O momento da entrega do Orçamento do Estado para 2021 está à porta e o Governo vai deixando cair recados. Embora já tenha começado a aliviar alguma pressão na mola, a mensagem continua a ser de encostar os velhos parceiros da geringonça à parede: PCP e BE estão ou não estão dentro do barco? Do lado do Governo, o secretário de Estado que comanda a “geringonça” assegura que existe vontade política e que está a ser feito um “enorme esforço de convergência” na negociação do Orçamento do Estado e na discussão sobre o Plano de Recuperação. Do lado do PS, Ana Catarina Mendes pede definição: “Importa saber de que lado estão os parceiros à esquerda”. E diz que os tempos não estão “para brincadeiras”.

Foi essa a mensagem que passou o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, numa intervenção esta terça-feira no âmbito das jornadas parlamentares do PS, em Lisboa. “No dia 12 de outubro o Governo tem de entregar o Orçamento do Estado na Assembleia da República, e isso exige da esquerda um compromisso político numa altura particularmente difícil”, disse, mostrando total “disponibilidade” do governo para chegar a esse compromisso com os parceiros da esquerda, PCP, BE e PEV.

Até porque, disse, os portugueses “não compreenderiam” que os partidos se mostrassem incapazes de se entender numa altura de crise como esta. “Se antes foi preciso, agora é ainda mais necessário”, disse ainda, sublinhando que “os portugueses esperam que tenhamos essa capacidade de entendimento e que cada partido mostre que tem a disponibilidade de que o país precisa”.

Ou seja, o PS (e o Governo) já fizeram a sua parte, mostrando disponibilidade, falta os outros partidos mostrarem o mesmo. “Do nosso lado estamos disponíveis para dar passos em matérias tão relevantes como a preservação do emprego, dos rendimentos, o combate à precariedade, o investimento no SNS, a criação de prestações sociais que respondam a quem não tem apoio, o abono de família, o reforço das creches, ou o investimentos na ferrovia no âmbito do plano de recuperação”, afirmou, avisando BE e PCP que não podem faltar a esta chamada.

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E Duarte Cordeiro insistiu, sublinhando que o Governo está de boa vontade: “Do lado do governo existe essa vontade. Não podemos somar uma crise política a uma crise economia e social, por isso da parte do governo vai haver um enorme esforço de convergência com os partidos políticos com os quais até hoje foi possível governar”. Numa altura em que as negociações decorrem em pormenor com os partidos à esquerda (com o PCP mais hesitante mas disponível para negociar as propostas concretas), e numa altura em que ao Orçamento do Estado se juntou o Plano de Recuperação, resta saber se a vontade é recíproca e se vai ser possível continuar a governar.

Ana Catarina Mendes avisa BE e PCP que tempos “não estão para brincadeiras”

Foi essa definição que pediu a líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, no discurso de encerramento destas jornadas parlamentares. A lógica é a mesma: os tempos “não estão para brincadeiras” ou para “aventureirismos”, por isso o BE e o PCP têm de decidir de uma vez de que lado estão. “O Grupo Parlamentar do PS tem de perguntar qual é o posicionamento [destas forças políticas] num momento em que optamos por mudanças que vão alterar a vida das pessoas, num momento em que queremos continuar a valorizar os salários dos trabalhadores, com mais medidas de justiça social e mais proteção social e em que queremos dar mais um impulso ao investimento público”.

A pergunta ficou no ar: “Importa saber de que lado estarão os parceiros à esquerda. Esperemos que estejam com o caminho que trilhámos nos últimos cinco anos”.

Presidenciais? Nem vê-las. Secretário-geral adjunto defende “responsabilidade individual”

É o tema tabu dentro do PS e assim vai continuar — pelo menos até ao dia 24 de outubro, altura em que o partido reúne a Comissão Nacional para falar não só sobre as presidenciais de janeiro, como também sobre o Orçamento do Estado que por essa altura já estará em discussão na Assembleia da República. Daí que, nas jornadas parlamentares que decorreram esta terça-feira (jornada de um dia só, ao contrário do habitual) o tema tenha sido contornado sem grande alarido.

Ao que o Observador apurou, o tema que divide os socialistas foi falado apenas “de forma geral” por um dos deputados na parte da reunião destinada ao debate, à porta fechada, mas logo a seguir um outro deputado interveio para dizer que aquele não era o momento indicado para falar sobre presidenciais. António Costa, que estava na sala neste momento e que terá respondido “um a um” a cada deputado que se inscreveu para falar, não comentou o assunto.

Certo é que, com a ex-eurodeputada socialista Ana Gomes na corrida e numa altura em que até uma deputada socialista, Isabel Moreira, já disse que iria votar no candidato do PCP, e sabendo que António Costa estendeu o tapete da recandidatura a Marcelo, o tema promete aquecer quando for discutido a fundo. O congresso socialista, que devia ter sido em maio, e que foi empurrado para o ano que vem, poderia ser o palco para essa discussão, mas vai realizar-se depois das presidenciais, esvaziando em parte o assunto. Será apenas a comissão nacional, marcada para 24 de outubro, o local para esse efeito.

Foi isso que disse José Luís Carneiro, secretário-geral adjunto dos socialistas, durante a “jornada” parlamentar do PS esta terça-feira, afirmando que as eleições presidenciais eram “um momento muito relevante”, ao contrário do que tinha feito António Costa na rentrée socialista em Coimbra quando desvalorizou aquele ato eleitoral na perspetiva do PS. Mas para Carneiro, de resto, as presidenciais são acima de tudo uma questão de “responsabilidade individual”. Não referiu nomes, nem de Ana Gomes, nem de Marcelo Rebelo e Sousa, nem sequer referiu a necessidade ou não de o PS ter um candidato próprio. Antes pelo contrário.

“Trata-se de um ato de cidadania, especialmente comprometido com a República e de responsabilidade individual. A Comissão Nacional do PS, como fez em outros momentos da nossa história, irá discutir, avaliar e decidir em liberdade e em consciência”, limitou-se a dizer.