O Bloco de Esquerda está exatamente no mesmo ponto em que estava quando, a 28 de outubro, o partido de Catarina Martins fez o que nunca antes tinha feito e votou contra o Orçamento do Estado do governo de António Costa na generalidade. Daqui até à votação final, a 26 de novembro, ainda há um longo caminho mas com pouca margem para o percorrer. São 12 as propostas de alteração que o Bloco de Esquerda vai apresentar para a discussão na especialidade — nem mais nem menos (no OE anterior tinham sido mais de 200) –, sendo que são “um ponto de chegada e não um ponto de partida”. Ou seja, ou o Governo “repensa” e muda de posição sobre elas, ou o BE mantém o voto contra.

“Estas são as propostas que achamos essenciais para responder à crise, por isso gostaríamos que o Governo alterasse a sua posição sobre elas, até porque não conhecemos as razões que levaram o Governo a recusá-las. São 12 propostas sensatas, sobre áreas essenciais, e o Governo deve uma explicação ao país sobre porque é que as recusa”, disse a deputada bloquista Mariana Mortágua esta quarta-feira em conferência de imprensa no Parlamento, deixando claro que só se “estas propostas estiverem acolhidas é que há margem para viabilizar o Orçamento“.

OE2021. BE apresenta apenas propostas de alteração essenciais e já debatidas com Governo

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Trata-se das propostas que ficaram no papel desde a última reunião que o BE e o Governo tiveram depois de um “longo” e “intenso” processo negocial. Nem mais nem menos. Mariana Mortágua insiste que são as mesmas que estavam no papel desde o verão, altura em que começaram as negociações, tendo algumas ficado pelo caminho, outras sido alteradas e uma ou outra (parcialmente) acolhidas. “Estas propostas incorporam tentativas de aproximação às posições que o PS manifestou desde o debate na generalidade e são apenas estas porque não quisemos criar qualquer dificuldade, qualquer distração, quaisquer novas exigências no processo de especialidade”, disse Mariana Mortágua, sublinhando que “são estas as propostas que permitem ao BE viabilizar o Orçamento do Estado para 2021”.

E são um “ponto de chegada” não “um ponto de partida”, foi repetindo insistentemente Mariana Mortágua, deixando claro que a margem negocial é curta. Quanto a isso, de resto, a deputada bloquista assegura que não houve nenhuma reunião com o Governo desde o debate do OE na generalidade, nem está marcado nenhum encontro.

BE cede (um bocadinho) na indemnização por despedimento

A única cedência feita pelos bloquistas de lá para cá diz respeito à proposta sobre a compensação por despedimento ou por cessação do contrato de trabalho: a proposta do BE sempre foi no sentido de regressar ao modelo antes da troika (30 dias por cada ano de trabalho), mas agora os bloquistas apresentam-se com uma proposta no sentido de a indemnização ser de 20 dias por cada ano de trabalho em caso de despedimento, em vez dos atuais 12.

Era essa a posição do PS em 2012, altura em que foram feitas as alterações laborais para lá da troika, e é por isso que o Bloco de Esquerda insiste: “Vinte dias por cada ano de trabalho é exatamente a mesma proposta que o PS defendeu no passado”, afirmou a deputada Mariana Mortágua, que insiste também no fim da caducidade unilateral da contratação coletiva (suspensão não chega), na reposição do princípio do tratamento mais favorável, no fim do alargamento do período experimental e na proibição dos despedimentos para todas as empresas que recebam apoios do Estado, incluindo apoios tipo lay-off.

Além disto, o BE insiste também na atribuição de contratos laborais aos trabalhadores das plataformas tipo Uber, que estão desprotegidos e que asseguram o acesso às refeições de todos os cidadãos que estão em casa por força do confinamento parcial.

Isto no plano laboral. Depois, na área da saúde, o BE insiste na autonomia das instituições do SNS para contratarem; na criação de uma carreira para os técnicos auxiliares de saúde e na instituição do regime de exclusividade para os médicos — a chamada “dedicação plena” — com melhores condições de acesso à profissão para segurar técnicos no SNS.

Ficam a faltar os apoios sociais e o Novo Banco. O Bloco de Esquerda insiste em retomar as regras pré-troika no acesso ao subsídio de desemprego e ao subsídio social de desemprego e, quanto à nova prestação social, insiste numa outra fórmula de cálculo da condição de recursos “para não deixar ninguém de fora”. “É preciso que tenham impacto real na vida das pessoas”, diz Mariana Mortágua.

Quanto ao Novo Banco, o BE já deixou cair a ideia de a capitalização ser feita diretamente pelos bancos e não pelo Fundo de Resolução, mas mantém que tem de haver uma auditoria à gestão do Novo Banco antes de ser feita qualquer nova transferência ao Fundo de Resolução, o que não está acautelado no atual Orçamento do Estado.

São estas as exigências que o BE diz serem “sensatas” e sempre as mesmas desde o início da discussão. “O Governo até agora recusou-as e não deu nenhuma justificação para a recusa”, atirou várias vezes a deputada bloquista na conferência de imprensa pondo o ónus no Governo. Esta é, nas palavras de Mariana Mortágua, a “estrutura mínima que o BE entende que tem de estar incluída no OE”. Portanto, ou é assim, ou não é nada. O BE mantém a porta aberta, mas com o voto contra na mão.