O Banco Montepio obteve a autorização da tutela para poder despedir 400 trabalhadores até setembro de 2023, no âmbito do estatuto de empresa em reestruturação, divulgou esta terça-feira fonte oficial do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
O estatuto de empresa em reestruturação foi atribuído à Caixa Económica — Montepio Geral no período até setembro de 2023 e até ao limite de 400 trabalhadores, após análise por parte do Instituto da Segurança Social e do IAPMEI e após consulta aos parceiros sociais e à Associação Portuguesa de Bancos”, de acordo com uma resposta do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social enviada inicialmente ao jornal Eco e confirmada pela Lusa.
Já era conhecido que o Montepio iria avançar com um “plano alargado” de saída de trabalhadores, segundo o Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários, o Sindicato dos Bancários do Norte e o Sindicato Independente da Banca, que reuniram em 23 de setembro com a administração executiva.
Em comunicado, os três sindicatos revelaram, nesse dia, que se reuniram com o presidente da comissão executiva do Banco Montepio, Pedro Leitão, o qual “apresentou um projeto de reestruturação que contempla um plano alargado de reformas antecipadas e de rescisões de contratos de trabalho por mútuo acordo que irá decorrer até 2021″, mas sem quantificar quantos funcionários irão sair da entidade bancária.
Contactada pela Lusa no dia 23, fonte oficial do Montepio disse apenas que é conhecido que o banco “está a ajustar processos e a estudar a sua dimensão, tal como foi partilhado com os colaboradores e as respetivas estruturas”, e que manterá a prática de partilhar “sempre a informação de relevo da instituição com todos os que dela fazem parte” antes da divulgação pública.
Os bancos portugueses estão a preparar uma nova redução das estruturas, desde logo com saída de trabalhadores, usando o corte de custos como medida para fazer face à atual crise, à fraca rentabilidade e à digitalização das operações.
Ex-administradores pedem absolvição e que Tribunal pondere destino do “último grande banco português”
O mandatário dos ex-administradores do Montepio condenados a coimas de 2,8 milhões de euros pediu a absolvição e que o Tribunal pondere o efeito da sua decisão sobre “o último grande banco português que resiste à invasão estrangeira”.
Nas alegações finais do julgamento iniciado no final de outubro de 2020 no Tribunal da Concorrência Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, durante cerca de cinco horas, Alexandre Mota Pinto procurou desmontar todos os pontos das decisões do Banco de Portugal (BdP) na origem dos pedidos de impugnação das coimas aplicadas, em dois processos apensos, um de fevereiro de 2019 e outro de fevereiro de 2020, à Caixa Económica Montepio Geral (CEMG), ao seu ex-presidente António Tomás Correia e a ex-administradores.
Mota Pinto pediu à juíza Mariana Machado para, no momento da decisão, “ver a floresta e não a árvore”, olhando ao contexto em que surgiram estes processos, traçado no depoimento prestado por Tomás Correia, em que num “diagnóstico notável” da situação da banca nacional, deixou clara a “prevalência de interesses estrangeiros” e da “influência de abutres” em tudo o que se passou na crise iniciada em 2007-2008.
Sublinhando que a CEMG “é o último grande banco português que resiste à invasão estrangeira”, o advogado questionou se não será vontade do Banco Central Europeu que assim não seja.
“Vai o Tribunal participar nisso?”, questionou, alertando para os efeitos de uma condenação de milhões de euros, tanto em mais uma eventual “corrida aos depósitos”, dando de “mão beijada” o banco a “interesses estrangeiros”, como por passar a ideia de que, também no Montepio, houve “um bando de malfeitores bancários”, alimentando os discursos que levam o povo a fazer “escolhas arriscadas” para a democracia.
Muito crítico de toda a atuação do BdP, que fez sempre questão de denominar como “Entidade Administrativa”, Alexandre Mota Pinto afirmou que o supervisor nunca alertou o banco para as eventuais ilegalidades com que construiu os processos, sublinhando que houve sempre um esforço para corrigir as desconformidades que iam sendo apontadas, com referência de “aspetos a melhorar”.
Mota Pinto realçou o percurso e o perfil “inatacável” das pessoas visadas no processo, reafirmando a convicção declarada por Tomás Correia no seu depoimento de que o processo surgiu porque este “ousou defrontar a estratégia” do BdP para separar a Caixa Económica da Associação Mutualista, pondo em causa a génese do banco, criado para servir os fins sociais da associação.
Citando um dos depoimentos, afirmou que o supervisor “lançou o míssil balístico” a Tomás Correia e os outros “foram apanhados pelos estilhaços”.
O mandatário, que representa os recorrentes Tomás Correia, Almeida Serra, Álvaro Dâmaso, Eduardo Farinha, Jorge Barros Luís, Fernando Magalhães e Pedro Ribeiro (as infrações imputadas a Rui Amaral foram consideradas prescritas no início do julgamento), insistiu, nomeadamente, na utilização “abusiva” da infração permanente.
No seu entendimento, as infrações imputadas a Almeida Serra, Álvaro Dâmaso e Eduardo Farinha prescreveram em 17 de setembro de 2020, já que, ao ser classificado de “urgente”, o processo não beneficia das “suspensões covidianas”.
Mota Pinto insistiu ainda na questão da violação do direito de defesa, que esteve na origem de uma primeira sentença do TCRS, de setembro de 2019, que anulou a decisão administrativa e que o advogado considera ter transitado em julgado, questão alvo de recurso.
Salientando que tomou conta de um processo com 303 dossiers sem qualquer índice remissivo (só elaborado depois da sentença de setembro de 2019) e com “milhares de ficheiros” sem saber “para que servem”, o advogado apontou ainda questões como a existência de imputações sem indicação da norma concreta alegadamente violada.
O julgamento no TCRS incide sobre os pedidos de impugnação da decisão do BdP de fevereiro de 2019, sobre alegadas violações das regras de controlo interno e incumprimento nos deveres de implementação de controlo interno, referentes à concessão de crédito por parte da Caixa Económica Montepio Geral (CEMG), entidade a que foi aplicada uma coima de 2,5 milhões de euros, sendo Tomás Correia condenado ao pagamento de 1,25 milhões de euros, Almeida Serra a 400.000 euros, Eduardo Farinha 300.000, Álvaro Dâmaso 140.000, Barros Luís 75.000, Fernando Magalhães 32.000 e Pedro Ribeiro 17.500.
Para estes dois, o Ministério Público pediu, na segunda-feira, nas suas alegações, que seja aplicada apenas uma “admoestação”, defendendo Mota Pinto que não devem sofrer qualquer condenação.
A este processo foi apenso o que resultou da decisão do BdP de fevereiro de 2020, por alegadas irregularidades nos mecanismos de prevenção de branqueamento de capitais ocorridas em 2015, que originaram uma coima de 400.000 euros ao Banco Montepio e de 150.000 euros a Tomás Correia e, de igual valor, ao ex-administrador que também teve responsabilidades na área do ‘compliance’, José Almeida Serra, das quais também recorreram.
Alexandre Mota Pinto considerou que, neste caso, a juíza Mariana Machado “não vai aplicar o direito, vai fazer história”, salientando que não é possível punir comportamentos que são anteriores às normas que os penalizam (datadas de 2013).
Neste caso, a procuradora do Ministério Público, Edite Carvalho, defendeu a “absolvição total” de Tomás Correia e “uma mera admoestação” a Almeida Serra, tendo Mota Pinto salientado que o único erro deste foi não ter demitido o diretor de prevenção de branqueamento Rui Quental, que havia transitado do Finibanco, já que são vários os documentos que provam os seus esforços para o “cumprimento estrito da lei” e as garantias daquele de que estavam a ser feitas diligências nesse sentido.
Nas suas alegações, a procuradora considerou, em relação ao primeiro processo, provado que da ação dos administradores poderá ter resultado “dolo eventual”, mas pediu a “absolvição parcial” de todos os arguidos, uma “redução das coimas” aplicadas a cada um e a “suspensão da execução de metade das coimas” que vierem a ser decididas pelo tribunal.
O mandatário do BdP, Henrique Salinas, alegou que o tribunal “deverá manter a condenação” de todos os arguidos, que contribuíram “causal e dolosamente” nos processos de concessão de crédito, “sabendo que os mecanismos de monitorização de risco não foram suficientes nem eficazes”, bem como quanto aos mecanismos de prevenção de branqueamento de capitais.
Já o mandatário do Montepio, Nuno Casanova, que também proferiu alegações na segunda-feira, apontou “erros graves” ao processo, considerando que a condenação assenta numa visão redutora da análise de risco.
A leitura da sentença ficou marcada para o próximo dia 5 de fevereiro, admitindo Mariana Machado poder ter de alterar a data, dada a complexidade do processo e o facto de não lhe ter sido concedida exclusividade, tendo marcado para quinta-feira o início do julgamento das impugnações da auditora KPMG às coimas aplicadas pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.