmente o maior trunfo de um “Joker” que no filme de Todd Phillips é um homem de parca saúde mental que se vai transformando com o tempo em sociopata e assassino, foi o vencedor do Óscar de Melhor Ator Principal. Jonathan Pryce e Leonardo DiCaprio não tinham hipóteses à partida, Adam Driver e Antonio Banderas tinham o apreço de parte da crítica indie pelos desempenhos em “Marriage Story” e “Dor e Glória”. Porém, o favoritismo de Phoenix — que nunca vencera um Óscar mas já tivera desempenhos elogiados em “Her – Uma História de Amor”, “A Emigrante”, “The Master – O Mentor” e “Duplo Amor” — era muito e confirmou-se mesmo.

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Também o Óscar de Melhor Ator Secundário era há muito apontado a Brad Pitt, apesar de naquela categoria terem sido nomeados vários pesos pesados: Tom Hanks pelo desempenho em “Um Amigo Extraordinário”, Al Pacino por “O Irlandês”, Anthony Hopkins por “Dois Papas” e sobretudo um veterano Joe Pesci que, pela mestria interpretativa no papel de Russell Bufalino no filme da máfia de Scorsese, “O Irlandês”, tinha as suas hipóteses.

Brad Pitt já tinha participado num filme vencedor de um Óscar, “12 Anos Escravo”, e já tinha sido nomeado para três Óscares de melhor ator, um num papel secundário (pelo filme “12 Macacos”) e dois por papéis de protagonista (“O Estranho Caso de Benjamin Button” e “Moneyball”). Na noite passada, aos 56 anos, conseguiu finalmente vencer o primeiro galardão individual nos Óscares, pela interpretação de um duplo de cinema com passado misterioso, feitio difícil de domar e frieza de durão cool.

@ Kevin Winter/Getty Images

Também as categorias de Melhor Atriz principal e Melhor Atriz Secundária tiveram vencedoras esperadas. Na primeira, Renée Zellweger concorria com Cynthia Erivo (“Harriet”), Charlize Theron (“Bombshell – O Escândalo”) e sobretudo com Saoirse Ronan, protagonista de “Mulherzinhas” — realizado por Greta Gerwig — e Scarlett Johansson, que contracenou com Adam Driver em “Marriage Story” e foi um dos melhores ingredientes do filme. Zellweger, contudo, era dada como favorita pelo desempenho em “Judy” e aos 50 anos conquistou o seu primeiro Óscar de Melhor Atriz, depois de uma estatueta de Melhor Atriz Secundária conseguida pelo desempenho em “Cold Mountain”, há já década e meia.

Laura Dern foi outra das atrizes que se destacou na indústria de cinema norte-americano no último ano e conseguiu conquistar o Óscar de Melhor Atriz Secundária. Se Scarlett Johansson não conseguiu bater a favorita Zellweger como Melhor Atriz e Adam Driver foi preterido pelo “joker” Phoenix, Dern deu uma estatueta a “Marriage Story”, pela forma como interpretou a impiedosa advogada da protagonista (precisamente, Scarlett).

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De “Jojo Rabbit” a “American Factory” e “Toy Story 4”

A surpresa maior veio na categoria narrativa. Se para “Melhor Argumento Original” havia dois ou três candidatos e venceu um deles, que por sinal até era apontado como o maior dos candidatos (“O Parasita”, que concorria com “Era uma Vez Em… Hollywood” e “Marriage Story”), na categoria de “Melhor Argumento Adaptado” havia um ponto de interrogação.

Iria a Academia premiar a adaptação de um romance de Louisa May Alcott por Greta Gerwig em “Mulherzinhas”, até como compensação por ter ignorado Gerwig numa categoria de Realização que só contou com homens? Preferiria dar o prémio a Steven Zaillian e a “O Irlandês”, pela forma como pegara num livro de Charles Brandt e o adaptara ao universo de um respeitadíssimo Martin Scorsese? Ou reconheceria a capacidade de Todd Phillips e Scott Silver para pegarem numa personagem de banda desenhada como Joker e lhe darem uma dimensão mais humana e sofrida? Das três, nenhuma: a estatueta de Melhor Argumento Adaptado acabou surpreendentemente por ir parar às mãos de Taika Waititi e do seu “Jojo Rabbit”.

A “1917”, restou o contentamento pela vitória em categorias técnicas — Melhor Fotografia, Melhores Efeitos Visuais e Melhor Mistura de Som. Tal como aconteceu, aliás, com “Era Uma Vez Em… Hollywood”, que apesar das dez nomeações só conquistou duas estatuetas, a de Melhor Ator Secundário (Brad Pitt) e a de Design de Produção. Ou com “Mulherzinhas”, que venceu somente na divisão de Melhor Guarda Roupa.

“Bombshell – O Escândalo”, que tinha duas atrizes nomeadas (Charlize Theron na categoria principal e Margot Robbie para atriz secundária), ficou-se apenas pela conquista do Óscar de Melhor Caracterização. “Le Mans 66: O Duelo”, que tem como título original “Ford vs Ferrari”, levou para casa duas estatuetas técnicas (Melhor Edição de Som e Melhor Montagem), “American Factory” foi considerado o melhor documentário, “Learning to Skateboard in a Warzone (If You’re a Girl)” a melhor curta documental, “The Neighbor’s Window” a melhor curta metragem e “Hair Love” a melhor curta de animação.

Na categoria musical, Elton John e Taron Egerton levaram a melhor na categoria de Melhor Canção Original com “(I’m Gonna) Love Me Again” — pese embora os créditos antigos de Randy Newman, que compôs “I Can’t Let You Throw Yourself Away” para “Toy Story” 4. O filme, por sua vez, venceu na categoria de Melhor Filme de Animação — foram preteridos concorrentes como “Klaus” e “Como Treinares O Teu Dragão: O Mundo Secreto”. Já “Joker” venceu na categoria de Melhor Banda Sonora, que foi composta pela islandesa Hildur Guðnadóttir.

A política com Brad Pitt, Julia Reichert e Hildur Guðnadóttir

Havia quem antecipasse uma cerimónia especialmente política, com mensagens diretas e personalizadas para Donald Trump. Afinal, Hollywood é conhecida por albergar maioritariamente liberais (no sentido norte-americano, progressista e “de esquerda”, do termo) e o presidente dos Estados Unidos da América é um republicano pouco polido na linguagem que está envolvido no furacão de um impeachment. Apesar disso, exceção feita a uma referência de Brad Pitt a John Bolton e ao impeachment (já lá vamos), pouco se ouviu sobre o assunto.

O formato dos Óscares a isso obrigou: durante a noite tinham de ser entregues 24 estatuetas, a que se somavam momentos musicais e apresentações dos vencedores por celebridades que também teriam alguns segundos para falar.

Foi precisamente à boleia do formato dos Óscares que Brad Pitt fez a sua piada política: disse que tinha apenas 45 segundos para falar, “que é mais do que o Senado deu ao John Bolton [antigo diplomata e ex-conselheiro de Segurança Nacional] esta semana. Talvez o Quentin faça um filme sobre isso. No final, os adultos fazem a coisa certa”. Bolton chegou a acusar Trump de lhe ter ordenado que o ajudasse a pressionar a Ucrânia para investigar “rivais democratas”, mas não chegou a testemunhar no processo de impeachment.

Fora isso, sobraram apenas os agradecimentos e elogios habituais: ao realizador do filme, Quentin Tarantino, que é “original e único”, e a Leonardo DiCaprio e ao “resto do elenco e da equipa”. Brad Pitt dedicou ainda o Óscar aos filhos, “que dão cor a tudo o que faço”, e aproveitou o seu papel de duplo no filme para dizer que “é altura de mostrarmos alguma amor pelos duplos e pelas equipas que asseguram esses papéis”.

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As mensagens mais políticas, mas mais abrangentes e menos focadas num alvo concreto, foram proferidas por figuras menos conhecidas, como Julia Reichert e Hildur Guðnadóttir.

Reichert, realizador do filme “American Factory”, que venceu o Óscar de Melhor Documentário, elogiou os nomeados da sua categoria, que “arriscam as vidas para contar histórias sobre hospitais que estão a ser bombardeados na Síria, sobre o que acontece no Brasil, na Macedónia”. E prosseguiu dizendo que o seu documentário “é sobre o [estado do] Ohio e a China, mas podia ser sobre qualquer sítio em que as pessoas vestem um uniforme para tentarem que a vida das suas famílias melhores”. Os trabalhadores, disse ainda a realizadora de “American Factory”, estão a ter “cada vez mais dificuldades por estes dias” e as coisas, acrescentou já como invetiva social e política, “melhorarão quando os trabalhadores de todo o mundo se unirem”.

Já a islandesa Hildur Guðnadóttir, autora da banda sonora de “Joker”, focou-se no feminismo e dirigiu uma palavra “às raparigas, às mulheres, às mães, às filhas: por favor, falem. Precisamos de ouvir as vossas vozes”. Por sua vez, os autores de “Hair Love”, vencedor do Óscar de Melhor Curta de Animação, foram ao palco falar de desigualdade e preconceito racial: lembraram que “as representações importam muito, especialmente nos cartoons“, agradeceram às “pessoas progressistas” que investiram na curta de animação e explicaram que esta tem também o objetivo de “normalizar o cabelo dos negros”, um tema que consideram relevante atualmente.

O “joker” penitenciou-se, falou de vacas e lembrou o irmão

Laura Dern estará certamente a ter um começo de segunda-feira auspicioso. A atriz de Los Angeles que já fora nomeada para um Óscar de Melhor Atriz em 1992 (pelo desempenho em “Rosa – Uma Mulher de Fogo”) e para uma estatueta de Melhor Atriz Secundária em 2015 (por “Livre”) venceu finalmente um Óscar. Acresce que esta segunda-feira era o seu aniversário: faz 53 anos e, no seu discurso de agradecimento, lembrou “os artistas presentes nesta sala, as minhas irmãs e as minhas colegas”.

A atriz de “Marriage Story” agradeceu depois ao realizador do filme, Noah Baumbach, pela sua “visão e magia”, dizendo-lhe ainda: “Obrigada pelas tuas palavras”. De seguida, nomeou os restantes atores com quem contracenou, agradecendo-lhes também, e terminou fazendo a defesa da sorte que é ter como ídolos os pais, neste caso Diane Ladd e Bruce Dern, ambos atores. “Melhor prenda de aniversário de sempre”, concluiu.

Também a sua colega de profissão, a atriz Renée Zellweger, venceu um Óscar na última noite e lembrou o legado de Judy Garland, atriz que interpreta no filme “Judy” e que “não recebeu esta honra no seu tempo”. No entanto, prosseguiu, está certa de que “este momento é uma extensão da celebração do seu legado, que começou na rodagem do nosso filme (…) Ms. Garland: está certamente entre os heróis que nos unem e que nos definem e este prémio é certamente para si. Estou tão grata”.

As atrizes Renée Zellweger (à esquerda) e Laura Dern (à direita), vencedoras dos Óscares respetivamente de Melhor Atriz e Melhor Atriz Secundária (@ Rachel Luna/Getty Images)

Igualmente pouco surpreendente mas mais corrosivo foi o discurso de Joaquin Phoenix. O ator tem sido notícia em todo o mundo pela sua participação em manifestações pelo clima e pelos discursos político-sociais críticos do rumo recente do mundo e da indústria do cinema. Na última noite, começou por dizer que “esta forma de expressão”, o cinema, deu-lhe “a vida mais extraordinária” — e acrescentou: “Não sei onde estaria sem ela”.

Para Joaquin Phoenix, o melhor da notoriedade que ganhou na sétima arte nos últimos anos é poder usar a sua voz “por aqueles que não têm voz”. O ator explicou ainda que acredita não haver causas de luta individuais mas sim causas com um elo comum, porque “quer estejamos a falar de desigualdade de género, de racismo, de direitos queer, de direitos indígenas ou de direitos animais, estamos a falar de uma mesma luta contra a injustiça”.

Estamos a falar de uma luta contra a crença de que uma nação, uma pessoa, uma raça, um género, uma espécie, tem o direito de dominar, usar e controlar outra com impunidade. Acho que nos desconectámos muito do mundo natural. Muitos de nós acreditam que somos o centro do universo. Vamos ao mundo natural e pilhamos os seus recursos”, referiu.

O ator deu ainda o exemplo do consumo de leite como um ato que simboliza a visão egocêntrica da espécie humana: “Sentimos que temos o direito de inseminar artificialmente uma vaca e roubar o seu bebé, mesmo que o seu choro de angústia seja inconfundível. Depois pegamos no leite dela, que teria como destino o seu bezerro, e colocamo-no no nosso café e nos nossos cereais“, referiu.

Joaquin Phoenix depois de receber o Óscar de Melhor Ator pelo desempenho no filme “Joker” (@ Getty Images)

A terminar, Phoenix penitenciou-se: “Tenho sido egoísta, tenho sido cruel por vezes, tenho sido alguém com quem é difícil trabalhar. E sinto-me grato por tantos de vocês nesta sala terem-me dado uma segunda oportunidade. Acho que é nesses momentos que estamos melhor: quando nos apoiamos uns aos outros. Não quando nos ‘cancelamos’ pelos nossos erros passados, mas quando nos ajudamos uns aos outros a crescer, quando nos educamos, quando nos guiamos uns aos outros rumo à redenção”. O discurso terminou com a recordação emocionada de uma letra que o irmão de Joaquin, River Phoenix — um músico, ator e escritor que morreu cedo, aos 23 anos, por overdose —  escreveu aos 17.

Veja a lista completa dos principais vencedores.

Melhor Filme
“Parasitas”

Melhor Realização
Bong Joon Ho, “Parasitas”

Melhor Atriz
Renee Zellweger, “Judy”

Melhor Ator
Joaquin Phoenix, “Joker”

Melhor Argumento Original
“Parasitas”, Bong Joon Ho e Han Jin Won

Melhor Argumento Adaptado
“Jojo Rabbit”, Taika Waititi

Melhor Canção Original
“(I’m Gonna) Love Me Again”, Rocketman

Melhor Filme de Animação
“Toy Story 4”

Melhor Caracterização
“Bombshell – O Escândalo”

Melhores Efeitos Visuais
“1917”

Melhor Fotografia
“1917”, Roger Deakins

Melhor Design de Produção
“Era Uma Vez Em… Hollywood”, Barbara Ling e Nancy Haigh

Melhor Documentário
“American Factory”

Melhor Curta Documental
“Learning to Skateboard in a Warzone (If You’re a Girl)”

Melhor Filme Internacional
“Parasitas”

Melhor Montagem
“Le Mans 66′: O Duelo”, Andrew Buckland e Michael McCusker

Melhor Ator Secundário
Brad Pitt, “Era Uma Vez Em… Hollywood”

Melhor Banda Sonora Original
“Joker”

Melhor Curta de Animação
“Hair Love”

Melhor Curta Metragem
“The Neighbor’s Window”

Melhor Edição de som
“Le Mans 66′: O Duelo”

Melhor Mistura de som
“1917″

Melhor Guarda Roupa
“Mulherzinhas”, Jacqueline Durran

Melhor Atriz Secundária
Laura Dern, “Marriage Story”