Em oito dias, alguns dos principais políticos, altas patentes de forças de segurança e antigos líderes políticos espanhóis foram destinatários de um total de sete cartas com ameaças — seis delas tinham balas de armas de fogo no interior e uma tinha uma faca, aparentemente ensanguentada (as manchas vermelhas não serão de sangue).

Até agora, as autoridades espanholas já identificaram o remetente da carta que se fazia acompanhar de uma faca. Trata-se de um homem com problemas de saúde mental, cujo nome não foi tornado público e que segundo o El País é considerado “inimputável”.

Já a proveniência das seis cartas com balas ainda é desconhecida mas, segundo o El País, a origem das primeiras três — enviadas na semana passada — não será a mesma da das últimas, enviadas já esta semana. A mais recente carta a ser intercetada tinha como destinatário o antigo primeiro-ministro espanhol José Luis Zapatero. E três delas visavam dois candidatos às eleições regionais de Madrid, que se disputam no próximo dia 4 de maio: Pablo Iglesias (foram-lhe dirigidas duas) e Isabel Díaz Ayuso.

Os primeiros alvos: Iglesias, ministros do Interior e Indústria, diretora da Guarda Civil

As primeiras quatro cartas foram enviadas na última semana (uma delas só foi tornada pública esta semana). Tiveram quatro alvos: o ministro do Interior do Governo de Pedro Sánchez, Fernando Grande-Marlaska, a diretora da Guarda Civil, María Gámez, o líder do partido Unidos Podemos — e candidato às eleições regionais de Madrid — Pablo Iglesias e a ministra da Indústria, Comércio e Turismo, Reyes Maroto.

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As primeiras notícias de cartas com balas e ameaças de morte chegaram aos meios de comunicação espanhóis na última semana, depois de Pablo Iglesias ter revelado na rede social Twitter a primeira carta que recebeu. Escreveu Iglesias: “O Ministério do Interior recebeu uma carta dirigida a mim com ameaças de morte feitas a mim e à minha família”.

Não é a primeira vez que acontece. Hoje também receberam cartas ameaçadoras o ministro Marlaska e a Diretora da Guarda Civil. Ameaças e mais ameaças para que deixemos de fazer política. E cada vez vão um pouco mais longe”, apontou. Iglesias culpou a “ultra-direita”, mas não há ainda indícios de quem terá enviado a missiva.

Na primeira carta recebida por Pablo Iglesias, além de quatro balas vinha a seguinte mensagem: “Pablo Iglesias Turrión, deixaste morrer os nossos pais e avós. A tua mulher, os teus pais e tu estão condenados à pena capital. O teu tempo esgota-se”.

Já o ministro do Interior, Fernando Grande-Marlaska, recebeu uma carta — enviada exatamente no mesmo dia da de Pablo Iglesias — com duas balas e com a seguinte mensagem: “Tens dez dias para te demitires. O tempo de te rires de nós acabou. Polícia Nacional. Guarda Civil. O tempo corre contra ti por taponazos [expressão que se refere a um tiro ou uma explosão muito forte]”.

Também a carta enviada à diretora da Guarda Civil, Maria Gámez, foi enviada no mesmo dia mas foi intercetada um dia depois. Sobre esta carta não há tantos detalhes, mas sabe-se que tinha uma bala no interior e não fazia referência às forças policiais. Porém, tinha algumas semelhanças com a carta recebida pelo ministro do Interior, Fernando Grande-Marlaska. Estava lá a mesma expressão, pouca usada em Espanha: “taponazo”.

O caso da faca aparentemente ensanguentada recebida pela ministra da Indústria, Comércio e Turismo, Reyes Maroto, foi mais fácil de resolver. Segundo o El Español, o homem foi “rapidamente localizado pela Polícia Nacional” dado que colocou o seu nome no remetente da missiva. Tratar-se-á de uma pessoa que padece de problemas mentais e que já esteve inclusivamente internado numa unidade de tratamentos psiquiátricos. Ao jornal, “fontes” das forças de segurança adiantaram que se trata de um homem “conhecido pelos agentes pelos seus conflitos constantes com os vizinhos devido a problemas de ruído e discussões”.

O jornal El País deu mais alguns detalhes sobre as três cartas com balas no interior enviadas na semana passada. Embora os três destinatários sejam distintos, as cartas foram efetivamente enviadas no mesmo dia, o que leva as autoridades a acreditar que o autor será o mesmo nos três casos. Outro detalhe relevante: o tipo de cartuchos colocados em cada envelope era do mesmo calibre, 7,62. Este tipo de bala não é usado há muito nem pelas Forças Armadas espanholas nem pelas várias forças de segurança do país.

Outro ponto que tem feito correr muita tinta é o facto de ter havido um erro humano na supervisão, que permitiu que as cartas chegassem, efetivamente, ao ministério do Interior e à Direção da Guarda Civil — tendo sido depois intercetadas pelas equipas de segurança dos ministérios e da Direção Geral da Guarda Civil antes de chegarem aos alvos.

A investigação interna levada a cabo pelos serviços de Correios, que até foi revelada pela estação Cadena SER, concluiu que as cartas não foram intercetadas antes de chegarem ao destino (os ministérios e a sede da Direção Geral da Guarda Civil) por uma falha de um elemento da equipa de segurança, que apesar de estar naquele momento responsável pelo scanner dos envelopes não identificou as balas.

Mais cartas com balas esta semana: desta vez para Zapatero, Díaz Ayuso e (outra vez) Iglesias

O ainda líder do Unidas Podemos, Pablo Iglesias, voltou a ser visado esta semana com uma nova carta com balas e com ameaças. Trata-se, como recorda o jornal La Vanguardia, da segunda carta com munições no interior que tem como destinatário Iglesias “em menos de uma semana”. As restantes duas foram enviadas nos últimos dias para o antigo primeiro-ministro espanhol José Luís Zapatero e para a atual presidente da comunidade de Madrid, Isabel Díaz Ayuso (do Partido Popular).

No caso de Pablo Iglesias, a nova carta vinha com mais quatro balas no interior e desta vez foi intercetada pelos correios antes de chegar à equipa de segurança do ministro espanhol. Inicialmente chegou a pensar-se que a carta continha ameaças para María Gámez, mas de acordo com “fontes da investigação” consultadas pelo La Vanguardia as ameaças voltavam a ser novamente para Pablo Iglesias e para a sua família.

Iglesias, recorde-se, é o candidato do Unidas Podemos às regionais de Madrid, enfrentando nas eleições — previstas já para o próximo dia 4 de maio — a atual Presidente, Díaz Ayuso, também ela alvo de uma carta com cartuchos e ameaças nos últimos dias.

Para Isabel Díaz, esta foi a primeira carta. Continha duas balas — aparentemente de calibre 22, calibre que o La Vanguardia diz ser ser comum em desportos de tiro e também uma munição habitualmente vendida em espaços comerciais a quem tem licença de porte de arma.

A missiva, que tinha como morada final a sede do Partido Popular em Madrid, foi intercetada por um posto de correios de uma localidade da província de Barcelona, segundo os meios de comunicação espanhóis, e a polícia catalã Mossos d’Esquadra já está a investigar.

Na reação ao sucedido, Díaz Ayuso foi contundente e concisa. Numa entrevista televisiva, afirmou: “A estas coisas há que dar a importância que têm, que é nenhuma”. E acrescentou que “quem envia estas coisas o que procura é um minuto de glória” e de fama, “que se fale deles”. A política do PP não quis “dar-lhes esse gosto” e rematou: “Perante a violência, perante os violentos, os que querem utilizar o terror para serem protagonistas de alguma coisa, temos de mostrar serenidade e desprezo. E assim isto acaba. O que não podemos é estar o dia todo a falar do mesmo”. Díaz teme que tal possa encorajar outras pessoas a enviar envelopes semelhantes.

A última carta com balas no interior enviada a uma alta figura da política ou forças de segurança de Espanha tinha como destinatário o ex-líder do PSOE e antigo primeiro-ministro espanhol José Luís Zapatero, que tem atualmente 60 anos. Também segundo o La Vanguardia, que citava fontes do ministério do Interior, a carta tinha duas balas no interior e foi intercetada no mesmo posto em Madrid onde foi intercetada a segunda carta que teve Pablo Iglesias como destinatário.

As balas incluídas no envelope dirigido ao antigo primeiro-ministro espanhol teriam calibre 38 — para serem usadas em armas de fogo de 38 mm — e vinham acompanhadas de uma mensagem em que se lia: “Zapa, verme nojento, insonso, ignorante que causou e continua a causar tantos danos a Espanha. Espero que as suas meninges expludam da sua sobrancelha”.

Segundo a estação LaSexta, este último pacote não trazia remetente nem destinatário mas tinha o nome de Zapatero inscrito — e vinha com uma caixa de DVD embrulhada em fita adesiva no interior. Numa curta reação, o antigo primeiro-ministro espanhol pediu “educação”, “serenidade” e “cultura”, segundo a estação LaSexta.

As autoridades ainda não sabem quem terá estado por trás do envio destas três últimas cartas. Porém, segundo o El País ouviu de “fontes próximas das investigação”, pelo menos as duas enviadas nos últimos dias a Isabel Díaz Ayuso e a Pablo Iglesias “terão sido enviadas por pessoas diferentes das que enviaram as três primeiras”, dirigidas a Iglesias, a Fernando Grande-Marlaska e a Maria Gámez.

Segundo a investigação, a carta a Díaz terá sido originalmente colocada numa caixa de correio em Sant Cugat, Barcelona — ao passo que a segunda carta que continha ameaças para Pablo Iglésias terá sido colocada originalmente numa caixa de correio em Madrid. É possível, portanto, que mesmo as cartas mais recentes não só não tenham sido enviadas pelo remetente das primeiras como também tenham proveniências distintas entre si. As investigações estão em curso.