O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), Eduardo Oliveira e Sousa, alertou esta quinta-feira que, em ano de seca em Portugal, uma “situação geopolítica” como a que se vive na Ucrânia põe mais pressão no acesso a produtos agrícolas.

Num debate com o tema “A escassez hídrica em Portugal: tendências”, promovido pela Ordem dos Engenheiros, Eduardo Oliveira e Sousa afirmou que uma ” seca vai provocar uma diminuição drástica de alguns produtos e a situação geopolítica [do ataque russo à Ucrânia] pode impedir que se colmatem essas falhas no comércio externo“.

O presidente da CAP lembrou que a Ucrânia é o “principal fornecedor de milho e a Rússia é o principal fornecedor de trigo da Europa”.

O responsável lamentou que, na discussão sobre a seca, se aponte o dedo aos agricultores, referindo que houve “uma evolução abissal em termos de eficiência [do uso da água] nos últimos anos”.

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A sessão contou com uma apresentação do presidente do Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Filipe Duarte Santos, que referiu que “as observações em Portugal são consistentes com um padrão de aceleração do aquecimento global e mostram temperaturas acima da média“.

Essa alteração vem associada a uma diminuição da precipitação, até no inverno, que remete para uma “emergência, mas há várias outras emergências, como a que se iniciou esta noite”, disse, referindo-se também ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia.

Há também um fenómeno que causa a diminuição de chuva na Península Ibérica — a deslocação do anticiclone dos Açores para o norte da Europa, que provocaprecipitação em quantidades brutais no Reino Unido, na Noruega” e noutros países naquela região.

Eduardo Oliveira e Sousa viu neste dado uma oportunidade, chegando mesmo a sugerir um “aqueduto para trazer a água da Dinamarca, da Alemanha ou da Finlândia para trazer água para a Península Ibérica“.

Mas há outras soluções que são bem-vindas, como a dessalinização, que, apesar de produzir água imprópria para rega, pode libertar água que seria utilizada para consumo urbano, a reutilização de águas residuais tratadas e a “possibilidade de construir mais reservas”.

O secretário-geral do Conselho Nacional da Água, Joaquim Poças Martins, lembrou que “uma barragem pensada agora, só daqui a 10, 15 anos é que está feita” e sugeriu “usar melhor” as que o país dispõe.

Para o especialista, “regar produtos de baixo valor acrescentado com água cara” não é solução.

Francisco Ferreira, da associação ambientalista Zero mostrou-se “sensibilizado” com a falta de alimentos para os animais, mas frisou que o país tem “60% da produção dos cereais, exceto arroz, para alimentação animal”.

“Será que, numa alimentação futura, vamos de ter um peso tão grande na agropecuária?”, questionou.

O especialista defendeu um novo plano nacional para o uso eficiente da água e alertou que sempre que se criam novas reservas estratégicas de água, são acrescentados novos usos”, deixando o repto de “pensar nesta ideia de não continuar de forma avassaladora a criar novas necessidades”.

No debate que aconteceu esta quinta-feira online e no auditório da sede da Ordem dos Engenheiros, em Lisboa, participaram também o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o bastonário da Ordem dos Engenheiros, Carlos Mineiro Aires, e os especialistas Rodrigo Proença de Oliveira e António Carmona Rodrigues.