A orgânica do novo Governo confirma a integração no mesmo ministério, o da Energia e do Ambiente, de um modelo que foi lançado por Passos Coelho, quando Moreira da Silva assumiu a pasta, e que António Costa retomou na remodelação de 2018. Mas se esta opção faz sentido numa agenda política e económica dominada pela transição energética, já a junção numa mesma secretaria de Estado, novidade trazida por esta nova orgânica, levanta reservas nos meios de defesa do ambiente.

O presidente da associação ambientalista Zero até defende que energia e ambiente devem ficar no mesmo ministério. Mas Francisco Ferreira desconfia do que qualifica de uma “excessiva proximidade” entre duas áreas que prosseguem interesses distintos e várias vezes são contraditórios. Exemplifica com a junção no mesmo responsável da avaliação de impacte ambiental, uma responsabilidade da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) que atualmente está debaixo da secretaria de Estado do Ambiente, e da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), a entidade que tem o setor energético e mineiro e que está na tutela do secretário de Estado da Energia.

O dirigente ambientalista sublinha que é normal os secretários de Estado com as tutelas setoriais trazerem argumentos diferenciados para a discussão ou decisão sobre um tema ou projeto e considera que essa diversidade de pontos de vista é positiva. Cabe ao ministro muitas vezes fazer a conciliação. Com um único secretário de Estado para as duas áreas mais importantes do ministério que vai passar a ser liderado por Duarte Cordeiro perde-se essa dinâmica. Esta “proximidade era de evitar”, defende. Ainda que o ministro possa assumir diretamente a tutela de algumas áreas ou organismos que estão hoje divididos pelos secretários de Estado da Energia e do Ambiente.

Duarte Cordeiro. Dos ambientadores a ministro do Ambiente (com muito PS pelo meio)

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Outra reserva que suscita tem a ver com a enorme quantidade de assuntos e decisões que seria concentrada numa só pessoa. A energia é uma das pastas setoriais mais sensíveis do Governo e talvez a mais exigente no atual contexto de crise energética. As áreas cobertas pelo ambiente vão desde a gestão de recursos hídricos ao tema sensível da seca à avaliação ambiental, passando pela gestão de resíduos. São demasiados temas para um secretário de Estado que “será na prática um ministro”, sublinha Francisco Ferreira numa altura em que ainda não é oficial se João Galamba se manterá na pasta da energia, passando a acumular a do ambiente.

Para além da supersecretaria de Estado, o Ambiente terá mais duas secretarias de Estado, o da Conservação da Natureza e Florestas e o da Mobilidade Urbana.

O presidente da Zero reconhece contudo que a junção das duas pastas também pode trazer aspetos positivos ao nível de uma melhor coordenação entre as duas pastas.

Essa é precisamente uma das matérias valorizadas do lado do setor energético. O presidente da REN (Redes Energéticas Nacionais) acredita que juntar as duas entidades pode ajudar, já que são áreas críticas para as grandes decisões do setor. Durante a conferência de imprensa dos resultados anuais, Rodrigo Costa defendeu que tudo o que facilite a comunicação é positivo, alertando ainda para a complexidade do licenciamento dos projetos que esta “mudança pode ajudar”.

A REN tem investimentos pendentes de autorização ambiental da APA, nomeadamente no que toca a ligações a novos centros de produção renovável, mas também ao nível das interligações. Ainda no setor da energia, há vários projetos de construção de centrais fotovoltaicas que têm de passar na avaliação de impacte ambiental. Por este crivo passam também os projetos de pesquisa e exploração de lítio e outros minérios, devendo estar para muito breve o anúncio sobre a decisão da APA em relação à primeira mina prevista para Boticas.