Cinco administradores nomeados em 2015, três com mandato já terminado e ainda por substituir, alguns há meses. A situação que se vive no regulador do setor dos transportes, a Autoridade de Mobilidade e Transportes (AMT) não é inédita, nem sequer rara na administração pública. Até entidades reguladoras com mais visibilidade pública, como a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), estiveram com o presidente cessante (neste caso Carlos Tavares) mais de um ano à espera de ser substituído.

No caso da AMT, tutelada pelo ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos (via secretário de Estado adjunto), há três membros do conselho de administração que terminaram o mandato. Mas se dois deles ficaram em funções durante meses, autorizados pela tutela até serem substituídos, o terceiro – que terminou o mandato no final de julho – foi dispensado, sem ser substituído, o que resultou na redução do número de membros da administração de cinco para quatro.

António Ferreira de Lemos foi informado pela tutela de que não ficaria em funções até à nomeação de outro membro, depois de se ter manifestado disponível para o fazer, e ao contrário do que aconteceu com os colegas. Em declarações ao Observador, o antigo administrador da ATM admite que acha “muito estranho”, ainda que a decisão tenha sido justificada pelo gabinete do secretário de Estado adjunto e das Infraestruturas com a nomeação prevista de um novo conselho para este regulador.

Acho muito estranho, embora perceba a justificação dada pelo gabinete do secretário de Estado, que tenha sido o terceiro membro do conselho de administração da Autoridade de Mobilidade e Transportes a terminar o mandato e não ter sido autorizado a continuar em funções”.

Questionado sobre o duplo critério na administração do regulador e sobre o exercício de funções por parte de membros que já terminaram o seu mandato há meses, fonte oficial do Ministério das Infraestruturas deu a seguinte explicação ao Observador.

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O processo de substituição dos membros do conselho de administração da AMT está a ser planeado e preparado para ser implementado a curto prazo. Tendo sido já prolongado o mandato do Presidente e do vice-presidente, não se considerou necessário, na fase em que estamos, prolongar o mandato do membro vogal que agora terminou funções.”

O que seria normal era a nomeação dos três novos membros em substituição dos que terminaram o mandato. Ou então, como parece indiciar a resposta do Executivo, a nomeação em simultâneo de um novo conselho para a AMT, que pela lei é feita pelo Governo, mas tem de passar por audições no Parlamento. No entanto, a forma como foram fixados os prazos dos mandatos do atual conselho não facilita essa opção.

A atual administração do regulador dos transportes foi nomeado pelo Governo de Passos Coelho em julho de 2015, com uma nuance. Nenhum dos mandatos tem o mesmo prazo. A duração de cada mandato está separada por seis meses, o que impede que cessem de função todos ao mesmo tempo, para evitar falhas de quórum. Assim, o primeiro a terminar o mandato, no final do ano passado, foi o presidente João Carvalho – que permanece em funções com a autorização da tutela. Seis meses mais tarde, foi a vez do vice-presidente, Eduardo Lopes Rodrigues, a terminar o mandato, tendo sido também autorizado a ficar até ser substituído. Em julho, foi a vez de Ferreira de Lemos, que ficou dispensado de permanecer em funções.

Os dois membros ainda com mandato válido, Cristina Pinto Dias e Rita Sampaio Nunes, ainda têm pela frente mais seis meses e um ano, respetivamente, pelo que em tese não devem ser substituídas no curto prazo. Mas podem ficar numa recomposição global, até porque pelas regras aplicáveis às entidades reguladoras a próxima presidência da AMT terá de ser entregue a uma mulher.

António Ferreira Lemos é gestor público com uma longa carreira no setor empresarial do Estado, desempenhou várias funções nas administrações de empresas como os antigos CTT-TLP, a CP e mais recentemente foi vice-presidente da ANA — Aeroportos de Portugal e presidente da ANAM, nomeado pelo Governo PSD/CDD. Foi também deputado do CDS, vereador bem como membro da assembleia municipal de Lisboa. Fontes contactadas pelo Observador não fazem contudo uma leitura política da circunstância de ter sido o único vogal a não permanecer no cargo.

A AMT é a entidade que regula e fiscaliza o setor da mobilidade, o que inclui os transportes terrestres, fluviais, ferroviários, e respetivas infraestruturas, e bem como a atividade económica da operação portuária e dos transportes marítimos da atividade económica. A entidade tem poderes de regulamentação, supervisão, fiscalização e sancionatórios, bem como de proteção dos direitos dos consumidores e da defesa da concorrência. Entre as suas competências estão, por exemplo, a aprovação dos concursos públicos para serviços de transportes e o cumprimento das obrigações contratuais por parte dos operadores, bem como a regulação das atividades do setor do táxi e dos transporte individual descaracterizado por plataformas eletrónicas.