Uma empresa de biotecnologia com sede no Parque Tecnológico de Cantanhede desenvolveu uma possível vacina contra a Covid-19 que se toma pelo nariz. Além disso, também desenvolvou um medicamento que pode ser aplicada em pessoas infetadas pelo novo coronavírus para evitar complicações provocadas por bactérias oportunistas.

Pedro Madureira, responsável científico da Immunethep, revelou ao Observador que a empresa já começou a produzir a vacina, que vai ser usada em testes laboratoriais em ratinhos em outubro; e deve avançar para os ensaios em humanos dentro de seis meses. Bruno Santos, o diretor executivo, espera os primeiros resultados dentro de dois a três meses.

A empresa, que iniciou atividade em 2014, é uma spinoff da Universidade do Porto e serve-se da investigação em imunologia desenvolvida no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) nos últimos 30 anos. Face à pandemia de Covid-19, criou duas soluções: uma vacina intra-nasal que protege os pulmões de uma infeção pelo novo coronavírus; e um medicamento que protege os doentes de sofrer outras infeções por bactérias que se aproveitam da fragilidade do organismo para atacar.

A vacina portuguesa é composta pelo SARS-CoV-2 inativado por um químico chamado beta-propiolactona, que transforma o vírus numa espécie de estátua: a estrutura mantém-se, mas já não causa qualquer infeção. “O nosso sistema imune reconhece-o, provoca uma resposta contra ele, mas não provoca doença. Mais tarde, se a pessoa for exposta ao vírus, o sistema imune já tem anticorpos contra ele”, indica Pedro Madureira.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A vantagem de utilizar a totalidade do vírus (não apenas uma parte, como é a estratégia da Modena, por exemplo) é que, se o SARS-CoV-2 sofrer uma mutação, o corpo continuará a reconhecê-lo. Utilizando apenas uma parte do vírus, se essa porção sofrer uma mutação, o organismo poderá já não ser capaz de o identificar — logo, se a pessoa vacina vier a contactar com o vírus, poderá ficar doente à mesma.

Há outras vacinas já em desenvolvimento que também usam a totalidade do vírus na sua composição. Mas é a segunda parte da solução da Immunethep, baseada nos desenvolvimentos a que a empresa se tem dedicado desde há seis anos, que a torna diferente das restantes: um medicamento com capacidade de proteger o corpo de ataques de bactérias oportunistas.

Há bactérias que libertam uma proteína que impede o sistema imunitário humano de reagir a um ataque. “Diferentes microorganismos, aqueles que têm resistência a antibióticos, usam este mecanismo para escapar ao sistema imune”, descreve Pedro Madureira. “Estas proteínas enviam um sinal que diz ao corpo que está tudo bem, ele não reage e a bactéria ganha oportunidade para se proliferar”.

Até agora, a Immunethep tem-se dedicado a criar uma vacina que neutraliza esta proteína para restabelecer a capacidade do sistema imune para responder à infeção. “Quando as pessoas estão a infetar, não temos tempo de a vacinar. O sistema imune demora algum tempo a responder à vacina e à infeção. Por isso, desenvolvemos uma terapia para quem já está infetado à base de anticorpos que neutralizam a proteína e deixam o sistema imune atuar”, explica o responsável científico da empresa.

Esta ferramenta começa a atuar imediatamente e confere uma proteção de até dois meses contra a molécula em causa. E pode ser usada no tratamento da Covid-19 a partir de outro medicamento da mesma empresa. É que, de acordo com Pedro Madureira, “cerca de 50% dos casos fatais, e esta percentagem pode ser maior, acontecem porque as pessoas com Covid-19 ficam extremamente suscetíveis a infeções bacterianas oportunistas”. Ou seja, mais de metade dos casos de morte “ocorrem por causa dessas infeções bacterianas”: “Pensámos que, para as pessoas que já têm a doença, podíamos usar estes anticorpos”.

Se a vacina da Immunethep for segura e eficaz, a produção será feita com uma empresa no Canadá com a qual a biotecnológica portuguesa já trabalha para a outra vacina na área bacteriana. “Neste momento, temos uma formulação definida e estamos prontos a testá-la no modelo animal”, precisou Bruno Santos à Agência Lusa.