Os sinais associados à perturbação do espetro do autismo (PEA) podem começar a aparecer bastante cedo no desenvolvimento de um bebé, mas, normalmente, o diagnóstico não é feito antes dos três anos de idade. E só aí se dá início a uma intervenção terapêutica. Uma equipa de investigadores da Austrália e Reino Unido defende, no entanto, que a intervenção deve começar logo aos primeiros sinais.
“Uma intervenção de prevenção do autismo a partir dos nove meses de idade entre um grupo de bebés que apresentavam sinais precoces de PEA levou à redução da gravidade dos sintomas durante a primeira infância e reduziu as probabilidade de um diagnóstico de PEA aos três anos de idade”, concluíram os autores num artigo publicado na revista científica JAMA Pediatrics.
O diretor executivo da fundação Autistica mostrou-se animado com os resultados do estudo, porque confirmam aquilo que as famílias defendem: “Criar um ambiente que funcione para as pessoas autistas e seguir os seus interesses é a melhor forma de permitir que estas pessoas desenvolvam competências”.
O estudo também mostra que o apoio dado numa fase precoce faz uma verdadeira diferença e que o governo e os serviços precisam de pensar de forma mais proativa sobre como apoiar as crianças autistas”, defende James Cusack, num comentário ao artigo publicado.
As intervenções, com recurso a gravações em vídeo, ajudam não só as crianças como os seus cuidadores, que assim ajudam as crianças. O objetivo é “aumentar a consciência do cuidador sobre a comunicação social individual do bebé e orientar as respostas específicas do cuidador para construir o envolvimento e interação social” com a criança, explicam os investigadores no artigo.
Ao longo de cinco meses, cada família que testou esta intervenção precoce teve 10 sessões com um terapeuta treinado que filmava a interação dos pais ou cuidadores com a criança (que tinha, na altura, entre nove e 14 meses). Os exemplos positivos da interação social e comunicação entre crianças e adultos eram analisados para que os pais entendessem quando e como o bebé tentava comunicar com eles.
“Os autores forneceram evidências científicas robustas de que não devemos esperar até que um diagnóstico de autismo possa ser feito, e que devemos intervir ainda mais cedo, mesmo antes de todos os sinais serem evidentes”, diz Marie Schaer, médica numa clínica especializada em autismo na Suíça, num comentário ao artigo.
O método parte do princípio de que os pais podem melhorar a sua capacidade de estimular o desenvolvimento socio-comunicativo de um filho em situação de risco”, acrescenta a professora na Faculdade de Psiquiatria da Universidade de Genebra.
No final da experiência, três dos 45 bebés que tiveram acesso à intervenção precoce e nove dos 44 que só tiveram acesso ao acompanhamento normal foram diagnosticados com perturbação do espetro do autismo.
Apesar de as diferenças serem pequenas, os investigadores estão seguros que a intervenção antes dos três anos reduz a severidade dos sintomas e que reduz a probabilidade de diagnóstico aos três anos. Não é uma cura para o autismo, alertam, citados pelo The Guardian, mas é possível melhorar as interações sociais e reduzir os comportamentos repetitivos.
Entre as vantagens da intervenção, diz Marie Schaer, que não participou no estudo, estão o facto de as crianças poderem ser avaliadas com um simples questionário feito pelo médico de família e o custo associado ser muito baixo. “Dado o pequeno número de sessões, podemos imaginar que este tipo de intervenção a ser sistematicamente usado em crianças de grupos de risco para o desenvolvimento de autismo.”
Falta agora saber por quanto tempo se mantém os efeitos desta intervenção — se são duradouros ou apenas atrasam o diagnóstico.
Tim Nicholls, da Sociedade Nacional de Autismo, é um pouco mais crítico e aponta outras limitações, como o reduzido número de crianças e a avaliação apenas de resultados positivos, que podem tornar a experiência não replicável noutro lugar. Mas, acima de tudo, diz que faltou o envolvimento da comunidade e afirma que uma intervenção precoce vai acabar por ser feita também em crianças que nunca viriam a apresentar PEA.