Foi a um sábado, a 10 de julho, que Luís Filipe Vieira foi ouvido por Carlos Alexandre no Tribunal Central de Instrução Criminal, saindo para prisão domiciliária no âmbito da operação Cartão Vermelho. Foi a um sábado, a 9 de outubro, que Luís Filipe Vieira falou pela primeira vez publicamente sobre o caso que acabou com uma era de quase duas décadas na liderança do Benfica. Falou, falou e não falou pouco, quase como se tivesse estado à espera deste momento público para abordar tudo o que foi ouvindo em silêncio.

Como o próprio antigo presidente referiu, houve apenas um episódio menos agradável com um sócio neste regresso à Luz. “Disse coisas que não me devia ter dito”, assumiu. De resto, Vieira foi sentindo “apoio” por parte dos associados com quem se foi cruzando. Tanto que, quando as atenções estavam centradas na porta de saída onde se encontrava a zona para os meios de comunicação social, alguns benfiquistas soltaram a revolta contra a imprensa entre impropérios verbais que levaram a polícia a reforçar a segurança. Um filme já antes visto (demasiadas vezes) mas que nesta fase surgiria num contexto diferente mas que acabou por servir como manobra de distração para que saísse por uma outra porta (antes entrara pela porta 5 do Pavilhão número 2 da Luz) e entrasse no Porsche que o tinha transportado esta tarde.

“Não vou fazer mais comentários”, disse aos microfones da CMTV quando se preparava para entrar no carro. “Volto sempre à Luz quando quiser e viu-se pela manifestação que tive. Se recebi carinho? De todos, só um é que me chamou nomes mas também levou logo resposta. Agora já falei um bocado mas vai haver uma altura em que vou dizer tudo aos sócios e adeptos do Benfica. Em quem votei? No Rui Costa, logicamente…”, comentou depois entre uma conversa com um amigo que o foi cumprimentar pelo vidro.

Antes, numa intervenção na zona de entrevistas rápidas da BTV, Luís Filipe Vieira tinha falado de forma quase exaltada perante tudo o que se passou neste hiato de tempo, precisando apenas de uma pergunta inicial para disparar em várias direções depois de um associado ter passado pelo local dizendo “Ainda tens a lata de cá vir? És uma vergonha”. “Lata? Deve ser mas é cego”, atirou o antigo líder, ouvindo depois uma questão sobre as manifestações de carinho que foi recebendo no interior do Pavilhão da Luz.

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“Para quem esteve no Benfica cerca de 20 anos, acho que criei uma dimensão incalculável, como ninguém pensava. Projetei o Benfica para um mundo onde já não estava projetado. Não consegui acabar o que pensei e toda a gente sabe o que se passou comigo. A única coisa que quero adiantar a todos os benfiquistas é que não lesei nem nunca roubei o Benfica, que fique claro. O que se passou é algo que ainda não sei o que é, mas vou até às ultimas consequências. Sei que sou perseguido, sinto-me como peça de caça a quem querem dar um tiro mas não vou permitir que façam isso. Não vou deixar que façam isso, nem a mim nem ao Benfica, porque decapitaram o Benfica, e isso assustou muita gente. Continuo com motivação para me defender, e um dia mais tarde logo saberemos o que vamos fazer a seguir”, disse.

“Estarei sempre presente para os benfiquistas. Tive desilusões com pessoas dentro do Benfica depois da minha prisão, mas são coisas que digo um dia mais tarde. Há uma coisa que irei fazer de certeza: irei falar para a família benfiquista e dizer tudo aquilo que se passou comigo. Tenho lugar para me defender e continuar de cabeça bem erguida. Tive muitas manifestações de benfiquistas e nunca ninguém me agrediu verbalmente na rua, pelo contrário. Tive muitas manifestações de apoio. Sinto-me bem, tenho a consciência tranquila. Nada fiz contra o Benfica e o que disseram é tudo mentira”, prosseguiu Vieira.

“Mas mais grave que isso, hoje ouvi um senhor, um dirigente que passou por esta casa… Nunca quis senhas do Benfica, nunca utilizei nada do Benfica, os cartões de seguro que havia para familiares é para todos os funcionários e colaboradores do Benfica. Carros, nem sei do que fala. Se esse senhor esteve cá foi porque mendigou para estar cá. Como sabem, quando cá estava ouvia toda a gente mas também dizia que quem decidia era eu. A democracia a mais faz mal e a democracia neste clube faz mal. Por não haver democracia é que crescemos como crescemos. Hoje, mesmo que me queiram esquecer não me vão esquecer porque quando forem à casa de banho, quem se sentar numa secretária tem de se lembrar de mim. Falta só distinguir um homem, Mário Dias, foi um dos mentores da construção e tivemos a coragem de estar tudo pago. Sinto um orgulho muito grande que tenham confiado em mim para desenvolver o Benfica”, rematou.

Na sequência das declarações de Luís Filipe Vieira, o movimento Servir o Benfica, de Francisco Benítez, veio reclamar com o facto de ter demonstrado apoio a Rui Costa, repudiando “cabalmente as declarações do ex-Presidente da Direção e ainda sócio do Sport Lisboa e Benfica, realçando que o mesmo acaba de violar gravemente o artigo 30.º, n.2 do Regulamento Eleitoral, a favor do candidato da Lista A”.