A 26 de maio de 1999, Manchester United e Bayern Munique encontraram-se em Camp Nou, Barcelona, na final da Liga dos Campeões. Um golo de Basler, logo aos seis minutos, colocou os alemães em vantagem e arrastou a partida até ao período de descontos sem que os ingleses conseguissem voltar a integrar-se na discussão no troféu. Ao primeiro minuto de tempo adicional, porém, Teddy Sheringham empatou e deu a ideia de que tudo iria decidir-se no prolongamento. Mas ao terceiro minuto de descontos, com um desvio na sequência de um canto, Ole Gunnar Solskjaer deu a vitória ao Manchester United e gelou jogadores, equipa técnica e adeptos do Bayern Munique.

O momento, que garantiu aos red devils a segunda de três Ligas dos Campeões conquistadas, ficou na história do Manchester United e ficou na história de Solskjaer. Esse momento, aliás, é o grande capítulo da história de Solskjaer. O avançado norueguês, que nunca foi absolutamente indispensável para Alex Ferguson mas que se tornou um símbolo do clube por ser um jogador de plantel que passou mais de uma década em Old Trafford, ainda hoje é recordado pelo golo épico marcado em pleno Camp Nou. E esta quarta-feira, precisamente 22 anos depois dessa final da Liga dos Campeões, voltava a disputar uma final europeia pelo Manchester United.

Ficha de jogo

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Villarreal-Manchester United, 1-1 (11-10 após grandes penalidades)

Final da Liga Europa

Arena Gdánsk, em Gdansk (Polónia)

Árbitro: Clément Turpin (França)

Villarreal: Rulli, Juan Foyth (Mario Gaspar, 87′), Raúl Albiol, Pau Torres, Pedraza (Albert Moreno, 87′), Parejo, Trigueros (Moi Gómez, 77′), Capoue (Dani Raba, 120+3′), Gerard Moreno, Carlos Bacca (Coquelin, 60′), Pino (Paco Alcácer, 77′)

Suplentes não utilizados: Sergio Asenjo, Funes Mori, Estupiñán, Peña, Jaume Costa, Niño

Treinador: Unai Emery

Manchester United: De Gea, Wan-Bissaka (Alex Telles, 120+2′), Bailly (Tuanzebe, 116′), Lindelof, Luke Shaw, McTominay (Juan Mata, 120+2′), Pogba (Daniel James, 116′), Mason Greenwood (Fred, 100′), Bruno Fernandes, Rashford, Cavani

Suplentes não utilizados: Lee Grant, Dean Henderson, Harry Maguire, Amad Diallo, Matic, Brandon Williams, Van de Beek

Treinador: Ole Gunnar Solskjaer

Golos: Gerard Moreno (29′), Cavani (55′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Capoue (54′), a Bailly (82′), a Juan Foyth (85′), a Cavani (113′)

A 26 de maio de 2021, os ingleses defrontavam agora o Villarreal na final da Liga Europa, em Gdansk, e procuravam conquistar um troféu que venceram em 2017, com José Mourinho, e que foi o último que o clube alcançou. Solskjaer tinha a oportunidade de vencer o primeiro título enquanto treinador do Manchester United e Bruno Fernandes tinha a oportunidade de vencer o primeiro título enquanto jogador do Manchester United — para além do primeiro título internacional ao nível de clubes. Para os ajudar, de forma natural, levaram um amuleto: Alex Ferguson, que viajou com a comitiva e conversou com o internacional português, com Juan Mata, Cavani e Matic durante o almoço.

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Do outro lado, porém, estava então um Villarreal que disputava a primeira final europeia da sua história mas que contava com a experiência do Mr. Liga Europa — o treinador Unai Emery, que conquistou três vezes a competição ao serviço do Sevilha e que procurava ser novamente feliz. Perante 9.500 adeptos, cerca de 25% da capacidade total da Arena Gdánsk, Bruno Fernandes era naturalmente titular (e capitão de equipa), assim como Pogba, Rashford e Cavani, e Fred começava no banco em benefício de McTominay. A surpresa era Harry Maguire, que tem estado a recuperar de lesão e que era suplente, voltando às opões de Solskjaer. Do outro lado, Emery lançava Bacca e Moreno no ataque, deixando Paco Alcácer no banco, e Juan Foyth regressava de uma lesão diretamente para o onze inicial. A grande ausência, por estar lesionado, era o nigeriano Chukwueze, que nem sequer integrava a ficha de jogo e que foi uma das grandes figuras da época do clube espanhol.

Villarreal CF v Manchester United - UEFA Europa League Final

A final contou com cerca de 9.500 adeptos, 25% da lotação total do estádio

Os primeiros instantes permitiram desde logo entender que o Villarreal se apresentava num 4x4x2 clássico, com Bacca e Moreno destacados na frente, e que o Manchester United jogava com Bruno Fernandes e Greenwood mais próximos das alas, enquanto que Rashford era o elemento que ficava mais perto de Cavani. McTominay teve o primeiro remate, de fora de área e ao lado (7′), e o primeiro quarto de hora da final acabou por ficar marcado por um azar de Juan Foyth, que acertou em cheio com o nariz no joelho de Pogba e teve de ser assistido em duas ocasiões distintas por estar a sangrar abundantemente.

Os ingleses tinham mais bola e jogavam praticamente por inteiro no meio-campo adversário, rendilhando as jogadas à procura de espaço livre. O Villarreal atuava com um bloco muito compacto e as linhas muito próximas, algo que deixava o corredor central totalmente obstruído e que obrigava a equipa de Solskjaer a procurar os corredores e a largura para conseguir avançar. Exemplo disso foi o lance em que Greenwood cruzou para a grande área, à procura de Bruno Fernandes e traído por um corte da defensiva espanhola (11′), logo depois de ser lançado por um grande passe de rotura de Pogba. Luke Shaw ainda teve um momento interessante, com um remate cruzado com muita força que passou ao lado da baliza de Rulli (20′), mas foi a partir dessa altura que os espanhóis começaram a reagir.

Ciente de que o Manchester United tinha mais bola mas estava a conseguir construir muito pouco com ela, a equipa de Unai Emery começou a alargar o bloco e a soltar Pino e Trigueros, que aceleravam as transições e apoiavam Bacca e Moreno. Pino, de apenas 18 anos, teve o primeiro remate mais perigoso do Villarreal, de fora de área e a esbarrar em cheio em McTominay (22′), e a partida tornou-se progressivamente mais equilibrada a partir desse momento. Pau Torres cabeceou por cima depois de um cruzamento de letra de Bacca (23′), Pino atirou ao lado pouco depois (27′) e o golo, esse, já não tardaria. Parejo bateu um livre na esquerda, depois de uma falta dura de Cavani, e Moreno fugiu à marcação de Lindelof para desviar de pé direito para dentro da baliza e marcar no primeiro remate enquadrado dos espanhóis (29′). O experiente avançado igualava Giuseppe Rossi como o melhor marcador da história do Villarreal, com 82 golos, e chegava ao 30.º golo da temporada, o sétimo na Liga Europa.

Até ao intervalo e de forma natural, o Manchester United voltou a assumir o controlo da partida mas não conseguiu ficar realmente perto de empatar, até porque Bruno Fernandes e Rashford estavam a realizar exibições manifestamente apagadas. Os ingleses tinham muitas dificuldades para criar perigo a partir dos lances que criavam nos corredores — e que terminavam sempre com cruzamentos infrutíferos para a área — e o grupo ia acusando a ansiedade e o nervosismo, com Solskjaer a discutir com vários jogadores e Cavani a pedir explicações a alguns colegas. Ao intervalo, na final da Liga Europa, o Villarreal estava a 45 minutos de fazer história e conquistar o primeiro troféu internacional do clube.

Nenhum dos treinadores fez substituições ao intervalo mas depressa se percebeu que o Manchester United queria chegar ao empate o mais depressa possível: os ingleses iam procurando um futebol mais direto, com passes verticais, mas ficava a ideia de que queriam fazer tudo ligeiramente mais rápido do que tinha de ser. O Villarreal ainda teve uma boa chance para alargar a vantagem, num lance muito confuso na grande área de De Gea em que Bacca falhou o remate (48′), mas o golo da igualdade acabou mesmo por aparecer.

Na sequência de um canto e depois de um primeiro alívio da defesa espanhola, Rashford apareceu sozinho a rematar à entrada da grande área; a bola ficou prensada entre atacantes do United e defesas do Villarreal e Cavani, sempre oportuno, atirou para dentro da baliza (55′). Unai Emery reagiu com a saída de Bacca para a entrada de Coquelin, com Pino a aproximar-se de Moreno no ataque, mas os espanhóis viviam o período de maior pressão e desconforto na partida. Os ingleses estavam totalmente instalados no meio-campo adversário e, apesar de não criarem oportunidades de golo de forma consecutiva, estavam sempre muito perto da baliza de Rulli. Do outro lado, o Villarreal tinha muitas dificuldades para sair com a bola controlada e errava muitos passes na zona do meio-campo, permitindo recuperações simples por parte dos red devils, onde se destacava a exibição muito esforçada e solidária de McTominay.

O jogo perdeu alguma qualidade e intensidade na última meia-hora, com Pogba a protagonizar o único momento mais perigoso com um cabeceamento por cima na sequência de um cruzamento de Shaw (89′), e Emery continuou a fazer substituições, lançando ainda Paco Alcácer, Moi Gómez, Albert Moreno e Mario Gaspar. A partida chegou ao final do tempo regulamentar ainda empatada e seguiu para prolongamento — com essa particularidade de o Villarreal já ter feito cinco alterações e de Solskjaer ainda não ter mexido nos onze jogadores que começaram o jogo. No curto período de interrupção antes do início da meia-hora complementar, Bruno Fernandes assumiu por completo o papel de capitão e colocou-se no meio da roda do Manchester United e dar indicações, saltando à vista uma frase em particular: keep running, “continuem a correr”.

Na primeira parte do prolongamento, o Manchester United acusou alguma fadiga e permitiu mais posse de bola ao Villarreal, com os espanhóis a aproveitarem para desenhar as jogadas de ataque a partir de trás e chegar com mais perigo à baliza de De Gea. Alberto Moreno rematou ao lado numa ocasião (99′), Paco Alcácer atirou por cima instantes depois (100′) e Solskjaer reagiu com a primeira substituição, retirando Greenwood para lançar Fred e soltar Pogba para movimentos mais ofensivos. Ao intervalo, no prolongamento, continuava tudo empatado.

Villarreal CF v Manchester United - UEFA Europa League Final

O momento em que Bruno Fernandes saltou para o centro do grupo, antes do início do prolongamento, e motivou os colegas

Na segunda metade do prolongamento, Rashford queixou-se de problemas musculares depois de uma aceleração mas acabou por permanecer em campo, com Solskjaer a optar por retirar Pogba e Bailly para lançar Daniel James e Tuanzebe. Até aos 120 minutos, já pouco aconteceu à exceção das entradas de Alex Telles e Juan Mata, duas decisões já claramente a pensar nas grandes penalidades. Aí, foram precisos 22 penáltis para encontrar um vencedor: depois de todos os jogadores de campo baterem e marcarem, o guarda-redes Rulli não falhou e defendeu o pontapé de De Gea, tornando-se o herói do Villarreal e garantindo a conquista da Liga Europa por parte do clube espanhol.

Numa final muito disputada mas demasiado parca em oportunidades e lances de perigo, o Villarreal acabou por ganhar a lotaria das grandes penalidades e conquistou a Liga Europa, o primeiro título relevante dos espanhóis depois da terceira divisão em 1970. Unai Emery voltou a ganhar a segunda competição europeia, pela quarta vez, e tornou-se o treinador com mais vitórias na prova. Já o Manchester United continua sem conseguir festejar e volta a prolongar um jejum de títulos que já dura desde 2017, com Solskjaer e Bruno Fernandes (que acabou em lágrimas) a falharem o primeiro troféu pelos ingleses. O Submarino Amarelo nunca afundou, flutuou e chegou ao melhor porto da própria história.