Dois campeonatos nacionais, uma Taça de Portugal, uma Taça da Liga e duas Supertaças. Tudo em três épocas e meia. Não é de menosprezar o currículo doméstico de Rui Vitória ao serviço do Benfica, clube que treinou entre o verão de 2015 e janeiro de 2019. Mesmo assim, acabou por sair da Luz pela porta pequena, rumo ao Al Nassr da Arábia Saudita.

Agora, quis o sorteio da 3.ª pré-eliminatória de acesso à Liga dos Campeões que as águias e o treinador ribatejano, que orienta agora os russos do Spartak Moscovo, se encontrassem novamente. Será a 10 de agosto, na segunda volta da eliminatória, que o português voltará a uma casa que conhece bem, tanto pelos títulos e pelas palmas, como pelos assobios. E irá também reencontrar Jorge Jesus, com quem trocou palavras menos afáveis na sua primeira época ao serviço das águias.

Do início… ao tri

Depois de dois anos nos escalões de formação do Benfica, entre 2004 e 2006, Rui Vitória acabaria por chegar à equipa principal das águias em 2015, tinha Jorge Jesus acabado de atravessar a 2.ª Circular e estacionado no Estádio de Alvalade. O objetivo era aproveitar o embalo do bicampeonato e chegar a um tricampeonato que não era conquistado há cerca de 40 anos. A época até começou mal, com uma derrota na Supertaça frente ao Sporting “versão JJ”, e os leões também eliminaram o Benfica na Taça de Portugal, mas o troféu da I Liga (e também o da Taça da Liga) acabou mesmo no Estádio da Luz, com o título confirmado apenas na última jornada.

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Na memória ficam ainda, entre outros, o lançamento de Ederson, que depois valeria milhões e milhões aquando da ida para o Manchester City, ou a caminhada na Liga dos Campeões (ainda uma espécie de calcanhar de Aquiles do Benfica), que só terminou nos quartos de final frente ao poderoso Bayern Munique.

A época 2016/2017 terminou num tetracampeonato absolutamente inédito, no dia em que Salvador Sobral venceu a Eurovisão e o Papa Francisco estava em Fátima. Mesmo com tantas distrações, a população benfiquista deslocou-se em massa para o Marquês de Pombal, para as ruas lisboetas e em todas as ruas do país, para celebrar mais um título de um treinador que não era ainda consensual.

Ao título nacional, Rui Vitória juntou o triunfo na Taça de Portugal, frente ao “seu” V. Guimarães. Na Taça da Liga, desta vez, as coisas não correram bem, e na Liga dos Campeões a equipa caiu nos oitavos de final, frente ao Borussia Dortmund. As águias até ganharam por 1-0 no Estádio da Luz, mas na Alemanha não estiveram ao nível do adversário, sofrendo um pesado 4-0.

Mas mesmo não sendo consensual para o “terceiro anel” do Estádio da Luz, Rui Vitória teve nesta época a sua melhor enquanto treinador, com 42 vitórias em 62 jogos e 136 golos marcados contra 48 sofridos.

Nem penta, nem #Reconquista (de Rui Vitória, pelo menos)

Para 2017/2018 o objetivo não podia ser mais claro: chegar a um penta nunca conquistado pelo Benfica e só conseguido em Portugal pelo FC Porto.

Infelizmente para os adeptos das águias, os dragões, já com Sérgio Conceição ao leme, viriam a negar o quinto campeonato consecutivo aos encarnados e o terceiro a Rui Vitória, conquistando o título com oito pontos de avanço.

Numa época em que saíram jogadores como Ederson, Lindelöf, Mitroglou e Nélson Semedo, os jogadores que chegaram à Luz não justificaram o dinheiro saído dos cofres. E por falar em milhões, a prestação na Liga dos Campeões não podia ter sido mais negativa. Foram seis derrotas em seis jogos, consequentes zero pontos e ainda um pesado 5-0 frente ao Basileia. Nem à Liga Europa o Benfica teve direito. E em Portugal, as coisas não correram melhor nas demais competições, com prestações pobres na Taça de Portugal e na Taça da Liga.

A época seguinte tinha como mote a #Reconquista. E, aqui, não só o Benfica podia voltar ao título nacional, como Rui Vitória pretendia regressar às boas graças dos exigentes adeptos benfiquistas. Resumindo: não correu (nada) bem para o ribatejano. As coisas “tremeram” logo em Novembro, depois de um 5-1 sofrido na Alemanha frente ao Bayern Munique. A saída de Rui Vitória esteve em cima da mesa, como Luís Filipe Vieira admitiu na altura, mas o então presidente do Benfica reverteu uma decisão que já estava praticamente tomada. “Não sei se foi uma luz que me deu”, referiu Vieira.

No início de janeiro, uma derrota no terreno do Portimonense fez mexer o processo da saída de Rui Vitória. À saída do técnico, o Benfica estava em quarto lugar do campeonato, que viria a vencer mas com Bruno Lage, a sete pontos do FC Porto, que significava a pior classificação à 15.ª jornada em dez anos.

Jesus vs Vitória, ou o Ferrari e as obsessões

Rui Vitória volta a encontrar o Benfica, sim, mas também Jorge Jesus, com quem teve, no mínimo, uma relação pouco amigável. E tudo devido a um… Ferrari.

Estávamos em janeiro de 2016, quando Rui Vitória, numa antevisão de um jogo da I Liga, deu a entender que Jorge Jesus, que se tinha mudado para Alvalade, estava “obcecado” com o Benfica. Jesus, como é seu hábito, não se fez rogado e respondeu de forma contundente: “Sou mau colega e mau treinador? Como não o qualifico [Rui Vitória] como treinador, não sou mau colega. Para ser treinador ele tem de ser muito mais. Fi-lo sair da toca, que era o que eu queria. Ele tem de se assumir. Para treinar o Benfica tem de se assumir. Para conduzir um Ferrari é preciso ter andamento para ele e vamos ver se aquele Ferrari continua a andar”.

“Estou obcecado pelo Benfica, FC Porto e todos os meus adversários, principalmente pelos rivais que estão na luta direta pelo campeonato. Procuro conhecer bem o adversário para quando for a quarta vez voltar a ganhar. Estamos a fazer o nosso caminho. Estamos obcecados para continuar em primeiro, obcecados porque queremos ser melhor que os outros, estamos obcecados por fazer coisas para a grandeza do clube”, disse ainda na altura.

Rui Vitória e Jorge Jesus defrontam-se por duas vezes já no início de agosto, ao serviço de duas equipas que curiosamente vestem de vermelho, como um… Ferarri. Veremos quem vence a corrida a duas voltas.