Tiago Preguiça fez carreira no Governo, tem 34 anos, e chega agora a diretor-geral da Segurança Social, mesmo que a sua formação seja em Estudos Europeus e Relações Internacionais. E, para já, sem ser submetido a concurso, uma vez que foi nomeado em regime de substituição. O despacho da nomeação foi publicado esta segunda-feira em Diário da República e produz efeitos desde o dia 12 do presente mês. No primeiro Governo de Costa, Tiago Preguiça foi assessor e chefe de gabinete precisamente na tutela da Segurança Social, mas no segundo mandato foi levado para o gabinete de António Costa para se ocupar destas áreas. A ida para S.Bento foi assim uma espécie de promoção e é de lá que salta para uma nova promoção: um cargo no topo da Segurança Social.
Tiago Preguiça tornou-se nos últimos anos um homem de confiança dentro do Governo, primeiro de Vieira da Silva e depois de António Costa. De gabinete em gabinete, sempre tendo em mãos dossiers do setor da Segurança Social. Agora, e um ano depois de José Cid Proença (que estava no cargo desde 2006) ter deixado o lugar de diretor-geral da Segurança Social vazio — devido a aposentação —, Tiago Preguiça foi nomeado em regime de substituição e passará mais tarde pelo crivo da CReSAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública), num concurso público. Nessa altura irá beneficiar da vantagem pela experiência que vai adquirir durante este tempo em que estiver à frente da instituição e que começou a contar no dia 12 de Abril.
A licenciatura em Estudos Europeus pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e a pós-graduação em Ciência Política e Relações Internacionais na Universidade Católica Portuguesa não o habilitam diretamente para a gestão de uma área como a Segurança Social, tendo assim apenas a experiência que acumulou na área em cargos de nomeação governamental — onde numa fase inicial terá pesado ser da JS e do PS.
Apesar deste histórico, o ministério que tutela a Segurança Social assegura, numa nota enviada ao Observador, que Tiago Preguiça tem “as habilitações, competência técnica, aptidão, experiência e perfil adequados ao exercício destas funções”, mas também “a negociação técnica e a coordenação da aplicação dos instrumentos internacionais nesta área”. Entre as principais funções está uma das prioridades do Governo: “A modernização do sistema da Segurança Social e a adequação às novas formas de trabalho”.
Sobre o facto de ter sido nomeado sem concurso, o ministério limita-se a dizer ao Observador que “a nomeação é efetuada em regime de substituição, como previsto na lei para as situações em que existe vacatura do lugar, cabendo à CReSAP conduzir o processo de concurso”. Esse pedido, diz a tutela na mesma nota, “será feito pelo Governo nas próximas semanas”, lembrando que “a legislação confere um prazo de 90 dias, ou seja, até julho”. O lugar já estava vago, no entanto, desde abril de 2020 e só agora foi nomeado Tiago Preguiça.
A formação inicial “não define experiência que se adquire ao longo da vida”
Catarina Duarte, atual assessora do Ministério das Finanças, trabalhou quatro anos com Tiago Preguiça no Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, e não tem dúvidas de que se trata de uma escolha acertada para o cargo da direção-geral da Segurança Social. “O Tiago trabalhou muito de perto com todos os serviços do Ministério, nomeadamente com a Direção-Geral da Segurança Social, até em dossiês muito pesados, e tem um grande conhecimento dos serviços, do papel e da importância dos mesmos e acho que estará muito à vontade para o papel que tem agora a desempenhar”, explica a assessora ao Observador, que elogia ainda a “visão de conjunto e alargada” de todos os organismos da Segurança Social.
Na visão de Catarina Duarte, a formação inicial (em estudos euroepus) “não define competências e a experiência que se adquire ao longo da vida” e, apesar de ir gerir uma equipa de juristas, “não quer dizer que um bom jurista faça um bom dirigente”. “O conhecimento que teve nos últimos anos na área da Segurança Social é uma prova dada e competências adquiridas”, refere, colocando de parte a ideia de handicap pela formação académica.
“Não podemos passar a vida a reclamar um rejuvenescimento de quadros na administração pública e depois achar que uma pessoas só porque é nova não tem essa competência”, aponta assessora. Catarina Duarte elogia a “grande capacidade de trabalho” de Tiago Preguiça e a “responsabilidade profissional”, mas também a “humildade de apenas aceitar desafios que sabe que vai conseguir cumprir com distinção”. No mesmo sentido, mostra-se “satisfeita” pelo facto de o antigo colega ter aceitado o desafio quando “podia seguir outros caminhos porventura com mais reconhecimento” e tenha optado por se “dedicar à causa pública”.
Oposição. PSD fala em “regabofe completo”
Na oposição, o presidente do Conselho Estratégico Nacional (CEN) do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, comentou a nomeação de Tiago Preguiça para dizer que “o fim da CRESAP permite o regabofe completo”. Numa publicação muito crítica no Twitter, o dirigente do PSD denuncia que o socialista é um caso de alguém “sem experiência profissional relevante” que “chega a diretor-geral de um dos mais importantes organismos públicos”.
De facto, o fim da CRESAP permite o regabofe completo. Sem experiência profissional relevante chega a DG de um dos mais importantes organismos públicos. https://t.co/iFteK6Jc1z
— Joaquim M. Sarmento (@JMirandSarmento) April 20, 2021
A notícia é igualmente vista com desconfiança no PSD/Santarém. Fonte local do partido admitiu ao Observador estar contente por um “miúdo de Santarém” chegar a diretor-geral da Segurança Social, deixou elogios a Tiago Preguiça e à forma como “faz política” — nomeadamente por ser “muito low profile e uma pessoa de consensos”, longe das “grandes guerras e de criar quezílias” — mas não entende a decisão. “É uma pessoa muito nova, sem grande experiência profissional e dentro da sociedade para ser diretor-geral da Segurança Social”, apontou a mesma fonte.
“Sem retirar mérito” e apesar da “melhor das boas impressões” pelos contactos na política local, a fonte social-democrata de Santarém considerou ser “demasiado prematuro”. “É entregar um cargo a alguém de confiança”, reiterou, frisando que dentro do Governo “o primeiro-ministro reconheceu-lhe a capacidade para o cargo”, mas “visto cá de fora é quase um boy do PS, um job for the boy”.
Tiago Preguiça deu os primeiros passos na política na Juventude Socialista e o cruzamento com a política nacional dá-se em 2015 quando, depois de ter exercido funções como consultor na área da comunicação institucional e corporativa em agências de comunicação entre 2011 e dezembro de 2015, chegou ao Governo para ser adjunto do Gabinete do Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, na altura Vieira da Silva, e entre junho de 2018 e outubro de 2019, exerceu funções de chefe de Gabinete. Era um dos homens de confiança do antigo ministro.
Dentro dos corredores do Governo, ainda no primeiro mandato de Costa, foi circulando a informação de que era competente, tendo sido recrutado para o principal gabinete do Governo: o do primeiro-ministro. E a ligação à Segurança Social manteve-se. Em dezembro de 2019 foi anunciada a nomeação de Tiago Preguiça, que já estava a exercer o cargo de assessor do Gabinete do primeiro-ministro desde outubro do mesmo ano, segundo o despacho publicado em Diário da República. Ao lado de António Costa acompanhou os temas da Segurança Social, a ação social, o trabalho e o emprego, tal como a Concertação Social e as relações sindicais.
O percurso na JS e como Gameiro o impediu de ser deputado
Começou o percurso político pela JS, no distrito de Santarém, e em poucos anos foi da presidência da concelhia, à distrital e chegou a presidente da Comissão Nacional da Juventude Socialista, o órgão máximo da ‘jota’ socialista entre congressos. Em fevereiro de 2014 que, durante a Convenção Federativa da Juventude Socialista de Santarém, foi eleito pela primeira vez presidente da Federação Distrital da Juventude Socialista da região, num ato eleitoral sem adversário. Quase dois anos depois, viria a repetir a proeza. No final de 2016, subiu mais um degrau na estrutura da ‘jota’ ao devolver ao Ribatejo a liderança da Comissão Nacional Juventude Socialista.
Apesar de ser um dos ‘jovens de ouro’ do Governo e de António Costa, a vida nem sempre foi fácil no PS/Santarém. Em 2019 chegou mesmo a ser escolhido pela concelhia de Santarém para ser candidato pelo distrito à Assembleia da República, mas a distrital trocou-lhe as voltas. Com António Gameiro na liderança, a distrital do PS preferiu Manuel Afonso a Tiago Preguiça. O candidato acabou por conseguir o cargo de deputado e é também cabeça de lista à Câmara Municipal de Santarém.
António Gameiro também é deputado à AR pelo PS e, nos últimos dias, viu-se envolvido na Operação Triângulo, em que é suspeito dos crimes de corrupção passiva praticada por titular de cargo político e prevaricação. A investigação levou o socialista a renunciar à candidatura à Câmara Municipal de Ourém, mas vai manter-se como deputado.
A nível local, Tiago Preguiça foi deputado municipal entre 2011 e 2017 e deputado Intermunicipal na Assembleia da Comunidade Intermunicipal da Lezíria do Tejo de 2013 a 2017.