Três semanas depois de a Polícia Judiciária ter percebido que na casa dos Rendeiro faltavam pelo menos 15 das 124 obras de arte arrestadas pelos processos do BPP, Maria de Jesus Rendeiro chegou ao edifício A do Campus de Justiça, em Lisboa, protegida pelo guarda chuva vermelho da advogada. Entrou na sala de audiências, esperou nervosa pela juíza, mas quando chegou a vez de falar, começou a chorar. Parte da revelação que se esperava acabou por ser feita por Miguel Coutinho, advogado do BPP, num resumo que fez do requerimento que entregou à juíza: oito das 15 obras desaparecidas foram já vendidas por 1,3 milhões de euros e uma delas está agora exposta publicamente numa galeria em Bruxelas.

Pelas suas contas, explicou o advogado, estarão em falta 13 dos objetos e desses oito “já foram vendidos entre 23 outubro de 2020 e 1 de outubro de 2021 pelo valor de 1 milhão e 300 mil euros”, disse. Mais. Quatro dessas obras terão sido replicadas e falsificadas para substituir as originais — levantando assim as suspeitas iniciais da PJ.

Antes da revelação de Miguel Coutinho esta sexta-feira no tribunal, a defesa de Maria de Jesus Rendeiro tentou por tudo que a mulher do antigo banqueiro não prestasse declarações sob argumento de que ela virá a ser alvo de um processo-crime pelo crime de descaminho. Logo as suas declarações de agora podiam incriminá-la, argumentou a advogada Joana M. Fonseca, ao lado do advogado Abel Marques (secretário geral da ANTRAL).

Mas a juíza, que condenou Rendeiro a dez anos de cadeia e que agora o quer prender preventivamente, esclareceu que em causa estavam os deveres de Maria de Jesus Rendeiro enquanto fiel depositária “independentemente da certidão que mandou extrair”. Joana M. Fonseca insistiu, mas não demoveu Tânia Loureiro Gomes, que já tinha dado vários dias à defesa para dar explicações ao processo sobre o paradeiro das obras. Aliás, a defesa chegou a indicar ao tribunal ter localizado metade das obras desaparecidas.

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Maria de Jesus Rendeiro foi então identificada, disse onde vivia, mas depressa se desfez em lágrimas. “Não estou em condições de responder a nada deste processo”, respondeu Maria de Jesus Rendeiro em tribunal, alegando não ter condições psicológicas para responder. A sua advogada ainda pediu que fosse constituída arguida para poder remeter-se ao silêncio, mas a juíza acabou por considerar que Maria de Jesus Rendeiro não estava “em condições de cumprir o seu dever” e determinou o fim da audiência.

Antes de terminar, a magistrada ainda deu voz ao Ministério Público e aos advogados do BPP. O Ministério Público, porém, pediu que Maria de Jesus Rendeiro fosse condenada a uma multa. O advogado do BPP pediu que todo o recheio da casa fosse arrestado. A juíza ainda vai decidir.

O Expresso já tinha avançado quinta-feira que  pelo menos três destas obras foram vendidas por 229 mil euros entre março e outubro deste anos pela Christie’s, umas das leiloeiras mais conhecida do mundo: Dawidgrodeck”, “Piaski” e “Rzochów” do artista Frank Stella. Os compradores não estão identificados no site.