Quando Alexandre Guedes bisou naquela final da Taça de Portugal no Jamor, o Desp. Aves fez história. Já tinha sido uma vez vencedor da extinta 2.ª Divisão B mas ganhou ali o seu primeiro troféu, passando ao lado de um jogo marcado por tudo o que acontecera no Sporting uns dias antes com a invasão à Academia. Estávamos em 2018, numa temporada que curiosamente tinha começado com uma receção aos leões de Jorge Jesus na primeira jornada do Campeonato. Aí, os leões ganharam. Com casa praticamente cheia e uma tribuna ainda mais a abarrotar com asiáticos com participação na SAD, tentados a investir na SAD ou amigos de quem estava na SAD. Agora, com o Desp. Aves falado como nunca mas pelas piores razões, poucos percebem o que se passou em dois anos.

https://observador.pt/2018/05/20/desp-aves-sporting-o-dia-da-maior-festa-depois-de-uma-semana-negra-que-ainda-nao-acabou/

Uma coisa é certa: depois de ter ameaçado não participar na última jornada do Campeonato com o Portimonense, no Algarve, o Desp. Aves alargou essa possibilidade também à 33.ª ronda, onde recebe o Benfica. Recebe ou ia receber. E é essa a dúvida que a Liga de Clubes esteve a tentar esclarecer esta segunda-feira na sua sede, juntando não só responsáveis da administração da SAD mas também o presidente do clube. O órgão mostrou-se disposto a tudo para que se cumpram os dois últimos encontros e para que a verdade desportiva seja salvaguardada – de acordo com os regulamentos, quem tiver falta de comparência numa das últimas três jornadas fica excluído da prova e todos os resultados deixam de contar. Ou seja, mexe na classificação. Exemplos: o Sp. Braga ficava no terceiro lugar por troca com o Sporting e o Portimonense estava garantido na Primeira Liga para 2020/21.

“A situação dos seguros está resolvida e há mais duas ou três de montantes mais pequenos que também estão a ser ultrapassadas. Tenho ali os NIB para fazer as transferências. Neste momento é fazer os jogos e depois logo vemos. Hoje a SAD abriu um bocadinho para que não estivéssemos sempre a resolver um problema e criar outro. É jogo a jogo. Com o Benfica, é quase 100% que se vai realizar, com o Portimense logo se vê. Ajuda? Não estou muito disponível para mendigar. Ontem não vi ninguém mas temos de ter em conta que era domingo. Vou tentar sensibilizar a autarquia”, disse o presidente do Aves, António Freitas, após o encontro na Liga de Clubes, ao mesmo tempo que revelou acreditar que mais nenhum jogador vai rescindir com o clube até ao final do Campeonato.

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Resolvidas essas questões relacionadas com os seguros, que já ontem [domingo] tinham sido salvaguardadas em caso de necessidade pela Liga, os jogadores apresentaram-se pouco depois das 17h junto ao estádio para treinar, algo que desta vez aconteceu mesmo. Antes das 17h30, o treinador Nuno Manta Santos também chegou. Soube-se também que o Benfica viaja para o Norte ao final da tarde, onde vai estagiar não admitindo outro cenário que não seja jogar.  Paulo Bernardo e Gonçalo Ramos são as novidades nas opções de Nelson Veríssimo para a penúltima jornada do Campeonato, substituindo na lista de 22 jogadores o castigado Weigl e o lesionado Cervi. Ninguém da parte dos avenses prestou declarações mas foram testados para o novo coronavírus 23 jogadores (Reko Silva já teve Covid-19) e falharam o treino Raphael Aflalo, Cláudio Falcão e o Mohammadi, iraniano que é o melhor goleador da equipa e que pensava rescindir contrato. A Direção do clube esteve em peso no treino e amanhã há estágio.

“A situação da SAD do Aves era um desastre à espera de acontecer e exige uma reflexão sobre a eficácia dos mecanismos de controlo financeiro e a capacidade destes mesmos mecanismos para proteger a integridade da competição. Disse-o e mantenho. Na situação atual da SAD do Aves, mais do que uma investigação de âmbito desportivo, é preciso ação policial. O que se tem passado é demasiado grave. Esta tem sido uma época penosa e ninguém pode associar a situação de pandemia ao descalabro na gestão desportiva e financeira, que fica cada vez mais evidente”, salientou também Joaquim Evangelista, presidente do Sindicato de Jogadores, num artigo de opinião onde disse que “o escrutínio dos investidores das SAD’s em Portugal é anedótico”: “Temos urgentemente de rever este regime e relação jurídica entre clube e SAD, na certeza de que é preciso a ação da justiça desportiva e penal nos casos onde, objetivamente, é de infrações disciplinares graves e de crimes que estamos a falar.”

“Os jogadores tiveram uma conduta irrepreensível. Em março deparámo-nos com uma situação de incumprimento reiterado. A SAD do Aves chumbou no controlo salarial e o plantel de Sub-23, em particular, apresentava uma situação crítica, sem receber qualquer salário desde finais de 2019. A maior parte destes jovens da equipa Sub-23, até para as necessidades básicas, estava a passar dificuldades. A esses jogadores demos uma resposta imediata, através do Fundo de Garantia Salarial, mecanismo que ficou também à disposição do plantel principal. Desde essa altura que acompanhamos, esclarecemos dúvidas, procuramos estar ao lado dos jogadores que têm enfrentado, recordo, um contexto adverso, desde os vencimentos às condições de trabalho. Não aceito que neste momento se tentem desculpas de mau pagador. Não tenho dúvidas de que o organizador da competição tudo fará para resolver os problemas que impedem o plantel do Aves de competir. Também não duvido do compromisso de jogadores e equipa técnica. Já tenho as maiores dúvidas que isto não se volte a repetir”, acrescentou.

Aves. O clube da vila é “made in China” (mas não só: há também português com “açúcar”)

Entretanto, soube-se esta manhã que os médicos do Desp. Aves, Filipe Puga e André Couto, foram despedidos. O jornal Record acrescenta que essa dispensa foi feita por Estrela Costa e através de uma chamada telefónica. De acrescentar que, durante a pandemia, Filipe Puga, que é filho do responsável pelo departamento médico do FC Porto, Nelson Puga, teve um papel extra futebol importante, juntando não só a atividade como médico de família no Centro de Saúde de Arca d’Água à disponibilidade para, com André Couto (que é ortopedista), se colocar à disposição dos sócios do Desp. Aves no concelho de Santo Tirso para prestar os cuidados necessários, por forma a evitar nos casos possíveis deslocações a hospitais ou centros de saúde durante o confinamento.

Belenenses SAD anuncia queixa contra SAD do Desp. Aves

Rui Pedro Soares, presidente do Belenenses SAD, anunciou esta segunda-feira em conferência de imprensa que vai avançar com uma queixa contra a sociedade do Desp. Aves por suspeitas de corrupção desportiva.

“Em face do que tem sido público desde a passada sexta-feira, com toda a comunicação que tem sido transmitida pela administração da Aves SAD, a Belenenses SAD apresentou participação criminal por suspeitas de corrupção desportiva. Este crime tem moldura penal máxima de dez anos de prisão. Entendemos que tudo o que se tem passado desde sexta-feira passada e que tem sido público é contrário aos interesses da Aves SAD e por isso entendemos que podemos estar perante atos de índole criminosa que pretendemos que sejam investigados. Nós sabemos que é do interesse da Aves SAD que os dois jogos se realizem. É do interesse do grupo de trabalho da Aves SAD que os jogos se realizem. É do interesse do futebol português que o jogo se realize. Entendemos que o que tem vindo a ser comunicado desde a passada sexta-feira é contrário a todos esses interesses. Podemos estar perante indícios da prática de um crime de corrupção desportiva”, assumiu o dirigente.

“É preciso separar o trigo do joio para que as exceções não se transformem regra. E é preciso perceber que o futebol profissional em Portugal não pode estar à mercê de uma situação destas poder acontecer novamente. Temos dois meses até à próxima época e há mesmo muito trabalho a fazer. Vamos estar à altura das nossas responsabilidades e a Liga também vai ter de estar. Esperamos que no imediato seja apontada uma data para que este tipo de situação não se volte a repetir. Ainda não aprovámos o orçamento da próxima época e vamos olhar com atenção para que não possam existir casos de equipas que entram nos últimos meses a entrar em decomposição e coloquem em risco a verdade desportiva. É fácil de fazer, basta ter vontade”, acrescentou Rui Pedro Soares.

O que se passou este fim de semana para ter chegado a este limite?

Já se sabia que existia o risco de não haver jogo com o Portimonense mas este fim de semana tudo se precipitou e o encontro com o Benfica, marcado para esta terça-feira à noite, ficou também em risco. Razão? Ao abrigo do que diz o Regulamento de Competições da Liga, não estavam reunidas as condições para a equipa ir a jogo.

“Realizámos esforços articulados com a Liga para ultrapassar esta situação mas pedimos para que os treinos fossem cancelados porque não temos como pagar os seguros e fomos notificados de que a nossa apólice estaria anulada desde o dia 17 de julho. A lei é clara quando diz que não podemos treinar nem jogar se não tivermos apólice válida. Ninguém no seu perfeito juízo metia alguém a treinar sem seguro”, disse Estrela Costa, assessora da SAD, em declarações à SportTV. Ou seja, e quando os jogadores se tinham deslocado para o local onde se iria realizar o treino, acabaram por voltar para trás. Os adeptos, esses, começaram a juntar-se perto do estádio. E o presidente do clube, António Freitas, não conteve as lágrimas perante tudo o que estava a acontecer: “Esta gente tem de ser banida, esta senhora Estrela Costa é agente de um dos jogadores que já rescindiu… Não vou dizer qual é o meu raciocínio, só querio que a equipa consiga competir nestas duas últimas jornadas”.

Desportivo das Aves vai faltar ao jogo com o Benfica

Em paralelo com tudo isto, os jogadores emitiram um comunicado com o Sindicato de Jogadores e também com a Associação Nacional de Treinadores, reforçando a vontade de entrarem em campo e pedindo para que “se criem condições para que no futuro mais nenhum profissional tenha de viver este tipo de situação”. E essa crença de que será possível ir a jogo ficou ainda mais percetível perante o que aconteceu também na tarde deste domingo, quando o laboratório encarregue de fazer os testes para a Covid-19, como tem acontecido 48 horas antes de cada jogo, viu as instalações fechadas mas acabou por fazer todas as recolhas no pavilhão com o apoio dos adeptos.