Sem referir o nome do líder demissionário Francisco Rodrigues dos Santos, o eurodeputado Nuno Melo formalizou este sábado a sua candidatura à presidência do CDS com um discurso focado no futuro, no qual apelou à união dentro do partido e ao regresso dos eleitores centristas que migraram para a Iniciativa Liberal ou o Chega.

“Hoje não começa a última batalha de um CDS perdido. Hoje começa a primeira batalha para um CDS renascido. É isso que aqui me traz”, começou Nuno Melo, num discurso ao fim da tarde na sede nacional do partido, no Largo do Caldas, em Lisboa.

Depois de, nas eleições legislativas de 30 de janeiro, o CDS ter obtido apenas 1,6% dos votos dos portugueses e, pela primeira vez na história, perdido a representação parlamentar, o líder dos centristas, Francisco Rodrigues dos Santos, demitiu-se, abrindo caminho a um período de renovação do partido para o qual Nuno Melo é ainda o único candidato.

“Estamos chocados em saber que o CDS não está na Assembleia da República. Mas o CDS faz falta”, afirmou Nuno Melo, que centrou o seu discurso de lançamento da candidatura em dois temas centrais: a pacificação interna do partido depois do desastre eleitoral de janeiro e a recuperação do eleitorado perdido para o resto da direita.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Tenho mesmo a certeza de que depois das eleições legislativas a maioria dos portugueses perceberam a perda inestimável que essa saída representa“, disse Nuno Melo. “Não me resigno ao facto de o espaço político que o CDS significa não estar representado neste momento na Assembleia da República.”

Objetivo: recuperar espaço perdido à direita

O eurodeputado assumiu como um dos seus principais objetivos a recuperação do eleitorado que o CDS deixou escapar para partidos como a Iniciativa Liberal ou o Chega. Segundo Nuno Melo, há muitas pessoas que historicamente votavam no CDS e que por razões “conjunturais” acabaram a votar noutros partidos desta vez. No entanto, quem o fez “nunca quis o CDS fora do Parlamento”.

O eurodeputado atirou inicialmente à Iniciativa Liberal e afirmou que a vontade do partido liderado por Cotrim de Figueiredo de se sentar entre o PS e o PSD é um “exercício de honestidade” — e mostra como as pessoas que estão “espiritualmente ligados ao CDS” e votaram na IL não se sentem representados em deputados que ficam entre o PS e o PSD.

“O CDS não faz do mercado o centro dogmático da sua existência. O CDS defende uma economia de mercado saudável, com regras, que é completamente diferente do capitalismo selvagem. Mas para o CDS as pessoas estiveram sempre em primeira lugar”, disse.

Melo visou também o Chega, que classificou como “à direita do próprio regime”, e assegurou: “Há todo esse espaço político entre o PSD e o Chega que não está representado na Assembleia da República. Esse espaço é nosso.”

Melo quer unir o partido, mas admite obstáculos pela frente

O eurodeputado centrista assumiu como desígnio central recuperar o partido depois da saída do Parlamento — e não escondeu os desafios que terá pela frente.

Teremos pela frente um caminho carregado de obstáculos. Obstáculos que devemos assumir, que fariam a maior parte dos outros desistir. Mas alguma vez no CDS nós tivemos vida fácil? Quem quer vida fácil vai para o PS ou PSD. Não está no CDS”, disse Nuno Melo.

“O primeiro dos obstáculos inevitável, saído dos resultados eleitorais das legislativas, é um obstáculo financeiro. Não podemos esconder. Mas temos de o superar. Há pessoas que trabalham há anos dando o melhor de si para que este partido exista e que percebem bem que hoje têm o seu emprego em risco. Isso provoca-nos a todos uma angústia inultrapassável“, acrescentou.

Por isso, Nuno Melo prometeu abdicar do salário de presidente do partido. “É por isso que não receberei um cêntimo de vencimento no CDS nos próximos dois anos”, diz. Se com isso ajudar a garantir “mais um ou dois postos de trabalho aqui no Largo do Caldas, sinto que estou a cumprir com a minha obrigação”, afirmou.

Importa recordar que Nuno Melo continuará, naturalmente, a receber o seu salário enquanto deputado ao Parlamento Europeu.

Novamente sem referir o nome de Francisco Rodrigues dos Santos, Nuno Melo disse que é necessário “reconciliar o CDS com o seu passado” e acabar com os conflitos internos que dilaceraram o partido nos últimos dois anos — durante os quais bancada parlamentar e direção estiveram de costas voltadas. “Não há espaço para zangas, não há espaço para exclusão, não há espaço para ajustes de contas“, disse.

O eurodeputado terminou o discurso de apresentação de candidatura com um apelo a que o CDS se adapte às “novas realidades”, passando a dar mais atenção aos assuntos ambientais e climáticos, defendendo os interesses de quem depende do salário mínimo e liderando a luta pela igualdade salarial entre homens e mulheres. “Isto é ser humanista e personalista.”