O Il Tempo já lhe chama “um novo terramoto de futebol”. Pode ser exagerado, a perspetiva de castigos mais pesados parece colocada de parte (pelo menos por agora), mas tem tudo para colocar no centro da agenda um tema que motivou também alguns comentários em Portugal nas últimas semanas: a “troca” de jogadores sob forma de compra e venda pelos mesmos valores, sem que assim exista propriamente dinheiro a circular.

Como detalha o La Repubblica, a Comissão de Fiscalização dos Clubes de Futebol (Covisoc) enviou para o procurador federal da Federação Italiana de Futebol, Giuseppe Chiné, um total de 62 transferências de jogadores entre 2019 e 2021 que envolveram valores altos, “ou muito altos”, mas que na verdade não movimentaram sequer um euro. Razão? De acordo com o órgão de fiscalização que acompanha as contas das formações transalpinas, esses mesmos negócios têm depois um impacto significativo nos exercícios das sociedades. “Está a denunciar algo sistémico”, destaca o relatório a Consob (equivalente à CMVM).

https://twitter.com/CalcioCL/status/1453318404220272640

Dentro dessa comunicação, a que a publicação teve acesso, consta também um anexo com a súmula dos principais exemplos desse novo “modelo financeiro” que tem gerado dúvidas pelos números significativos que movimentam sem uma aparente razão desportiva que assim justifique. A Juventus é um dos clubes mais citados no documento, com 21 jogadores trocados por 90 milhões que na verdade fizeram mexer pouco mais de três milhões de euros. Exemplos? A chegada de Arthur do Barcelona e a ida de Pjanic para a Catalunha ou a saída de João Cancelo para o City com a viagem de Danilo e Félix Correua para Turim. Outros dos negócios abordados são a compra de Osimhen pelo Nápoles ao Lille, com envolvimento de quatro outros jogadores sem retorno, e a troca de Tongya e Marley Aké por oito milhões cada entre Juventus e Marselha.

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No negócio do Osimhen vieram quatro jogadores do Nápoles. A valorização dos quatro em conjunto, segundo os especialistas, é de 500 mil euros no máximo mas foram comprados por 20 milhões”, assumiu Olivier Letang, presidente do Lille, em entrevista ao La Voix des Sports.

Mas o que está então em causa? A capacidade que existe em criar proveitos em exercícios a custo prazo que dão outra margem a nível de fair play financeiro porque os custos ficam diluídos em mais anos, equivalentes aos anos de contrato que o jogador assume pelo novo clube. Em Itália a questão tornou-se mais pertinente nas duas últimas temporadas, com Juventus, AC Milan e Inter a somarem perdas de mil milhões de euros, a Roma a chegar a quase 400 milhões e a Lazio a ficar dois anos seguidos com as contas no vermelho. “De momento estamos numa espécie de alarme, na medida em que a investigação desportiva está quase concluída”, acrescenta a Gazzetta dello Sport, que fala também em contratos de 62 jogadores.

Júnior contratado ao FC Porto foi a terceira maior compra de sempre do Sporting (mas negócio ficou por zero e aumentou ativos)

A questão não foi ainda levantada em Portugal mas começam a surgir negócios semelhantes aos que estão agora a ser escrutinados em Itália. Logo à cabeça, e no fecho da última janela de mercado, a “troca” entre FC Porto e Sporting num total de 22 milhões de euros (11 milhões pagos, 11 milhões recebidos) que levou Marco Cruz para Alcochete e Rodrigo Fernandes para o Olival; antes ainda, o mesmo modelo mas entre os dragões e o V. Guimarães num total ainda mais elevado de 30 milhões: Francisco Ribeiro e Rafael Pereira mudaram-se para os minhotos por 15 milhões, Romain Correia e João Mendes foram para os portistas por 15 milhões.

V. Guimarães comprou dois médios da formação ao FC Porto por 15 milhões de euros (e dragões também ficaram com dois defesas dos minhotos)