A história começa com uma pergunta feita pelo Ministério da Educação. É possível identificar as regiões e as escolas que conseguem melhores resultados com os alunos desfavorecidos? A Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência garante que sim e está a desenvolver um novo indicador que vai permitir saber isso mesmo. Ainda não está disponível, mas será público antes do próximo ano letivo arrancar. O objetivo é claro: perceber que fórmulas funcionam para combater as desigualdades sociais na educação.
“Este indicador, para nós, enquanto país, é importante para ver o que foi feito em escolas que estão a fazer a diferença”, sublinhou o secretário de Estado da Educação durante a apresentação, esta segunda-feira, das novidades do Infoescolas, portal de estatísticas do ensino básico e secundário, e que serve de base para criar anualmente os tradicionais rankings das escolas — que, mais uma vez, João Costa criticou por não aferirem a qualidade dos estabelecimentos de ensino.
Em contrapartida, o atual Governo quer dar “instrumentos mais ricos e diversificados” às escolas e que lhes permitam fazer uma reflexão sobre os seus métodos pedagógicos.
Em especial, o Ministério da Educação quer ver a promoção da mobilidade social e o novo indicador de superação de contexto vai ajudar a tornar esse trabalho das escolas mais visível. “A avaliação das escolas tem de servir de apoio ao combate às desigualdades sociais”, defendeu João Costa, lembrando que em Portugal pobreza e insucesso escolar continuam de mãos dadas.
Sabendo que há uma correlação entre desigualdade social e resultados escolares em Portugal, pretende-se perceber que escolas promovem a mobilidade social”, detalhou o secretário de Estado.
“No programa TEIP, que já tem vários anos, vemos que há algumas escolas que estão pouco acima do ponto zero, enquanto outras aumentaram muito o desempenho dos seus alunos, superaram o contexto”, afirmou João Costa. Os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP) são aqueles onde há mais pobreza e o programa pretende promover o sucesso educativo dos alunos.
Para além do novo indicador, o portal terá duas novidades: uma área reservada às escolas — que, entre outras coisas, permitirá ver que escolas fazem maior segregação de turmas — e uma ligação aos relatórios de avaliação externa.
Alunos falham quando têm de pensar
Durante a apresentação aos jornalistas, João Costa anunciou ainda que o IAVE (Instituto de Avaliação Educativa) está a preparar “um grande trabalho de análise sobre os resultados das provas de aferição”. A primeira conclusão, disse o secretário de Estado, é a de que a maior dificuldade dos alunos é quantos as perguntas implicam raciocínio.
“O que este relatório do IAVE nos mostra é que as principais dificuldades dos alunos não estão na memória, não estão nos conhecimentos. Estão na sua aplicação, na análise e na interpretação”, argumentou. No entanto, esta conclusão não é novidade e também os relatórios PISA, da OCDE, mostram que é neste tipo de questões que os alunos mais falham.
Esse foi, aliás, também o resultado do Relatório Nacional 2016-2017 sobre as provas de aferição do ensino básico: quando a pergunta é simples, sem rasteira e de conteúdos fáceis de memorizar, os alunos acertam na resposta. Quando implica capacidade de raciocínio e de interpretação do que foi aprendido, os resultados caem a pique, tanto para os bons como para os maus alunos.
A mais valia desta nova investigação é que irá analisar os resultados ao longo de dez anos letivos.
Provas de aferição. Onde falham os alunos? Quando é preciso raciocinar
Turmas só com repetentes vão saltar à vista
Com a nova área exclusiva para escolas, há alguns dados que vão saltar à vista. Desde logo, e sempre em comparação com as restantes escolas do país, vai ser possível perceber onde há maior segregação de alunos pelas turmas.
Para isso, a Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) olhará para dois indicadores: o número de alunos carenciados e o número de chumbos que cada aluno tem. Depois, verá o peso que cada um destes grupos tem nas diferentes turmas de cada escola, permitindo desenhar eventuais assimetrias a nível nacional e dentro do próprio estabelecimento de ensino. Para tornar a leitura ainda mais clara, será atribuído um percentil a cada caso o que permitirá perceber se aquela escola está dentro ou fora do padrão de formação de turmas seguido pelos demais agrupamentos.
Na opinião de João Costa, assim será possível ver se uma escola está a colocar os repetentes todos na mesma sala ou se há maior concentração de alunos com Ação Social Escolar numas turmas em detrimento de outras. Por detrás destes padrões, ressalva, poderão estar diversos motivos que podem passar por pressão de encarregados de educação, opções da própria escola ou até mesmo por crença de que é assim que se faz noutros estabelecimentos de ensino, argumentou.
“A segregação é proibida em Portugal”, lembrou o secretário de Estado, referindo que sempre que há casos conhecidos a inspeção-geral é chamada a atuar. A possibilidade de separar alunos de acordo com notas foi eliminada da legislação, lembrou o governante, e no próximo despacho de turmas, ainda a ser trabalhado, essa ideia será “reforçada”, garantiu.
A ideia de ter uma nova área reservada só para escolas, explicou o secretário de Estado da Educação, é dar aos estabelecimentos de ensino “mais instrumentos ligados à desigualdade” para que possam “refletir, analisar e redefinir estratégias” quando tal é necessário. E porque estes dados são encarados como ferramentas internas para o trabalho da escola, explicou João Costa, para já, não serão do domínio público, nem estarão disponíveis para os encarregados de educação. Além da direção da escola, que decidirá quem tem acesso aos dados, as equipas de avaliação externa também poderão consultá-los.
Para além das assimetrias de turmas, nesta área fechada do site Infoescolas haverá também informação sobre o caminho que seguem os alunos depois do secundário, ou seja, se vão para o ensino superior, para que tipo de curso e para que escola. A última novidade será a informação sobre o contexto socioeconómico dos alunos, sempre em comparação com as restantes escolas do país.
Avaliação externa passa a ser mais fácil de encontrar
Por último, a terceira novidade é que passa a haver uma ligação direta para os relatórios de avaliação externa, de forma a que toda a informação sobre um agrupamento esteja reunido num único sítio. Os relatórios já eram públicos, disponíveis no site da Inspeção-Geral da Educação e da Ciência, mas agora o link para o documento passa a estar na página de cada agrupamento, tornando mais fácil a procura da informação.
Para já, há 19 relatórios prontos, explica o subdiretor da DGEEC: “Em 2019 iniciou-se o terceiro ciclo de avaliação externa da escolas e durante quatro anos todas serão visitadas. Para já, a inspeção-geral tem 15 relatórios prontos, contando ter mais 91 até ao final do ano.” A partir daí, a previsão é de que anualmente sejam elaborados cerca de 100 relatórios, esclarece João Baptista.
O ano passado, na última atualização do portal Infoescolas, o secretário de Estado João Costa anunciou que a inclusão passaria a ser um indicador chave para avaliar a qualidade das escolas, algo que já deverá estar espelhado nos relatórios que vão começar a ser publicados.
A intenção da tutela era a de introduzir na avaliação uma análise qualitativa, a par da quantitativa que já existia, centrando a avaliação muito mais nos processos pedagógicos das escolas do que nos resultados, explicou então o governante.
As avaliações externas começaram em 2006 e decorrem de cinco em cinco anos, período em que são abrangidos todos os estabelecimentos da rede pública. A primeira, em fase-piloto, ocorreu entre 2006 e 2011. A segunda, de 2012 a 2017. A terceira está atualmente a decorrer.
O portal InfoEscolas disponibiliza dados estatísticos sobre cerca de 1,3 milhão de alunos (5.200 escolas) de Portugal continental matriculados em escolas públicas e privadas, do básico e do secundário. A data de referência para a generalidade dos dados é o ano letivo 2017/18.