Em condições normais, e olhando para aquilo que foi o contexto em que a equipa mergulhou depois de uma primeira derrota logo a abrir a Taça das Nações Africanas com a Nigéria, o Egito estaria em “casa”. Mais do que o resultado, havia um sem número de críticas da imprensa, da Federação e até do governo às escolhas de Carlos Queiroz desde a convocatória e o facto de não ter levado algumas figuras do Al Ahly às opções táticas de apresentar um 4x3x3 sem a figura do número 10. O português foi respondendo a tudo, explicando o que tinha feito dentro da ideia que tinha para a equipa e passando ao lado da descrença que tomava conta dessas franjas por um só desaire. A competição continuou, os dias passaram e chegava agora a final.

Colocavam-nos no túmulo mas eles são os Faraós: Egito vence Camarões e Queiroz (expulso) é o primeiro português na final da CAN

Depois das vitórias pela margem mínima com Guiné-Bissau e Sudão, onde o resultado não fez jus ao domínio conseguido nos encontros, o Egito começou depois a olhar para a fase a eliminar como uma final em cada jogo. Tinha a sua estratégia, obrigava às suas adaptações táticas, colocava os seus desafios. Foi assim que os triunfos foram surgindo, com a Costa do Marfim (nos penáltis), com Marrocos (após prolongamento) e com os Camarões (nos penáltis), sempre entre planos B e soluções de última hora perante os problemas físicos que alguns elementos foram sofrendo e que obrigaram mesmo a que o terceiro guarda-redes tivesse de entrar em ação. A equipa rejuvenescida com uma nova geração de jogadores recolocava o Egito num jogo decisivo cinco anos depois e fazia da seleção a que tinha mais finais da CAN (dez, mais uma do que o Gana).

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Depois de Nelo Vingada, que ganhou a Taça Asiática pela Arábia Saudita em 1996, e de Fernando Santos, que foi campeão europeu por Portugal em 2016, os técnicos nacionais poderiam conquistar mais um troféu de seleções num outro continente. Problema? Queiroz, que levava 127 vitórias em 236 jogos em seleções A e é o único treinador no ativo com quatro qualificações para Campeonatos do Mundo, não estaria no banco. Nem ele nem o adjunto, Roger de Sá, numa novela que começou nos quartos e se prolongou pelas meias.

Salah quer, Queiroz pensa, a obra nasce: Egito vence Marrocos no prolongamento e CAN terá um português na final

Castigado 1, Roger de Sá. “Já tinham metido o meu adjunto fora. O Roger foi vítima de agressão do presidente da Federação de Marrocos. Há testemunhas, insultou-o no túnel e agrediu-o. E a decisão da CAF foi quatro jogos para o Roger e nada para o presidente de Marrocos. Outro erro: a organização comete um erro e multa um Egito 100 mil dólares por falhar uma conferência de Imprensa. Eles só se protegem a eles. De uma vez por todas, digo, e não me importo que a imprensa egípcia corte o que digo, porque corta sempre: o Egito é fraco, o que estão a fazer é porque a CAF não respeita o Egito. A CAF não respeita o Egito, desde os horários à qualidade dos relvados. Somos o Egito! Como é que este árbitro, depois do que fez no passado, pode estar na Taça das Nações Africanas? Quem entende isto? Ninguém!”, explicara Queiroz.

“Não ofendi ninguém, espero Egito feliz e África também”, diz Carlos Queiroz antes da final da CAN

Castigado 2, Carlos Queiroz. “Começou logo no balneário, ainda não tínhamos começado o jogo e ele [o árbitro] vem ao balneário intimidar o nosso staff. Foi claro o que árbitro entendeu ver ou não: faltas, tackles, agarrar ou não, divididas. E ele vem como o super homem do jogo, mostra-me o amarelo, ameaça-me… Eu tenho 44 anos de futebol, quase 70 anos de idade… quem é esta gente que me vem gritar, a mim e ao Gomaa [ex-internacional egípcio que é diretor geral]. Após 44 anos de carreira, apesar de estar na final da Taça das Nações Africanas, não vou poder desfrutar deste fantástico desafio”, dissera após as meias. “Não fiz nada que fosse ofensivo ou violento. Fiz o meu melhor para proteger os interesses da seleção do Egito. Se tiver que pagar um grande preço só porque tentei defender os interesses da minha equipa, em situações específicas em que estivemos debaixo de grande pressão e ameaças, se tiver que pagar esse preço, não me importo, fico orgulhoso, porque é pelos meus jogadores e eles merecem”, acrescentara na antecâmara da final.

Era neste contexto que chegava o desafio final para o Egito, naquele que seria um grande duelo entre dois avançados do Liverpool: Salah, capitão dos Faraós, e Sadio Mané, grande referência do Senegal que tentava o seu primeiro título de sempre depois de confirmar o favoritismo teórico com que chegava a esta edição. E era neste contexto que haveria um teste à “Spider Web Strategic”, a forma que Carlos Queiroz teria de acompanhar à distância o encontro decisivo depois de “uma punição ultrajante e injusta”. Como se viu bem nas grandes penalidades, o técnico português acompanhou de forma intensa a partida e festejou mais um castigo máximo travado por Gabaski no desempate mas acabou por não conseguir vencer o troféu.

À semelhança do que acontecera com Marrocos no jogo dos quartos, Egito começou o encontro praticamente a cometer uma grande penalidade mas desta vez Gabaski voltou a ser herói no jogo regulamentar, travando mais um castigo máximo depois de ter sido a chave no triunfo por penáltis com Costa do Marfim e Camarões. Sadio Mané falhava uma oportunidade soberana (7′), Salah não conseguiu fazer melhor nos dois lances de maior perigo no primeiro tempo em que viu outro nome grande da Premier League, Edouard Meny do Chelsea, evitar por vezes consecutivas o golo do avançado do Liverpool. O nulo mantinha-se ao intervalo, o nulo iria manter-se até aos 90′, com o Senegal a ter mais bolas e mais remates e com o Egito a manter-se fiel aos princípios de jogo em partidas a eliminar, com uma grande organização defensiva em busca de transições sobretudo a partir do momento em que Trezeguet e Zizou foram lançados por Queiroz.

As forças físicas já não eram muitas, Gabaski voltou a ter duas intervenções decisivas para segurar o nulo mas também Mendy, quando o Senegal se distraía nas transições, aparecia para salvar a equipa no final de loucos com oportunidades nas duas balizas. Ainda assim, a partida acabaria mesmo sem golos após longos 120 minutos e com a decisão a voltar à marca das grandes penalidades, onde o Egito desta vez caiu (4-2).