Gosto de “O Grande Lebowski”, dos irmãos Coen não tanto por causa da personagem do Dude interpretada por Jeff Bridges, que sempre me contendeu um bocado com os nervos, mas muito mais pela heteróclita e bizarra galeria de comparsas que Joel e Ethan Coen puseram a orbitar em redor dele. O Walter Sobchak de John Goodman, veterano do Vietname ultra-militarista e adepto de teorias da conspiração; o trinca-espinhas Donny de Steve Buscemi, sempre a ser mandado calar agressivamente por Sobchak; o grotesco grupo de Niilistas Alemães formado por Peter Stormare, Flea e Torsten Vogues; e claro está, Jesus Quintana, o azeiteiro cubano-americano e craque de “bowling” personificado por  John Turturro.

Apesar de estar em cena apenas durante alguns minutos, o longilíneo Jesus (que se refere a ele próprio como “The Jesus”) é uma das personagens mais castiças e inesquecíveis de “O Grande Lebowski”, com o seu berrante uniforme roxo, a rede foleira no cabelo, o tique de lamber a bola antes de cada lançamento, a mania de fazer uma grosseira dança sexualmente sugestiva depois de cada “strike”, e o modo arrogante e agressivo de se dirigir aos adversários, sobretudo ao Dude, que detesta. Jesus tem reputação de ser um delinquente sexual, e segundo Sobchak (que lhe chama “pederass”), cumpriu pena numa penitenciária por ter assediado um miúdo de oito anos.

[Veja o Jesus de John Turturro em “O Grande Lebowski”:]

John Turturro tem um afeto muito especial pela personagem de Jesus Quintana porque os Coen lhe deram, na altura, toda a liberdade para a compor como ele muito bem entendesse, e há muito tempo que a queria voltar a interpretar. Como os irmãos sempre se recusaram a fazer uma continuação de “O Grande Lebowski”, Turturro pediu-lhes autorização para voltar a personificar Jesus num filme autónomo que contasse as suas aventuras. Joel e Ethan Coen deram-lhe luz verde em 2014 para que ele o fizesse num “spin-off”, e Turturro escreveu, realizou e interpretou “The Jesus Rolls”, que se passa algum tempo antes dos acontecimentos narrados em “O Grande Lebowski” e pode agora ser visto na Amazon Prime Video.

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[Veja o “trailer” de “The Jesus Rolls”:]

Mas vai-se a ver e “The Jesus Rolls” é uma amarga deceção. Em vez de conceber uma história própria para Jesus, John Turturro foi buscar um velho, e à época, escandaloso, filme de Bertrand Blier “As Bailarinas” (1974), interpretado por Gérard Depardieu e Patrick Dewaere, fazendo de “The Jesus Rolls” um mero decalque americano deste. O Jesus de Turturro e o seu parceiro de “bowling”, Liam (agora interpretado por Bobby Cannavale), vivem basicamente as mesmas – e datadíssimas — peripécias anárquico-delinquentes das personagens de Depardieu e Dewaere, acompanhados por Marie (Audrey Tautou), uma cabeleireira que não consegue ter orgasmos (Miou-Miou, no filme original).

[Veja uma cena de “The Jesus Rolls:]

“The Jesus Rolls” não passa, assim, de um “remake” preguiçoso, tardio e desleixadíssimo de um filme que envelheceu bastante mal. Um embaraçoso desastre, independentemente de termos visto ou não o original, e que dá escasso uso a atores como Susan Sarandon, Christopher Walken, Sónia Braga ou Jon Hamm. John Turturro podia ter criado um enredo ambientado no “habitat” natural da personagem de Jesus – o “bowling” -, mas nem sequer soube capitalizar nisso para dar gás ao filme, que tem apenas uma única sequência envolvendo este jogo. Em vez do desejado e vistoso “strike”, “The Jesus Rolls” é uma desajeitada e dececionante bola na calha. 

Vá lá, ficamos ao menos a saber porque é que Jesus foi preso na realidade e que enquanto esteve atrás das grades, levou a sua penitenciária à vitória no torneio prisional. Isso sim, é que teria dado um belo filme para marcar o regresso de Jesus Quintana, mais de 20 anos depois de o termos conhecido em “O Grande Lebowski”.

“The Jesus Rolls” já está disponível na Amazon Prime Video