Israel terá impedido a Ucrânia de adquirir o polémico software de ciberespionagem Pegasus, desenvolvido pela firma israelita NSO Group, com medo de enfurecer a Rússia ao vender uma poderosa ferramenta de espionagem a um país inimigo.

A informação é avançada pelo jornal britânico The Guardian e pelo jornal norte-americano The Washington Post, que fizeram uma investigação conjunta sobre o assunto.

De acordo com aqueles jornais, Israel recusou vender o Pegasus à Ucrânia para evitar uma reação negativa por parte da Rússia, uma revelação que demonstra como as relações entre Telavive e Moscovo prejudicaram a capacidade militar da Ucrânia — mesmo sabendo que isso vai contra as prioridades estratégicas dos EUA, aliados de Israel e alinhados com a Ucrânia.

Pegasus. O vírus israelita que invadiu os telemóveis de jornalistas e ativistas de todo o mundo e que até o filho de Bolsonaro quis comprar

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Citando fontes conhecedoras do processo, o The Guardian e o The Washington Post explicam que, pelo menos desde 2019, a Ucrânia tentou que Israel lhe vendesse o software de ciberespionagem, mas o governo israelita impediu a NSO Group de o vender ao governo de Kiev.

O Pegasus é uma das ferramentas de ciberespionagem mais sofisticadas do mundo. Desenvolvido em Israel, já foi usado por vários países do mundo para vigiar jornalistas, opositores políticos e suspeitos de crimes.

Na prática, o Pegasus funciona como um vírus que é descarregado para o telemóvel do alvo através de um clique (muitas vezes não-intencional) numa ligação enviada por alguma plataforma de comunicação. A partir daí, é possível obter informações detalhadas sobre as comunicações do alvo — embora a empresa negue veementemente que o software possa ser usado para espiar os cidadãos.

A Hungria, por exemplo, admitiu em novembro ter adquirido o software para espiar opositores e jornalistas. Mas outros casos também se tornaram do conhecimento público, incluindo o uso do Pegasus contra independentistas catalães em Espanha. Nos Estados Unidos, o FBI também assumiu ter adquirido o Pegasus, mas apenas para testes com o objetivo de conhecer as potenciais ameaças do software.

De acordo com as fontes ouvidas pelo The Guardian e pelo The Washington Post, a NSO Group, que é tutelada pelo Ministério da Defesa de Israel, recebe do governo israelita autorização para mostrar o Pegasus a um governo estrangeiro — e, depois, precisa da autorização de Telavive para a venda do software.

No caso ucraniano, Israel impediu a NSO de avançar com a venda do Pegasus a Kiev. Segundo as mesmas fontes, Telavive receava enfurecer Moscovo e pôr em causa as relações de proximidade com a Rússia, úteis a Israel no contexto do Médio Oriente (Israel precisa, neste momento, por exemplo, que a Rússia assine o acordo nuclear relativo ao Irão).

Dar à Ucrânia a capacidade para visar alvos russos com o poderoso Pegasus poderia ser visto por Moscovo como um ato de agressão, disseram aquelas fontes aos dois jornais.

Não terá sido, aliás, a primeira vez que um cenário destes aconteceu. Em 2019, a NSO terá proibido a Estónia — um país membro da NATO que adquiriu o Pegasus — de usar o software contra alvos russos.