A juíza Tânia Loureiro Gomes condenou a mulher do antigo banqueiro João Rendeiro a uma multa por não ter guardado pelo menos oito de 124 obras de arte apreendidas ao seu marido há cerca de dez anos. Maria de Jesus Rendeiro, que na sexta-feira invocou razões psicológicas para não esclarecer o paradeiro das obras, terá que pagar 10 UC, o que significa uma multa de 1020 euros, apurou o Observador junto de fonte judicial.
O tribunal considerou que a mulher de Rendeiro sabia perfeitamente que havia obras que tinham sido vendidas e outras (quatro) falsificadas até porque as obras de arte estavam à sua guarda na vivenda onde vivia com o marido, arguido no processo.
Maria de Jesus Rendeiro foi chamada sexta-feira ao tribunal para justificar onde estavam as obras que devia ter garantido que não saíam da sua casa na Quinta do Patino, em Alcabideche. Mas a fiel depositária começou a chorar e a juíza acabou por suspender a sessão.
No entanto, depois de o advogado do BPP revelar o paradeiro de algumas dessas obras, tendo mesmo demonstrado que uma delas estava exposta numa galeria de arte em Bruxelas, o Ministério Público pediu para a fiel depositária ser condenada uma multa. Decisão que a magistrada deixou para depois e que foi comunicada esta manhã de quarta-feira – o mesmo dia em que decorrem buscas à sua casa e às do presidente da Antral, Florêncio Almeida cujo filho cedeu o usufruto de uma vivenda na Quinta do Patino à mulher de Rendeiro. Uma operação que acabou com a detenção de Maria de Jesus Rendeiro.
Maria de Jesus Rendeiro chora e juíza suspende audição. Rendeiro vendeu oito obras por 1,3 milhões
A mesma juíza que condenou o marido de Maria de Jesus Rendeiro a uma pena de dez anos de cadeia – por fraude fiscal qualificada, abuso de confiança qualificado e branqueamento – já tinha mandado extrair uma certidão para que Maria de Jesus Rendeiro fosse processada pelo crime de descaminho e desobediência. Por isso a defesa da fiel depositária ainda argumentou sexta-feira em tribunal de que ela não poderia prestar declarações sob pena de se auto-incriminar. A juíza desvalorizou o argumento e só suspendeu a sessão quando Maria de Jesus Rendeiro começou a chorar mostrando-se fragilizada psicologicamente para esclarecer o paradeiro de oito obras de artes.
Já o advogado que representa o BPP, Miguel Coutinho, acabou por desvendar uma parte. Pelas suas contas, explicou o advogado, estarão em falta 13 dos objetos e desses oito “já foram vendidos entre 23 outubro de 2020 e 1 de outubro de 2021 pelo valor de 1 milhão e 300 mil euros”, disse. Mais. Quatro dessas obras terão sido replicadas e falsificadas para substituir as originais — levantando assim as suspeitas iniciais da PJ. E uma delas está agora exposta publicamente numa galeria em Bruxelas.
No despacho que agora condena Maria de Jesus Rendeiro a uma multa, a magistrada lembra como a Polícia Judiciária informou o tribunal a 11 de outubro de que 15 das 124 obras de arte aprendidas em 2010 não estavam com Maria de Jesus Rendeiro. Mais, que na sua posse estavam ainda três réplicas de originais, cuja falsificação era “perfeitamente alcançada por mera comparação a “olho nu”.
A juíza refere ainda que a justificação que Maria de Jesus Rendeiro deu, “designadamente parecer-lhe normal, face ao tempo decorrido, que a totalidade dos objetos apreendidos se encontrassem noutros locais”, é absolutamente irrelevante e destituída de “razoabilidade”. Uma vez que eram os seus deveres como fiel depositária guardar as obras. E lembra que entre as seis obras que localizou e entregou à PJ estava também uma falsificação.
“O comportamento assumido pela fiel depositária é especialmente censurável”, escreve a juíza.
O tribunal recusou para já o pedido do BPP de arrestar todo o recheio da casa onde ainda permanece Maria de Jesus Rendeiro de forma a salvaguardar o pagamento das indemnizações ao Estado e aos lesados do BPP.