A presença confirmada em Portugal da nova estirpe do coronavírus que provoca a Covid-19 é recente e, embora seja mais contagiosa, não deverá implicar novas medidas e restrições, defendeu este domingo um investigador do Instituto Nacional de Saúde dr. Ricardo Jorge (INSA), e coordenador do estudo sobre diversidade genética do novo coronavírus SARS-CoV-2 em Portugal, João Paulo Gomes.

A nova variante do vírus SARS-CoV-2, conhecida por variante inglesa por ter sido detetada pela primeira vez no Reino Unido, foi detetada pela primeira vez no Continente, confirmou ao Observador fonte oficial do Instituto Nacional Ricardo Jorge depois da RTP ter avançado em primeira mão a informação de que foram identificados 16 casos em Portugal continental (fora os 18 já identificados a 28 de dezembro na Madeira).

Esta variante do vírus SARS-CoV-2 é significativamente mais contagiosa e tem sido apontada com a principal causa de um agravamento da situação epidemiológica de Londres e do sudoeste do Reino Unido, segundo afirmou o primeiro-ministro Boris Johnson em entrevista à BBC.

Para o investigador  João Paulo Gomes, esta nova estirpe, conhecida como a estirpe do Reino Unido, “já está em Portugal”. “Não sabemos há quanto tempo, porque a maior parte dos casos que estamos a identificar agora são casos do mês de dezembro. Mas, há cerca de seis semanas, em colaboração com o Instituto Gulbenkian Ciência, fizemos uma espécie de rastreio” e “não encontrámos uma única amostra”, explicou o investigador, admitindo, no entanto, que podem já existir cadeias de transmissão associadas a esta nova variante.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A nova variante, mais contagiosa, foi sinalizada no âmbito da atualização do “Estudo da diversidade genética do novo coronavírus SARS-CoV-2 (covid-19) em Portugal”, desenvolvido e coordenado pelo Instituto Ricardo Jorge, em colaboração com o Instituto Gulbenkian de Ciência.

“Nós queríamos primeiro perceber se a estávamos a detetar [a nova estirpe] e agora já percebemos que estamos, não só em sede de chegada de passageiros ao aeroporto de Lisboa como também em produtos que vêm de outros laboratórios e via ARS [Autoridade Regional de Saúde] suspeitos por terem historial de viagem”, explicou o investigador.

No entanto, o rastreio realizado a meio de novembro passado, “com uma ótima representatividade geográfica”, mostra que “a circulação começou há pouco tempo em Portugal”, garantiu.

O facto de ser mais contagiosa não leva João Paulo Gomes a defender mais restrições ou medidas de confinamento. “Julgo que não há medidas adicionais a serem tomadas. Há, acima de tudo, uma necessidade de cumprimento das medidas existentes”, defendeu, referindo que “esta variante não consegue ultrapassar as barreiras das máscaras mais facilmente que as outras variantes”.

Portanto, considerou, “se as pessoas mantiverem o distanciamento social e cumprirem as regras, usando máscara quando estão na presença de outras pessoas, estão relativamente salvaguardadas”.

O problema, sublinhou o investigador, é que “quando não estamos protegidos — por exemplo num restaurante ou quando estamos com a família em casa ou quando estamos com alguns amigos e baixamos um bocadinho a fasquia”. “Nessas alturas, esta variante terá certamente, uma maior capacidade de se transmitir”, alertou.

A possibilidade de o número de infeções crescer muito nos próximos tempos é real, admitiu João Paulo Gomes, advertindo, no entanto, que estão várias situações a acontecer ao mesmo tempo.

“Vamos, com certeza, encontrar muitos mais casos nas próximas semanas. Até porque, os passageiros que chegam ao aeroporto com testes negativos não quer dizer que sejam negativos. Basta que tenham contraído a infeção um ou dois dias antes. Passados dois ou três dias começam com sintomatologia ou já passaram a alguém e não há nada a fazer quanto a isso”, explicou.

Além disso, Portugal está também a viver um período de algum ‘desconfinamento’, por ocasião do Natal de Ano Novo, “e isso está a implicar um aumento do número de casos também”, lembrou o investigador do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge.

Por isso, defendeu, “não temos qualquer evidência de que a presença da variante esteja a aumentar o número de casos”.

Para conhecer melhor “o peso desta variante do vírus no panorama nacional”, o Instituto Ricardo Jorge e o Instituto Gulbenkian Ciência vão fazer, nas próximas semanas e meses, “rastreios periódicos com base nesta sequenciação do genoma do vírus com uma elevada representatividade geográfica”, explicou João Paulo Gomes.

O investigador também não se mostra preocupado com a possível influência da nova estirpe na eficácia da campanha de vacinação que está a arrancar.

“Penso que a vacina garantidamente não está em perigo com o aparecimento desta ou doutras variantes”, considerou o cientista, explicando que “a resposta imunitária criada por uma vacina é muito complexa e muito completa. Envolve a geração de anticorpos contra muitos locais deste vírus, não apenas um ou outro onde esta mutação possa aparecer, mas também outro tipo de resposta imunitária que não tem a ver com anticorpos”.

Embora o aparecimento de uma nova estirpe de um coronavírus que provocou uma pandemia seja “sempre um motivo de preocupação”, as vacinas “foram muitíssimo bem desenvolvidas e não vão estar em perigo por este tipo de variantes que tem aparecido”, concluiu.