A diretora do Programa Nacional para as Hepatites Virais afirmou esta terça-feira que houve “um claro impacto” da pandemia de Covid-19 no diagnóstico destas doenças que é preciso recuperar, fazendo mais rastreios e iniciar os tratamentos que tinham ficado pendentes. Em Lisboa, cerca de 200 doentes mais vulneráveis vão passar a dispor de um serviço de rastreio à hepatite C, sem ter de se deslocar ao hospital.

“Não vale a pena pensar que não houve impacto, porque houve”, “as equipas de rastreio que estavam no terreno tiveram que suspender a sua atividade”, as consultas de saúde primários também reduziram muito e “houve certamente diagnósticos que não aconteceram”, disse Isabel Aldir em entrevista à agência Lusa, no Dia Mundial das Hepatites.

Segundo a médica infeciologista, os tratamentos na área das hepatites virais também foram protelados porque “as pessoas não chegavam aos cuidados hospitalares ou então já estando viram as suas consultas adiadas pelo confinamento”. Por isso, notou, “houve um claro impacto desta situação que agora temos todos que tentar recuperar, fazendo mais rastreios, recuperar as consultas, iniciar os tratamentos que tinham ficado pendentes”.

“Temos todos agora, individualmente, propormo-nos a fazer um bocadinho mais todos os dias para conseguirmos minimizar o impacto que sofremos com a Covid-19”, sustentou Isabel Aldir

A médica reconheceu que é uma situação que exige um grande esforço dos profissionais de saúde: “temos tudo o que é decorrente da atividade normal, agora agravada por recuperar o que está para trás e num tempo em que a organização dos serviços, a forma de funcionamento não está idêntica ao que era”.

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“Mas nós já demonstrámos, e os últimos meses foram claros, que temos vontade, temos saber, e que quando é preciso sabemos responder de forma adequada, e, portanto, eu acredito e tenho a esperança que vamos conseguir passar por esta fase e chegar ao final e o balanço se não for positivo pelo menos que não seja muito negativo”, sustentou.

Questionada sobre se os utentes já estão a perder o receio que tiveram no início da pandemia de se deslocaram aos serviços de saúde, Isabel Aldir afirmou que já se nota “um maior movimento”, em termos de consulta e de serviços de urgência.

As pessoas já estão a voltar mais àquilo que eram os registos habituais e, de facto, hoje os serviços e os hospitais e os cuidados de saúde primários estão todos organizados no sentido de serem seguros”, frisou.

Segundo a responsável do programa da Direção-Geral da Saúde, “é tão ou mais seguro ir a uma consulta de um centro de saúde ou de um hospital quanto ir ao supermercado fazer compras”.

“As pessoas não devem ter esse receio, não se devem afastar dos serviços de saúde porque o preço que se paga, por vezes, pode ser muito elevado na saúde do próprio”, advertiu.

No Dia Mundial das Hepatites, Isabel Aldir alertou para a importância de fazer o rastreio às hepatites. “Uma das mensagens é as pessoas perceberem que estas doenças são por vezes muito traiçoeiras na medida em que a pessoa pode ter uma hepatite e não ter qualquer sintoma e só muito tardiamente é diagnosticada”, afirmou.

Daí a necessidade de a pessoa fazer o teste, falar com um profissional de saúde e “os que ainda não foram vacinados não se esquecerem que a hepatite B tem uma vacina que é extraordinariamente eficaz e que pode evitar sérias complicações de saúde no futuro”.

“Futuro Livre de Hepatites” é o lema escolhido este ano para assinalar o Dia Mundial contra as Hepatites com forte foco na prevenção da hepatite B (HBV) entre mães e recém-nascidos.

Em Portugal, segundo os dados Infarmed, até ao dia 1 de julho de 2020, foram autorizados, desde 2015, 27.239 tratamentos para a hepatite C e iniciados 26.006. A taxa de cura mantém-se nos 97%, com 15.909 doentes curados e 572 não curados.

Mais de 27 mil tratamentos para a hepatite C autorizados desde 2015. Campanha alerta para a necessidade de reunir esforços no combate

Doentes de hepatite C mais vulneráveis vão ter espaço de rastreio em Lisboa

Cerca de 200 pessoas em situação de maior vulnerabilidade na Área Metropolitana de Lisboa vão passar a dispor de um serviço de rastreio à hepatite C (VHC), sem ter de se deslocar ao hospital, foi esta terça-feira anunciado.

Estas consultas descentralizadas têm início a partir de quarta-feira no centro de rastreiro IN-Mouraria e resultam de uma parceria entre o Grupo de Ativistas em Tratamentos (GAP) e o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC), segundo referiu à agência Lusa o presidente do GAP, Luís Mendão.

O nosso centro fica na Calçada de Santo André (Mouraria) junto à Rua dos Cavaleiros, uma zona de grande consumo de droga e onde existem muitos sem-abrigo. São exatamente essas as pessoas mais afetadas pela hepatite que nós queremos ajudar”, explicou.

Segundo o presidente da GAP, a taxa de sucesso de cura nestas pessoas mais vulneráveis é de apenas 11 a 12%, enquanto na restante população é de 60 a 70%.

E “é exatamente essa camada da população que tem maiores dificuldades no acesso aos hospitais e que mais ficam para trás no tratamento da doença”.

“Não é que exista uma negação formal dos hospitais. O problema é que as regras hospitalares são complicadas para estas pessoas e não são compatíveis com as suas necessidades”, alertou. Nesse sentido, Luís Mendão ressalvou que as consultas descentralizadas “serão essenciais para simplificar com segurança e qualidade o acompanhamento desses doentes”.

“Em vez de irem ao hospital fazem tudo onde já vão habitualmente”, apontou, sublinhando que esta medida “faz ainda mais sentido neste contexto da pandemia da Covid-19, em que é preciso minimizar as deslocações ao hospital e manter o distanciamento social. Assim, no centro da GAP, os pacientes poderão realizar procedimentos clínicos, como a confirmação da infeção, análises, elastografia, prescrição e avaliação do sucesso terapêutico.

As pessoas que tiverem resultados positivos no rastreio à infeção da hepatite C serão encaminhadas para o serviço de Gastrenterologia do Hospital de Santo António dos Capuchos. Estas consultas médicas podem ser presenciais ou por telemedicina.

Luís Mendão estima que cerca de 200 pessoas, de toda a Área Metropolitana de Lisboa, poderão beneficiar imediatamente deste programa, podendo o número vir a aumentar com o tempo.

“As pessoas estão ansiosas e entusiasmadas com o projeto”, sublinhou.