André Ventura aposta em dois nomes pouco conhecidos do Chega para a vice-presidência do partido. Duas mulheres, ambas arquitetas, uma de Setúbal, outra do Porto. Marta Trindade e Ana Motta Veiga sobem à direção do Chega no mesmo Congresso em que André Ventura optou por fazer mudanças e substituir três vice-presidentes, Diogo Pacheco Amorim, Nuno Afonso e José Dias. Os dois primeiros foram despromovidos a vogais da direção, José Dias ficou sem cargo no partido, depois de perder a eleição para o Conselho de Jurisdição. Da direção sai ainda Lucinda Meireles e entra a assessora de imprensa Patrícia Carvalho.

Marta Trindade, a vice que acidentalmente viu Ventura na televisão

A chegada de Marta Trindade ao partido foi quase um acaso. A agora vice-presidente do Chega não sabia sequer da existência de André Ventura antes deste se tornar deputado na Assembleia da República e foi um dos discursos no Parlamento que serviu de cartão de visita. “Acidentalmente passei por uma televisão onde estava a passar um direto da Assembleia da República, o André estava a discursar. Parei, ouvi e pensei: ‘Isto faz muito sentido, poucas palavras mas tão assertivas.’” O Google fez o resto. Marta Trindade pesquisou sobre o partido, leu o programa, gostou do que leu e fez-se militante para “dar um contributo” para “ajudar aquele homem que ali estava sozinho a dizer aquilo que todos nós pensamos”.

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A responsabilidade do contributo tornou-se mais pesada quando, na noite de sábado do III Congresso do Chega, o secretário-geral Pedro Pinto lhe trouxe a mensagem de que André Ventura a queria na direção. Ainda não conseguiu digerir, “as emoções ainda estão à flor da pele”, mas se o presidente do Chega acredita que é uma “mais-valia”, então está pronta para assumir o desafio. Antes disso — quando estiver com o líder do partido — quer-lhe perguntar o que espera e até o porquê de ter sido a escolhida. Apesar disso, acredita que foi escolhida por ser “low profile” e por não andar “à procura de uma carreira política”.

No Congresso em que houve trocas significativas na direção do partido, Marta Trindade disse ao Observador que se quer colocar à parte das polémicas, até por não estar “dentro da situação”. Mas “reconhece” o trabalho de Nuno Afonso e de Diogo Pacheco Amorim — que passaram de vice-presidentes a vogais da direção.

A entrada no partido deu-se no final de 2019. Marta Trindade começou a ter alguma notoriedade nas redes sociais e o presidente da distrital de Setúbal integrou-a na equipa. É vice-presidente da Mesa da Assembleia Geral Distrital de Setúbal, vice-coordenadora do Núcleo Concelhio do Barreiro e o maior desafio surgiu quando foi convidada para encabeçar a lista à câmara municipal. Apesar de estar consciente de que “o coração dos barreirenses bate à esquerda”, vai apostar numa campanha com “integridade”, longe das acusações entre partidos e “sem acusar ninguém”. Marta Trindade quer uma “campanha limpa”, com “ideias construtivas”.

Ana Motta Veiga, a nova vice que faltou ao Congresso

André Ventura prometeu apostar em mulheres para a direção e escolheu também Ana Motta Veiga para vice-presidente. A nova dirigente do Chega foi militante do CDS, é do Porto, arquiteta especialista na área da habitação e alcança agora um dos cargos mais importantes do partido. Ao contrário da maioria dos protagonistas que estiveram presentes nas Caves de Coimbra para o III Congresso do Chega, Motta Veiga foi uma das ausências mais notadas. Estava no estrangeiro e não esteve no local.

Esta não é a primeira vez que Ana Motta Veiga representa o Chega. Nas eleições legislativas de 2019 foi a número três da lista do Porto, encabeçada por Hugo Ernano — o militar da Guarda Nacional Republicana que atingiu mortalmente a tiro uma criança de 13 anos durante uma perseguição, após um assalto.

Dos nomes escolhidos por Ventura para a direção nacional é a que tem um número de militante mais recente, mas fonte da direção explicou ao Observador que já está no partido há mais tempo, apenas teve um problema com a inscrição e só há cerca de uma semana é que ficou oficialmente como membro do partido. Antes do novo cargo já estava na comissão política e no gabinete de estudos do Chega, onde se dedica ao tema da habitação.

Pedro Santos Frazão, o homem que vai no sentido inverso

Se Nuno Afonso e Diogo Pacheco Amorim descem de vice-presidentes para vogais da direção nacional do Chega, Pedro Santos Frazão faz o sentido inverso. Membro do Opus Dei, católico e conservador, é candidato do Chega à Câmara Municipal de Santarém e um acérrimo defensor do mundo rural e das touradas. Define-se como um “pai de família”, é médico veterinário e já foi militante do PSD, sem nunca ter tido nenhum cargo. Entrou para o Chega em 2019 quando sentiu que a “situação da política nacional” e a “degradação das finanças públicas” mereciam que desse o seu contributo para o país.

Mais do que o lado conservador, o dirigente considera que foi a “defesa dos valores judaico cristãos para a sociedade” que levaram André Ventura a apostar na subida de cargo. O convite surgiu da parte do próprio presidente do partido e recebeu a notícia com “muito gosto”, com a promessa de que pretende “contribuir para a solidificação do partido” e de que “o desafio principal é levar o Chega a ser governo de Portugal”.

Pedro Santos Frazão olha para a renovação da direção e para a subida e descida de lugares com “naturalidade” e até com “bastante agrado”, até porque considera que este tipo de ações mostram que o Chega tem a “capacidade para se renovar”.

No III Congresso apresentou duas moções, entre elas a intitulada “Tauromaquia o presente e o futuro”, em que avança com propostas concretas para salvar a tauromaquia. A moção foi aprovada e tem como objetivo que a RTP seja obrigada a transmitir “pelo menos sete corridas de touros anuais” ao abrigo do contrato de concessão de serviço público, mas também que seja criado um “programa sobre tauromaquia na rádio pública (Antena1) e regresso de um programa de tauromaquia à RTP2”. Pedro Santos Frazão quer o regresso de espetáculos taurinos de imediato e sugere que, devido à pandemia, a lotação seja reduzida a metade. A descida do IVA dos espetáculos é outra das propostas, bem como a transmissão de cinco espetáculos ainda em 2021 na RTP.

Pedro Santos Frazão é um dos colaboradores do site Alianza 24 que, segundo o Público, tem uma “mistura de artigos falsos disfarçados de notícias, mexericos e calúnias em tom brejeiro, indigno e até obsceno, a que se junta propaganda explícita a enaltecer o Chega, o partido da extrema-direita portuguesa fundado por André Ventura”.

Patrícia Carvalho, a assessora que chegou à direção

Aos 33 anos, Patrícia Carvalho é um dos novos rostos da direção nacional de André Ventura. De todas as pessoas que chegaram à direção no III Congresso, é a mais próxima do líder do partido. É assessora de imprensa de Ventura e do Chega, trata de toda a comunicação e passa a maior parte dos dias com o presidente do partido. Para Patrícia Carvalho, o convite e a decisão de André Ventura é uma “honra”.

Antes de chegar à área da comunicação política, foi jornalista durante vários anos. Foi no final dessa etapa que se cruzou com o líder do Chega. No canal de Youtube Radar 351, contou que conheceu André Ventura devido a uma entrevista no âmbito da candidatura do PSD a Loures e que algum tempo depois acabou por ser desafiada para uma mudança na carreira profissional.

Contrariamente aos nomes que entram na direção, há duas pessoas que saem: José Dias (até agora vice-presidente) e Lucinda Ribeiro (até agora vogal). Dos três vice-presidentes que foram despromovidos, José Dias foi o único que ficou sem cargo, depois de ter perdido a eleição para o Conselho de Jurisdição. José Dias é presidente do Sindicato do Pessoal Técnico da PSP (SPT/PSP), jurista e candidato do Chega à Câmara Municipal da Amadora, mas deixa agora o segundo cargo mais importante da direção.

Lucinda Ribeiro era uma das evangélicas mais influentes no partido. Chegou a ser uma das pessoas do núcleo forte de Ventura e muito influente em Castelo Branco. No Facebook, geria vários grupos de apoio a André Ventura. Contra a imigração, é defensora de um levantamento de todos os cristãos contra o “inimigo” (a esquerda, leia-se) que quer transformar a “sociedade numa Sodoma e Gomorra”.