O número de jovens em centros educativos está em queda desde 2015, sendo que cerca de 80% desses jovens quando entra no sistema tutelar já estava a ser acompanhado pela proteção de menores em perigo, segundo dados do Relatório da Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos entregue à Assembleia da República, e revelado esta quinta-feira pelo jornal Público. O documento revela que o encaminhamento está a acontecer mais tarde do que devia e que os atrasos podem ser explicados pela “falta de comunicação ou a comunicação tardia dos factos ao Ministério Público”, pelo aumento da intervenção das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ).

O relatório indica que em muitos casos — 56% dos 80% que ingressam nos centros já estavam à guarda de uma instituição — a proteção de menores estaria responsável por “situações para as quais não foi concebida nem está vocacionada, designadamente condutas disruptivas protagonizadas por jovens com comportamentos multi-problemáticos”, cita o jornal. Em outubro de 2017, por exemplo, havia 153 jovens internados em centros educativos, o mesmo no período homólogo em 2018, 145 em 2019, 97 em 2020 e 99 em 2021.

Jovens internados em centros educativos são menos 39% do que no início da pandemia

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A diminuição do número de jovens nos centros educativos poderá estar relacionada com a também diminuição de participações de delinquência juvenil às forças de segurança, onde só em 2019 houve um aumento de 5,8% de participações. Em 2018, a descida foi de 8,7% e em 2020 de 33,4%, um número explicado pelas restrições ligadas à pandemia. A comissão admite que esse indicador possa justificar também os processos tutelares educativos instaurados que têm também diminuído. Em 2015/2016 houve 7298 inquéritos instaurados, número que diminuiu para 7215 em 2017, 6997 em 2018, 7224 em 2019 e 5204 inquéritos em 2020.

A Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos refere, no entanto, que os números não são justificados por uma eventual diminuição da delinquência juvenil, uma vez que os números apresentados contrastam com a “cada vez maior expressão pública dos fenómenos de violência juvenil, de natureza individual ou grupal, especialmente os ocorridos em meio escolar e institucional e aos praticados em ambiente digital”. Acontece que a revisão da Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Perigo levou a um aumento “exponencial” da intervenção  da CPCJ em situações de “comportamentos de perigo protagonizados por jovens”, cita o Público.

A comissão alerta para um “decréscimo acentuado da atividade tutelar educativa, em grande medida relacionada com a falta de comunicação ou a comunicação tardia dos factos ao Ministério Público com competência em matéria de família e crianças”.

O mesmo relatório refere ainda que as equipas de Reinserção Social, responsáveis por propor os internamentos em centros educativos, o fazem de “forma muito residual” e que têm apresentado “relatórios simplificados sobre a ‘personalidade do menor, incluída a sua conduta e inserção socioeconómica, educativa e familiar”, assegura a comissão aqui citada pelo Público. A apresentação destes relatórios leva, “normalmente, à aplicação de medidas não institucionais” a jovens que cometeram crimes, pelo que, nem sempre, “as medidas tutelares educativas propostas são as mais adequadas”.

A pandemia também não ajudou, uma vez que foram suspensos os prazos processuais e procedimentais, o que condicionou a atividade dos tribunais e as respetivas equipas que trabalham com eles onde estão inseridas as de Reinserção Social.

A comissão afirma que há “falta de eficácia” do sistema de proteção quando estão em cima da mesa problemas graves de comportamento, mostrando que parte considerável dos jovens que integram centros educativos já vinham de casas de acolhimento residencial, o que é “uma demonstração inequívoca de que esta medida não vem alcançando os resultados desejáveis a nível protetivo nem serve propósitos de educação para o direito.”

A Comissão critica também que a opção por medidas tutelares educativas não institucionais a jovens que cometem delitos graves e à existência de “jovens a quem de forma persistente é tardiamente aplicada a medida de internamento em centro educativo a que têm direito”.

“A não aplicação ou a aplicação tardia de medidas tutelares de internamento a jovens cuja conduta disruptiva assim o recomenda, priva-os da realização do direito fundamental ao pleno desenvolvimento, no seu tempo de infância e juventude, condenando-os muitas das vezes a vidas marginais, o que consubstancia, do nosso ponto de vista, uma violação dos direitos fundamentais das crianças e dos jovens”, refere o relatório.