Litros e mais litros de água mineral importada de França, que teve como destino uma das muitas mansões do xeque Khalifa bin Zayed al-Nahyan, que neste caso em particular terá abastecido os depósitos da sua bilionária residência do século XVIII em Berkshire, no Reino Unido, com Evian, destinada a consumos correntes. A notícia é avançada pelo diário The Times, e ganha contornos ainda mais extravagantes se pensarmos que a residência raramente é visitada pelo presidente dos Emirados Árabes Unidos, emir de Abu Dhabi, e meio irmão do dono do clube inglês Manchester City, o xeque Mansour.

Reveladores documentos a que o jornal teve acesso mostram como o magnata de 71 anos, que se retirou da vida pública em 2014, depois de sofrer um AVC, fazem parte da batalha em tribunal que opõe a Berkeley Square Holdings, conjunto de empresas associadas ao xeque Khalifa e aos seus familiares, aos diretores britânicos da Lancer Property Asset Management, antigos gestores do seu império imobiliário em Londres, avaliado em 5.5 mil milhões de libras (cerca de 6.07 mil milhões de euros).

Khalifa bin Zayed al-Nahyan é, segundo o mesmo título, acusado do desperdício de recursos de forma negligente, prática que resumem com o termo “profligacy”, e que deverá ser extensível a outras moradas que detém naquele país, também elas vazias a maior parte do tempo, para além da mansão de 66 milhões de euros onde é possível tomar um duche… de Evian. É o caso de Ascot Place, uma mansão perto de Windsor Great Park, no Berkshire, (comprada por 18 milhões de euros e valendo agora mais de 66 milhões de euros). Ou ainda de Ham Gate, uma propriedade avaliada em 5 milhões de libras (5.5 milhões de euros) com verdejantes jardins, localizada no sudoeste da capital inglesa — casa essa que o xeque nunca terá chegado a ocupar, sob pretexto de que seria demasiado pequena para acolher todo o seu staff e corpo de seguranças. De resto, e numa manobra para adquirir mais espaço, o emir terá mesmo tentado comprar a casa dos vizinhos — mas os respetivos donos recusaram.

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O The Times dá ainda conta de outros detalhes sobre o litígio, nomeadamente como o xeque afastou, em 2017, a empresa até então responsável pela gestão, que seria rendida por uma companhia de Abu Dhabi, decisão que abriu a guerra legal agora em curso. Representantes do xeque acusam os diretores da Lancer de cobrarem taxas excessivas e de desonestidade. Acusam ainda a empresa de desvio de mais de 30 milhões de libras enquanto estiveram a cargo da carteira de propriedades de Khalifa, que envolve, segundo o The Times, 120 imóveis. Por seu turno, a Lancers nega todas as alegações e contra-ataca com um processo sobre a Berkeley Square Holdings, conjunto de firmas registadas nas ilhas Virgens britânicas, na sequência de um afastamento que consideram injusto, além de comissões que consideram terem ficado por pagar.

The State Visit Of The President Of The UAE - Day One

Com a rainha Isabel II, em 2013, durante uma visita de Estado com passagem por Windsor. No dia seguinte, seria recebido por David Cameron em Downing Street © Toby Melville – WPA Pool/Getty Images)

Sobre a lista de excentricidades do xeque, os documentos revelam ainda que terá gasto mais de 450 mil libras por ano em 15 empregados permanentes para uma casa no norte de Madrid, que não é visitada há 17 anos. Gastos semelhantes se aplicam a endereços em França.

Khalifa bin Zayed al-Nahyan pertence a uma família cujo império ronda os 15o mil milhões de dólares, com bens dispersos pelo mundo que ascendem aos 875 mil milhões de libras. De Bond Street a Sloane Street, do edifício que alberga a luxuosa Chanel em Londres a Knightsbridge Court, sem esquecer o espaço reservado ao maior food hall do Reino Unido, também na capital britânica, a marca de Al-Nahyan está um pouco por todo o lado.

Em 2010, a rainha Isabel II agraciava-o com a Grande Cruz da Ordem de Bath, que o xeque retribuiu distinguindo a monarca com a Ordem de Zayed, a mais alta condecoração civil dos Emirados Árabes Unidos, cujos destinos têm sido assegurados pelo seu irmão Mohammed bin Zayed Al Nahyan, príncipe da Coroa, desde o seu afastamento da vida pública.

Quanto ao julgamento deste caso, estará agendado para maio do próximo ano. E seja qual for o desfecho, uma coisa é certa: xeques, Reino Unido e controvérsia, está longe de ser uma estreante equação. Há poucas semanas, surgia a notícia de que o milionário Mohammed bin Rachid al-Maktoum tentava há mais de um ano obter aprovação para expandir a sua propriedade em Wester Ross, na Escócia, um plano que contou com forte oposição local.

E em março deste ano, em mais um polémico folhetim, agora à margem de bilionárias residências, um tribunal de família do Reino Unido dava como provadas as ameaças do mesmo emir do Dubai contra a princesa Haya e os planos para raptar duas filhas do xeque Mohammed bin Rashid Al Maktoum, em 2000 e 2018, outro caso altamente mediático no passado recente.