Cerca de 123.800 pessoas pedem bens alimentares, um ano depois de terem sido atingidas com a passagem do ciclone Kenneth, em 26 povoações no norte de Moçambique, indica um relatório de organizações humanitárias e da proteção civil.
“A alimentação é referida como a primeira necessidade, mais urgente, por 123.866 pessoas” em 26 localidades, lê-se num documento conjunto do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC) de Moçambique e da Organização Internacional das Migrações (OIM).
O levantamento foi baseado em inquéritos feitos nos dias 27 e 28 de fevereiro e representa a mais recente recolha de dados publicada acerca das povoações afetadas nas províncias de Cabo Delgado e Nampula, por onde passou o ciclone que matou 45 pessoas.
Além dos alimentos, a segunda necessidade mais urgente destacada por 44.769 pessoas são bens não alimentares (recipientes, ferramentas) em 23 povoações.
Há ainda 59.209 pessoas a apontar como terceira carência mais urgente a necessidade de abrigo e habitação em 17 localidades.
Segundo o documento, nas 36 localidades que declararam ter sido afetadas, a maioria (61%) disse ter recebido ‘kits’ de abrigo, totalizando 65.794 pessoas, enquanto as restantes referiram não ter recebido aquele tipo de apoio.
Hoje, passado um ano, em todas as povoações é referido que a totalidade da população efetuou reparações, sendo que metade usou materiais dos ‘kits’ de abrigo para remendar parte das coberturas das casas.
A juntar às necessidades humanitárias provocadas por aquele desastre natural, a região tem assistido a um aumento da violência armada, classificada agora como uma ameaça terrorista externa, tudo num contexto mais restritivo devido à pandemia de covid-19.
O ciclone Kenneth formou-se seis semanas depois de o ciclone Idai ter devastado a região central de Moçambique, provocando 603 mortos, no único ano desde que há registos em que o país foi atingido por dois ciclones de categoria de destruição extrema.
Abateu-se sobre terra no final do dia 25 de abril, numa região pouco habituada a este tipo de fúrias naturais: foi o terceiro ciclone a formar-se na zona norte do Canal de Moçambique, no oceano Índico, desde que há registos por satélite, de acordo com a agência de meteorologia francesa Meteo France – sendo que os outros dois, Elinah em 1983 e Doloresse em 1996, não tocaram a costa africana.
Este tocou e embora o seu corredor de destruição fosse estreito, a sua intensidade foi muito alta, massacrando o meio rural, incluindo as ilhas Quirimbas.
Além das mortes, os ventos superiores a 200 quilómetros por hora e a chuva intensa – que persistiu nos dias seguintes – arrasaram aldeias inteiras, destruíram 55.500 hectares de terrenos agrícolas, arrancaram 100.000 coqueiros e cajueiros e destruíram equipamentos de pesca artesanal.
Foram perdas imensas para uma população que vive quase exclusivamente do que apanha da terra e do mar.
O ciclone provocou danos na rede de escolas e centros de saúde, mas no inquérito feito pelo INGC e OIM é indicado que a população já voltou a ter ao dispor os serviços que tinha antes da tempestade.
Um ano depois, Moçambique atravessou nova época das chuvas, mas sem ciclones.
A época chuvosa de 2019/2020 está a terminar, ainda assim com 57 mortes registadas e outras 191 mil pessoas foram afetadas, segundo dados do INGC.
Na região centro, ocorreram 41 mortes na província da Zambézia, oito em Sofala, duas em Manica.
A província de Maputo (Sul) registou quatro mortes e Niassa (Norte) duas.
Os dados, que analisam a situação do país entre outubro a março, indicam que maior parte das mortes (45) foi causada por descargas atmosféricas, estando os outros óbitos ligados ao desabamento de residências e afogamentos.