A quase dois meses do prazo para obter o estatuto de residência no Reino Unido, existem portugueses que ainda não completaram o processo porque não conseguem renovar os documentos de identificação nos consulados.

Antónia Barbosa, residente em Londres há cerca de 27 anos, aguarda há mais de um mês pela resposta do consulado geral de Londres por uma data para poder renovar o cartão do cidadão.

Sem acesso à Internet, pediu à filha para pedir o agendamento ‘online’, referindo a urgência de realizar a renovação para efeitos da candidatura ao sistema de registo de cidadãos da União Europeia [EU Settlement Scheme] pós-‘Brexit’, cujo prazo acaba em 30 de junho.

“Antes fazia o cartão em Portugal, mas agora não posso viajar. É preocupante porque já estamos quase em maio. A minha tensão tem andado mais alta por causa da ansiedade”, confiou Antónia Barbosa à agência Lusa.

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Rita Pina Ferreira, residente em Edimburgo, já obteve o título provisório e o do marido, mas ainda não conseguiu fazer o processo dos três filhos, de 12, 8 e 5 anos.

“Os dois mais velhos renovaram o cartão do cidadão em setembro, mas não consigo marcar para fazer o levantamento em Manchester. Já telefonei, mas nunca atendem”, queixou-se.

Não voltou a insistir porque ficar em espera por períodos consecutivos de 30 minutos, após os quais a chamada é interrompida automaticamente, é oneroso, mesmo ao custo de chamada local.

Quando à marcação para a renovação do cartão do cidadão do filho mais novo, disse estar a ter dificuldade em fazer o agendamento pela Internet, à qual só acede através de um telemóvel.

O sistema é confuso, pois existem dois métodos distintos de marcação prévia de atendimento no Portal das Comunidades Portuguesas.

O serviço de agendamento ‘online’ só oferece como opções atos de notariado, como a realização de uma procuração ou reconhecimento de assinaturas, certificados de registo criminal, pedido de atribuição de número de identificação fiscal e pedido de nacionalidade portuguesa.

Para documentos de identificação e atos de registo civil, os pedidos são feitos através do Centro de Atendimento Consular para o Reino Unido, que pede o preenchimento de um formulário para envio por ’email’, mas cuja resposta pode demorar semanas ou meses.

Nas redes sociais, multiplicam-se os casos de pessoas que só estão a conseguir marcações para dentro de seis meses, em outubro, muito depois do prazo para assegurar a residência.

“Sei de quem, mesmo com as restrições da pandemia, foi a Portugal tratar de documentos por causa do estatuto de residência”, afirmou à Lusa o conselheiro das Comunidades Portuguesas, Sérgio Tavares.

Até ao fim de dezembro de 2020, o Ministério do Interior britânico disse ter aprovado 331.200 candidaturas de portugueses a estatuto de residente no Reino Unido.

O Governo português estima que a comunidade portuguesa no Reino Unido ronde as 400 mil pessoas, tendo em conta os cerca de 375 mil inscritos nos consulados e os cerca de 335 mil que têm morada britânica no cartão do cidadão.

No mês passado, o deputado do PSD Carlos Gonçalves alertou no parlamento para o risco de existirem “várias dezenas de milhares de portugueses” que não formalizaram a candidatura por os documentos estarem inválidos.

O eleito pelo círculo da Europa urgiu a criação de um “sistema de atendimento prioritário tipo ‘porta aberta'” para dar resposta imediata a pedidos urgentes deste género.

O ministro de Estado e Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, prometeu criar “todas as condições indispensáveis para que todos os portugueses possam registar a sua residência no Reino Unido”.

Porém, lembrou que o funcionamento dos postos foi e está a ser condicionado pela pandemia de covid-19 e pelas restrições impostas pelas autoridades britânicas.

As presenças consulares, que implicam deslocações de funcionários a certas localidades onde há uma concentração significativa de portugueses, como Edimburgo, Peterborough ou Jersey, estão suspensas desde o ano passado.

Antes da pandemia, o Governo tinha acionado o plano de contingência para o ‘Brexit’, com o reforço com funcionários e o alargamento do horário de funcionamento dos consulados de Londres e Manchester, tendo este último retomado este mês o atendimento aos sábados.

Porém, os meios continuam a ser insuficientes perante a procura elevada, já que o registo é obrigatório para todos, sejam adultos ou crianças.

No ‘site’ do consulado de Londres, um contador automático regista os dias, horas, minutos e segundos para o fim do prazo, urgindo as pessoas a fazerem a candidatura.

Incapaz de renovar os seus documentos para garantir o estatuto de residente no Reino Unido, André Silva, residente em Elgin, no norte da Escócia, sente-se num “beco sem saída”.

“Estou cá desde os 12 anos, tenho cá os meus pais, tios, irmãos e sobrinhos. A minha família está cá toda e tenho medo que me ponham daqui para fora se não fizer o registo a tempo”, confessou.