Nos primeiros três meses do ano, em plena pandemia de Covid-19, a Farfetch quase duplicou as suas receitas para 331 milhões de dólares, quando comparado com os valores do mesmo período no ano passado. O volume de negócios num todo também subiu 46% para 611 milhões de euros e os prejuízos mantiveram-se “relativamente inalterados”, com uma subida de 2%, para 79,2 milhões de euros.
Para Luís Teixeira, responsável por todas as operações da plataforma online de moda de luxo, “os resultados foram bastante positivos”, mas não nega que tenha sentido o impacto provocado pelo surto do novo coronavírus. “Dizer que não sofremos impacto seria um exagero. A realidade é que o nosso modelo de negócio é muito resiliente e conseguimos, de facto, entregar crescimento e servir os clientes em todo o mundo”, diz ao Observador. O executivo acrescenta ainda que estes números provam que os investimentos feitos ao longo do tempo “foram corretos”.
“Isto, aliado ao nosso modelo de negócio, consegue que o nosso negócio seja resiliente, não imune [à pandemia], mas resiliente”, afirma.
Farfetch fatura 611 milhões durante a pandemia, prejuízos atingem 79 milhões
Questionado sobre se os resultados divulgados na quinta-feira, a seguir ao fecho da bolsa de Nova Iorque, tinham ficado em linha ou àquem das expectativas, o executivo do unicórnio (empresa avaliada em mais de mil milhões de dólares) com ADN português explicou que é impossível saber como seriam os resultados noutro contexto, mas que, ainda assim, as orientações que tinham estabelecido para o volume de negócios da plataforma digital, “que é comparável”, neste trimestre (em relação ao anterior, o último de 2019) estavam em linha com o que acabou por acontecer.
“Esperávamos entregar um crescimento na ordem dos 20%, era o nosso consenso e o nosso guidance do último trimestre de 2019 para o primeiro trimestre de 2020. E entregámos quase os 20%”, explica.
Se compararmos estes resultados com os dos últimos três meses do ano passado, percebemos que os prejuízos da loja online de moda de luxo caíram 28% (de 110,126 milhões para 79,2 milhões) e que o volume de negócios também desceu 17% (de 740 milhões para 611 milhões).
Questionado sobre se a pandemia obrigou a cortar nos custos da empresa e se motivou despedimentos, Luís Teixeira diz que, neste momento, ainda “ninguém foi despedido”. “Até me custa falar nessa palavra”, refere, e acrescenta que a vantagem é tratar-se de uma “empresa ágil”, que consegue “adaptar-se rapidamente às estruturas de custos”.
Quanto ao objetivo de atingir, em 2021, o break-even (momento em que um negócio começa a ser rentável) no EBITDA (lucros antes de juros, impostos, depreciações e amortizações, ou seja, os resultados operacionais) ajustado, Luís Teixeira diz que se mantém.
“O consenso dos analistas é que iríamos entregar um EBITDA negativo no primeiro trimestre entre 30 e 35 milhões e dólares e entregamos de apenas 22 milhões. Isto não se faz num mês, já estamos nesta viagem de caminho para o break-even operacional há muito tempo. Portanto, estamos totalmente preparados para ajustar o nosso crescimento de custos, porque, felizmente, estamos a falar de crescimento, não estamos a falar de retração. E em função daquilo que é o nosso crescimento das vendas estamos mais do que preparados”, afirmou.
O responsável pelas operações da Farfetch explica que o foco da empresa é atingir a rentabiliadade operacional. “Vamos continuar a ajustar a nossa estrutura de custos àquilo que será o crescimento do futuro. A grande vantagem do negócio online é que nós sabemos ao dia, à hora, exatamente o que se está a passar nos mercados, não temos de esperar que feche um trimestre ou um mês para decidir como avançar, o objetivo continua a ser o mesmo.”
Sobre os prejuízos que cresceram 2% para 79,2 milhões de dólares quando comparados com os do primeiro trimestre de 2019, Luís Teixeira refere que, apesar de ser um indicador importante, o foco está nos resultados operacionais, porque as perdas são o reflexo do investimento da empresa nos negócios e nas pessoas, diz. É o que nos permite atingir os resultados operacionais, não só no presente, mas também na estratégia e visão do futuro.” Apesar de continuar a ser negativo, o EBITDA ajustado caiu 26% nos primeiros três meses do ano, totalizando 22,319 milhões de dólares.
Quanto ao facto de a empresa fundada e presidida por José Neves atuar no mercado online da moda de luxo, Luís Teixeira explica que daí até pode vir uma oportunidade para as vendas digitais crescerem. “O que nós sabemos é que o mercado de luxo sempre que contrai e sempre que há uma crise destas, é um mercado bastante resiliente, que recupera rapidamente. Efetivamente, vai haver uma crise, vai haver uma contração, mas é um mercado que assim que a economia melhorar, rapidamente recupera.”
E acrescenta: “Infelizmente — e digo infelizmente porque os motivos não são bons –, as compras nas lojas físicas nunca mais vão ser as mesmas e isto vai obrigar a uma aceleração do mercado, do negócio online”.
Sobre a forma como a pandemia pode ter impactado o negócio da empresa na China, a resposta é clara: “No primeiro trimestre, verificamos que a China cresceu mais do que o ano todo de 2019, ou seja, houve uma aceleração do crescimento, por uma razão muito simples. Os clientes chineses já são dos maiores clientes do mundo, só que grande parte desses clientes compra quando está a viajar. A partir do momento em que ficaram confinados, obviamente que, mesmo com uma correção do mercado, há uma grande mudança daquelas compras que seriam feitas nas lojas do mundo para o mundo digital”.
Nos primeiros três meses de 2020, apesar de a pandemia do novo coronavírus se ter alastrado pelo mundo todo, a Farfetch registou mais 45% nas visitas ao marketplace e o número de novos clientes também cresceu. “Acho que aquilo que vai acontecer é o seguinte: os clientes existentes vão comprar menos, isso é evidente, mas vamos ter mais clientes a comprar”. Para o próximo trimestre o foco está em garantir a segurança física e psicológica da equipa.
Fundada em 2008 por José Neves e com sede em Londres, a Farfetch é a plataforma tecnológica líder global para a indústria da moda de luxo. Estreou-se na Bolsa de Nova Iorque a 21 de setembro de 2018, com um preço por ação de 20 dólares. Foi a primeira startup com ADN nacional a valer mais de mil milhões de dólares e a entrar para o grupo dos unicórnios.