O Ministério Público (MP) deduziu acusação contra o vice-presidente da Naval 1893 Marco Figueiredo, por furto no estádio municipal da Figueira da Foz, no início de 2019, revela um despacho a que a agência Lusa teve acesso.

Segundo os termos da acusação, Marco Figueiredo, dirigente do clube que sucedeu à Naval 1.º de Maio, é suspeito de um crime de furto “em autoria mediata” (alguém que executa o facto por intermédio de outrem), na forma consumada, punível com pena de prisão até três anos ou pena de multa.

A acusação deduzida pela 2.ª secção da Figueira da Foz do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) lembra que o complexo desportivo municipal esteve cedido à Naval 1.º de Maio durante cerca de 20 anos e, posteriormente, à Naval SAD.

Em 01 de março de 2018, a Câmara Municipal tomou posse administrativa das instalações e em 13 de abril do mesmo ano “foi realizado um contrato de cedência” por parte da autarquia “à Associação Naval 1893 de utilização de uma casa e antigo edifício de balneários que se encontram junto ao estádio”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

No início de março de 2019, dois homens foram identificados pela PSP da Figueira da Foz no interior das instalações do estádio municipal – infraestrutura desportiva que está atualmente em processo de requalificação, mas que, na altura, estava encerrada e deteriorada – quando alegadamente procediam ao furto de material metálico e sucata, dali retirado e colocado num furgão.

Segundo o MP, dias antes, em 18 de fevereiro de 2019, Marco Figueiredo contactou, via telemóvel, um sucateiro, Joaquim Santos, que “habitualmente faz levantamento de materiais para reciclagem gratuitamente”, tendo-lhe proposto “efetuar a recolha de sucatas existentes no estádio municipal José Bento Pessoa”.

“O Joaquim Santos sabia que o arguido fazia parte da direção da Associação Naval 1893, daí ter confiado na palavra deste e não suspeitar de qualquer irregularidade da situação”, assinala o Ministério Público.

Em data não indicada do mesmo mês, Marco Figueiredo e Joaquim Santos (este último acompanhado por outros dois homens) encontraram-se nas instalações do estádio. “Entraram por um portão lateral que se encontrava apenas encostado e, já no interior do estádio, o arguido indicou o material a retirar”, continua o MP, aludindo, entre outros, a quatro alpendres em chapa, vários torniquetes sem estarem equipados com respetivos motores e equipamentos eletrónicos, duas balizas oficiais para futebol de 11 em ferro, um túnel em fole, destruído, de acesso aos balneários ou dois bancos de suplentes, igualmente destruídos.

O despacho de acusação frisa, igualmente, que o acordo “não incluía a atribuição de qualquer quantia monetária ao arguido, sendo todo o dinheiro obtido com a venda dos materiais dali retirados para o Joaquim Santos”.

Dois dias depois da primeira deslocação ao estádio, o sucateiro voltou ao Bento Pessoa, tendo retirado e carregado para um camião-grua de uma empresa de Vila Nova de Poiares uma parte do material descrito, “que levou e fez seu”, e que, posteriormente, vendeu à referida empresa “por 470 euros”.

Ainda em fevereiro de 2019, Marco Figueiredo voltou a contactar Joaquim Santos, desta vez para carregar, da casa no topo norte do estádio [a sede da Naval 1893], dois equipamentos de halteres, que este retirou e posteriormente vendeu “pelo menos por 60 euros”, diz o MP.

Já em 02 de março de 2019, o sucateiro voltou ao estádio para retirar o restante material, altura em que foi interpelado por um funcionário municipal e, depois, identificado pela PSP.

Perante o funcionário camarário, o sucateiro respondeu que “tinha ordens” de Marco Figueiredo para retirar o material em causa. Na ocasião, telefonou ao arguido “a dar-lhe conhecimento do que se estava a passar, tendo aquele argumentado que não sabia de nada”.

De acordo com o MP, Joaquim Santos repetiu a argumentação à PSP, explicando “o motivo de ali andar” e “quem lhe ordenou que carregasse o material”, o qual, nesse dia, acabou apreendido pela autoridade policial.

O Ministério Público considera que Joaquim Santos “apenas levou os bens por acreditar que o arguido era legal representante da Naval e pensar que este podia dispor daqueles bens” e que o sucateiro “terá atuado em erro, por agir na convicção de ser legítima a sua atuação”.

Segundo o MP, como o erro, de acordo com o Código Penal, afasta o dolo, restando apenas a punição por negligência nos termos gerais, mas o crime de furto “apenas é punível a título de dolo”, a investigação concluiu pelo arquivamento dos autos relativos a Joaquim Santos “por falta de indícios do crime de furto”.

Quanto a Marco Figueiredo, o MP sustenta que “todos os bens descritos eram pertença da Câmara Municipal, como o arguido bem sabia”.

O arguido sabia que não podia dispor dos objetos supramencionados, por os mesmos não lhe pertencerem, nem pertencerem a instituição por si representada, e que ao determinar Joaquim Santos a apoderar-se deles (…) agia contra a vontade da sua legítima dona”, sublinha.

Ouvido pela Lusa, Carlos Tenreiro, advogado de Marco Figueiredo, recusou prestar declarações sobre o caso, alegando que os advogados “não devem falar sobre os processos, já deontologicamente é reprovável”.

Disse apenas que “é uma acusação, à qual continua a presidir o princípio da presunção de inocência” e que ainda não decidiu se vai pedir a abertura da instrução.

Também o presidente da Câmara da Figueira da Foz notou que “até prova em contrário [Marco Figueiredo] é inocente”.

“Agora, quem quer que tenha sido que fez o assalto, espero que seja punido, porque assaltar um equipamento desportivo que serve tantos jovens, na verdade é inadmissível. Qualquer pessoa que provoca dano ao espaço público, a edifícios públicos, tem de ser punida exemplarmente”, frisou Carlos Monteiro.