Dois soldados inimigos, divididos por um muro e prontos para mais um dia de guerra, protagonizam uma nova peça de teatro para a infância, que o Teatro Nacional D. Maria II estreia em março em Lisboa.

“Onde é a guerra?”, com encenação de Catarina Requeijo e interpretação de Luís Godinho e Victor Yovani, é a mais recente produção do teatro nacional no projeto “Boca Aberta”, feito de espetáculos pensados especificamente para os mais novos.

A peça, com meia hora de duração, põe em confronto dois soldados em guerra, separados por um muro e com escassos recursos de comunicação. De cada lado da barricada, munidos de um “manual de guerra” e muita desconfiança, os dois soldados fazem suposições sobre o inimigo, considerando-o sempre mau.

A peça foi escrita por Inês Fonseca Santos e Maria João Cruz, inspirada em livros para a infância que versam sobre a guerra, em particular “L’ennemi”, de Davide Cali e Serge Bloch (inédito em Portugal).

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Esta é uma peça “sobre a guerra, porque fala do outro e nós estamos a ser instigados diariamente a ter medo do outro, que vai variando conforme os temas da atualidade. [Fala] sobretudo de um outro que seja diferente de nós. E essa vida dominada pelo medo, pela desconfiança está muito presente”, explicou Catarina Requeijo aos jornalistas no final de um ensaio de imprensa.

Na peça, os militares desconfiam um do outro, imaginam como será o inimigo – não toma banho, tem mau hálito, é peludo e só tem um olho -, até que, por força da necessidade, vão descobrindo pontos em comum: Ambos gostam de chá, de comer maçãs e de jogar às cartas.

Queríamos duas pessoas divididas, queríamos uma barreira física, um muro; e os muros criam separações, criam desconfiança e criam uma imaginação fértil. O medo alimenta uma imaginação muito fértil”, explicou Catarina Requeijo.

Na narrativa são ainda acrescentadas situações que remetem para o contexto da vida das crianças, com birras entre soldados, intervalos para o lanche – anunciados através de um megafone – e partilha de objetos e de refeições.

Este é mais um dia naquela guerra, como se fosse um dia igual a todos os outros. E o dia-a-dia das crianças também é feito de muitas rotinas, intervalo para o lanche da manhã, recreio. Eles conhecem esta dinâmica de organização do dia”, disse Catarina Requeijo.

“Onde é a guerra?” estreia-se na terça-feira, na escola básica do 1º ciclo Engenheiro Ressano Garcia, em Lisboa, e no dia 14 no Salão Nobre do Teatro Nacional D. Maria II. É dirigida a crianças a partir dos 3 anos.

Esta é a 12.ª peça criada no projeto “Boca Aberta”, desenvolvido desde 2015 pelo Teatro Nacional D. Maria II, com o objetivo de apresentar o teatro e as expressões dramáticas às crianças, em espetáculos que são apresentados no teatro e nas escolas de Lisboa.

Em cinco anos, as peças de teatro estreadas no “Boca Aberta” já abordaram temas tão diversos como a morte, o amor, o medo, as viagens.

Os espetáculos são criados a partir de textos de integram o Plano Nacional de Leitura, clássicos da literatura e obras contemporâneas de autores portugueses e estrangeiros.

Além da apresentação para públicos, em contexto escolar e em sala de espetáculo, o projeto “Boca Aberta” já incluiu oficinas para mais de cem educadores de infância e professores do ensino básico.

Catarina Requeijo explica que o projeto “foi crescendo, mas não mudou muito na sua essência”.

“Todos os anos refletimos sobre o que pode ser interessante e pertinente falar, relacionado com o universo que apanhamos nas escolas. (…) Há um objetivo de dar trabalho aos pais, quando falamos da morte, do amor, de todas as outras coisas; que em casa surjam perguntas. E há trabalho para as educadoras, fazemos sugestões de como podem prolongar estes assuntos em sala e aula”, disse.