Um tribunal de família do Reino Unido concluiu que o emir do Dubai, o xeque Mohammed bin Rachid al-Maktoum, planeou o rapto de duas filhas e sujeitou a princesa Haya, uma das suas mulheres, a uma campanha de “intimidação”. O documento com as conclusões do tribunal, cujo conteúdo é revelado esta quinta-feira por meios de comunicação britânicos como o The Guardian e a BBC, pode colocar em causa as relações diplomáticas entre os Emirados Árabes Unidos e o Reino Unido, país ao qual, no ano passado, a princesa Haya pediu proteção.

Em causa estão os desaparecimentos das princesas Shamsa (em 2000) e Latifa (em 2018), que foram raptadas por ordem do regime dos Emirados Árabes Unidos e enviadas à força de volta para o Dubai; e também as acusações feitas no ano passado pela princesa Haya, a sexta mulher do emir do Dubai e filha do rei da Jordânia. Em 2019, a princesa Haya divorciou-se de Mohammed bin Rachid al-Maktoum e refugiou-se no Reino Unido, país ao qual pediu proteção, alegando ser alvo de violência por parte do regime — isto porque o emir desconfiava que a princesa tivesse uma relação extraconjugal com um guarda-costas.

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A princesa Shamsa aproveitou umas férias no Reino Unido no verão de 2000 para fugir do regime dos EAU, mas seria mais tarde raptada nas ruas da cidade britânica de Cambridge e colocada num jato privado contra a sua vontade para ser levada de volta para o país. Já a princesa Latifa tentou fugir ao regime em 2018, através de um plano que concebeu durante vários anos — passando por Omã —, mas acabaria por ser capturada na Índia e levada de regresso para o Dubai. A fuga da princesa Latifa, que chegou a gravar um vídeo para ser divulgado em caso de ser capturada ou morta, deu mais tarde origem a um documentário da BBC.

O caso está na justiça britânica desde que a princesa Haya se refugiou no Reino Unido com os seus dois filhos. Quando o xeque Mohammed bin Rachid al-Maktoum tentou que as duas crianças regressassem ao Dubai, a ex-mulher do líder do emirado interpôs uma ação judicial junto de um tribunal de família britânico, que agora analisou todo o historial de ações levadas a cabo pelo xeque.

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O regime dos EAU sempre negou ter organizado qualquer rapto internacional destinado a transportar as duas princesas, filhas do xeque Mohammed bin Rachid al-Maktoum, para o Dubai. Agora, a decisão do tribunal britânico descreve ao detalhe os acontecimentos à volta dos desaparecimentos das duas princesas e das ameaças à mulher do xeque, dando como provado que os raptos foram planeados e ordenados pelo líder do Dubai, que é também o vice-presidente dos EAU.

No documento de 34 páginas, assinado pelo juiz Andrew McFarlane, lê-se que o xeque Mohammed bin Rachid al-Maktoum “continua a manter um regime através do qual estas duas jovens mulheres estão privadas da sua liberdade“.

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O juiz vai mais longe e afirma que os factos agora dados como provados “podem envolver descobertas de comportamentos contrários ao direito penal de Inglaterra e do País de Gales, ao direito internacional, às leis marítimas internacionais e às normas de direitos humanos a nível internacional”. Andrew McFarlane considera que as denúncias de abusos físicos feitas pela princesa Latifa no vídeo são credíveis e podem constituir atos de tortura.

As conclusões do tribunal surgem ao fim de vários meses de um processo que envolveu a audição de dezenas de testemunhas, com o juiz a aceitar como credíveis todas as alegações apresentadas pela princesa Haya — incluindo as de que o emir do Dubai a tentou raptar com recurso a um helicóptero, ameaçou raptar os filhos, se divorciou dela sem a informar e a ameaçou por causa da alegada relação extra-conjugal.