“Ilusões Perdidas”

Xavier Giannoli renova com o cinema clássico francês de qualidade extraído de grandes obras literárias (neste caso, o monumental romance homónimo de Balzac, publicado em 1839), através deste minucioso e sumptuoso filme. E recusa qualquer tipo de atualização, modernização ou de cedência ao despotismo da “diversidade” ao gosto dos nossos dias, para seguir à letra a ferocíssima sátira feita ao mundo da finança, da política, da literatura, do teatro e do jornalismo (e que jornalismo corrupto, vendido e calunioso se fazia então…) da Paris dos tempos da Restauração, com algumas subtis cotoveladas aos nossos tempos (“Um dia, quem sabe, haverá um banqueiro no governo?…”, diz uma personagem a certa altura).

Balzac não poupa monárquicos, liberais nem anarquistas, e o nosso guia é o jovem e ingénuo poeta Lucien de Rubempré (um adequadíssimo Benjamin Voisin), que vem da província para Paris para procurar singrar no meio literário da capital, e rapidamente se vende, deprava e pensa que se transformou em alguém importante e influente, numa sociedade em que o dinheiro compra tudo: posição social, talento, reputações, relações, artigos, notícias e críticas nos jornais  e nas revistas, e até os aplausos e os apupos nos teatros. E onde quanto mais alto se sobe, mais rápida, humilhante e dolorosamente se pode cair. Também com Gérard Depardieu num editor todo-poderoso, mas analfabeto, Cécile de France, Jeanne Balibar na venenosa marquesa D’Espard, Xavier Dolan e Vincent Lacoste.

“O Bom Patrão”

Blanco (Javier Bardem) é o proprietário de uma empresa que fabrica balanças industriais e está à espera da visita de um comité que lhe pode atribuir um importante prémio regional de excelência. Tudo tem portanto que estar imaculado, mas sucedem-se os problemas com alguns empregados, o próprio Blanco também não está livre dos seus pecadilhos, e quanto mais tenta que as coisas estejam tão perfeitas e bem calibradas como as balanças que fabrica, mais vai percebendo que o mundo é um lugar de equilíbrios impossíveis.

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Esta comédia dramática social com muito sentido de observação do quotidiano e que não se deixa cair em maniqueísmos fáceis (é rara a personagem que não tenha falhas de carácter, seja hipócrita nem puxe pelos seus interesses) foi escrita e realizada por Fernando Léon de Aranoa (“Às Segundas ao Sol”, “Um Dia Perfeito”, “Amar Pablo. Odiar Escobar”), é a candidata espanhola à seleção ao Óscar de Melhor Filme Internacional e conta com Javier Bardem no patrão do título, ao qual o realizador, apesar dos defeitos e das sacanices da personagem, nunca nega simpatia, compreensão e humanidade. O ator incorpora e transmite umas e outras de forma tão notável e com uma calma tão olímpica, que torna Blanco enormemente verosímil e próximo de nós.

“Gritos”

Em 1996, com o primeiro filme da série “Gritos”, o realizador Wes Craven e o argumentista Kevin Wiliamson introduziram a auto-referência (hoje chamado de “meta”) no cinema de terror, e mais particularmente no “slasher”, o subgénero em que um assassino misterioso massacra adolescentes à dúzia. Não só Ghostface, o “serial killer” que telefona às suas vítimas antes de as matar joga com elas um cruel jogo envolvendo perguntas sobre fitas de terror, como as personagens do filme (e das suas três continuações) comentam os clichés do género, discutem os comportamentos (quase sempre absurdos ou suicidas) dos protagonistas perante as situações de perigo que enfrentam, e discorrem sobre as maneiras de sobreviverem ao assassino .

Este quinto filme da série, realizado por Matt Betinelli-Olpin e Tyler Gillet, e com um novo Ghostface em ação na cidadezinha de Woodsboro, consegue ser fiel à letra e ao espírito da franquia criada por Craven e Williamson, trazendo de volta as personagens originais interpretadas  por David Arquette, Courtney Cox e Neve Campbell, que se juntam a uma nova geração de adolescentes massacrados pelo “serial killer”. “Gritos” foi escolhido como filme da semana pelo Observador e pode ler a crítica aqui.