A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) alertou esta terça-feira, no seu relatório sobre perspetivas de riscos em 2021, para a possibilidade de um “choque de insolvência” caso a recuperação económica seja lenta.

“O risco de um choque de insolvência aumentará de modo relevante se existir uma recuperação lenta, a retirada de algumas das medidas tomadas para lidar com os riscos de liquidez e o fim da moratória sobre o reembolso das dívidas sociais e fiscais”, pode ler-se no capítulo dedicado aos riscos de crédito das empresas do relatório divulgado.

Assim, defende o regulador do mercado que ganham “criticidade os apoios à economia real e à recapitalização de empresas em 2021, que possam permitir transições tão suaves quanto possível para o fim de moratórias”.

A preocupação é ainda maior em Portugal por ser, entre os países europeus, uma das economias que mais recorreu a moratórias e adiamentos de despesa (tanto em volume, como em duração)”, salienta ainda a entidade presidida por Gabriela Figueiredo Dias.

A CMVM refere também que o caráter “transitório e de curto prazo” das garantias públicas, linhas de crédito e transferências diretas, com maturidades inferiores a um ano, “poderão elevar o risco de refinanciamento de algumas empresas num futuro próximo, em particular quando esses auxílios já não estiverem em vigor”.

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O regulador do mercado admite que “será de esperar um agravamento das condições de crédito quando e se os apoios governamentais se reduzirem ou terminarem”, apesar do crédito bancário ter aumentado durante a pandemia e as taxas de juro não terem subido.

“O término ou a suspensão de garantias estatais poderão conduzir a condições de crédito mais apertadas para as empresas não financeiras, sobretudo pequenas e médias empresas (PME)”, alerta a CMVM, referindo que 14% dos empréstimos a empresas desse segmento na zona euro estavam abrangidas por apoios estatais.

Em qualquer caso, “é de antecipar um aumento do número de insolvências em 2021, mesmo que a retoma económica se concretize”, prevê a CMVM.

A entidade presidida por Gabriela Figueiredo Dias assinala que as empresas portuguesas “registaram dificuldades de tesouraria no início da crise pandémica”, dado que há mais PME face aos pares europeus, uma “reduzida diversificação das receitas” e opções de financiamento “limitadas”.

“A intervenção atempada dos decisores de política económica através de garantias, linhas de crédito e moratórias permitiu aliviar as necessidades de tesouraria e de refinanciamento da generalidade das empresas”, refere a CMVM no relatório.

No entanto, o regulador alerta que “as vulnerabilidades das empresas não financeiras foram ultrapassadas com recurso a maior endividamento, o que condicionará a sua capacidade de endividamento e de investimento num futuro próximo”.

“Num cenário adverso em que a evolução pandémica dificulte a retoma da atividade económica, a diminuição da capacidade de servir uma dívida mais avultada poderá ditar um maior número de falências a médio prazo”, completa o regulador do mercado.

Nesse caso, as insolvências de PME “podem ter consequências relevantes para a macroeconomia (já que concentram metade do produto e 2/3 do emprego na Europa), e para o setor bancário do qual a generalidade daquelas empresas depende para obter financiamento externo”.

“A materialização dos cenários mais pessimistas poderá conduzir a fortes perdas e a volumes de resgates substanciais. Daí a importância da constituição de almofadas financeiras e de linhas de crédito para absorver eventuais volumes anormais de resgates”, de acordo com a entidade.

A CMVM considera que o risco de crédito é um dos “três riscos fundamentais” em 2021, a par do risco de mercado e riscos ambientais e sociais, segundo disse à imprensa a presidente Gabriela Figueiredo Dias na sexta-feira.