A ministra da Cultura, Graça Fonseca, disse esta sexta-feira em entrevista à SIC que sente que tem condições para continuar no Governo, apesar da contestação no setor, e abordou o episódio em que se recusou responder às graves dificuldades e carências alimentares sentidas por profissionais da área que estão a ser apoiados pelo grupo União Audiovisual, dizendo que aquele era um momento para beber “um drink de fim de tarde”.
Lembrando o anúncio recente de dinheiros públicos alocados à cultura — quer a compra de trabalhos de artistas plásticos nacionais, quer uma nova linha de apoio específica para o setor e o reforço orçamental que esta implica —, Graça Fonseca comentou assim o caso “drink”: “A situação que a cultura e o país vivem é muito grave. Exige de todos, incluindo da comunicação social, responsabilidade. Percebo que seja relevante tirar a palavra do respetivo contexto, tem piada nas redes sociais, circula bem. Mas não é com esse nível de seriedade e responsabilidade que devemos tratar o que está em causa”.
Já sobre se sente ter condições para continuar, começou por dizer o seguinte:
É muito curioso que essa pergunta me seja feita na semana em que o Governo, a ministra da Cultura e a sua equipa anunciam que adquiriram trabalho de artistas nacionais no valor de 500 mil euros, na semana em que é divulgada pela primeira vez uma linha de apoio social [especificamente] na área da Cultura.”
De seguida defendeu que apesar da contestação generalizada no setor, o seu trabalho dá-lhe a convicção de que tem condições para continuar com as suas funções à frente da tutela: “A minha convicção é que alguém, quem quer que seja, que conseguiu aprovar um reforço de 70 milhões de euros para seis meses na área da cultura, que conseguiu aprovar a primeira linha de apoio social exclusivamente para artistas, técnicos e outros trabalhadores, que conseguiu a aquisição [de obras de artistas nacionais] — o que não acontecia há 20 anos… a minha convicção é que qualquer pessoa que tenha conseguido isto tem condições para ser ministra“.
Na entrevista ao “Primeiro Jornal” da SIC, Graça Fonseca foi questionada sobre a demora em aprovar apoios específicos para trabalhadores do setor cultural, que têm percursos laborais tradicionalmente mais intermitentes, mas respondeu recordando que “durante os três meses do estado de emergência foram atribuídos um conjunto de apoios sociais aos trabalhadores independentes”.
No entanto, Graça Fonseca reconheceu — após ser confrontada nesse sentido — que “219 euros é o que sabemos que foi o que a maioria dos [trabalhadores do] setor cultural receberam“, de um apoio cujo teto máximo poderia superar os 600 euros. “Percebemos que a maioria estava a receber 219 [euros] e por isso foi aprovado em julho uma linha de apoio social. Na próxima segunda-feira as pessoas podem requerer esses apoios”.
Já quando confrontada sobre a demora em atribuir esta nova linha de apoios ao setor — aproximadamente quatro meses e meio depois de ter sido decretado estado de emergência em Portugal devido à pandemia do novo coronavírus —, a ministra defendeu o trabalho do Governo, dizendo que “no estado de emergência foram aprovadas medidas muito fortes de apoio social aos trabalhadores, empresas e associações. As medidas incluíram pessoas da área da cultura”.
Nunca o ministério da Cultura aprovou na sua história uma linha de apoio como a que poderá ser requerida na segunda-feira. Sabe quanto setores do Governo aprovaram apoios exclusivos para o seu setor? Nenhum”, vincou.
Mais à frente, a ministra da Cultura voltou a repetir a ideia de que já havia apoios generalizados que abrangiam, entre outros, este setor, mesmo reconhecendo que uma nova linha de apoio especificamente direcionada para a área era necessário: “Não há nenhuma razão para que todas as pessoas, inclusive as que trabalham na cultura, não estejam abrangidas no sistema de apoio universal” do Estado. Por outro lado, a “área da cultura” tem uma “especificidade” e é por estar a par de ela que este é “o único setor que vai atribuir e gerir um apoio social exclusivamente para pessoas da área”, ainda que quatro meses e meio depois da chegada da pandemia ao país.
Questionada sobre quantas pessoas em dificuldades de sobrevivência — e carências alimentares — está o grupo Audiovisual a ajudar, substituindo-se ao Estado no apoio, a ministra afirmou: “Eu sei quantas dezenas de milhares de pessoas estão ou podem ser abrangidas por uma linha de apoio social de 34 milhões de euros, pelo Governo. Sei que dezenas de milhares de pessoas podem receber este apoio social. A partir de segunda-feira, qualquer pessoa que trabalhe no setor da cultura pode preencher um requerimento online e receber de forma automatizada na sua conta bancária no mês de agosto a sua ajuda importante”.