Ao contrário do que é historicamente convencionado, os Vikings, não os portugueses, terão sido os primeiros a colonizar os Açores. Pelo menos, é esta a conclusão de um estudo recente, publicado na revista científica americana Proceedings of the National Academy of Sciences e liderado pelo ecologista Pedro Raposeiro, que recolheu e analisou sedimentos em lagos, fezes de animais, fungos e ainda o ADN de ratos que ainda habitam a ilha.

Não é sequer a primeira evidência que existe nesse sentido e esta nova investigação vem dar força à tese de que foram mesmo os nórdicos os primeiros a ocupar aquele território. Como explica a revista Science, e outras publicações como o The Guardian, que deram destaque ao estudo de Raposeiro, os investigadores começaram a recolher “núcleos cilíndricos de sedimentos de cinco leitos de lagos ao redor do arquipélago como parte de um esforço para detalhar a história climática da região”.

O objetivo era encontrar sinais da presença humana, como “pólen de colheitas não nativas ou esporos de fungos que crescem em fezes de gado”, e fizeram-no. Porém, ficaram surpreendidos ao perceber que os mesmo eram mais antigos: datavam do anos 700 a 850.

“As nossas reconstruções oferecem provas inequívocas da colonização pré-portuguesa dos Açores”, dizem os investigadores liderados por Raposeiro ao jornal britânico. E adiantam: “Estes resultados sugerem que os nórdicos foram provavelmente os primeiros colonizadores nas ilhas“.

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Como contou também o investigador à Science, os sedimentos retirados da Lagoa do Peixinho, na Ilha do Pico, têm um “aumento repentino de um composto orgânico denominado 5-beta-estigmastanol, que se encontra nas fezes de ruminantes como vacas e ovelhas”.

Além disso, o “aumento nas partículas de carvão e uma queda na abundância de pólens de árvores nativas”, mostram que houve humanos aí a queimar árvores para criar gado. O mesmo fenómeno é registado no lago do Caldeirão, na ilha do Corvo. Desta forma, a equipa afirma que havia humanos a habitar no arquipélago 700 anos antes da data que se presumia.

Mas quem habitou aí? “Os nórdicos”, diz Raposeiro, lembrando que há registos de saques feito por este povo a cidades costeiras europeias por estas datas. Além disso, os ventos do Norte do Oceano Atlântico teriam facilmente levado embarcações vikings a cruzar-se com os Açores, presume o investigador.

Ao The Guardian, o biólogo Jeremy Searle faz afirmações semelhantes através da análise que já tinha feito ao ADN de ratos. “Onde se encontram humanos, encontram-se ratos e pode-se descobrir de onde esses ratos vieram. Assim, há uma ideia de onde esses humanos tiveram seus lares originais”, diz o biólogo.

Ao comparar o ADN de ratos açoreanos com o de ratos que vivem noutros locais onde estiveram Vikings, como as ilhas britânicas, Searle sustenta esta tese. “Estes ratos eram obviamente viajantes acidentais que foram dispersos pelos vikings através do Atlântico, para a Islândia e Gronelândia e também para os Açores e Madeira, acreditamos”, refere. E diz ainda: “Isso mostra o quão longe os vikings se espalharam”.

Há quem dispute estas afirmações, como refere a Science. Simon Connor, geógrafo da Australian National University, que estuda a paleoecologia no arquipélago, diz que os dados de ADN de ratos podem ser enganadores. “Os vikings eram ótimos marinheiros. Mas pode ter sido qualquer um”, frisa. Em outubro, quando este artigo científico foi revelado inicialmente, o Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos – Açores (CIBIO) já referia que as primeiras evidências de presença humana nas ilhas foram detetadas 700 anos antes da chegada dos portugueses. Contudo, não era referido poderem ter sido povos nórdicos.

Detetada presença humana nos Açores 700 anos antes da chegada dos portugueses

*Artigo atualizado às 17h58 de 31 de outubro com referência à notícia publicada no início do mês.