A guerra da Ucrânia e as sanções progressivas contra a energia russa estão a promover uma nova geografia para o circuito de compra e venda de petróleo a nível mundial.
Mesmo antes do embargo oficial da União Europeia, cujas negociações ao nível político só chegaram a bom porto no final de segunda-feira, as vendas ao bloco ocidental já foram seriamente afetadas desde o início da invasão. Em primeiro lugar pelo efeito dos embargos anunciados logo em março por Estados Unidos e Reino Unido, mas também devido aos boicotes privados decididos por várias empresas importadoras de crude e produtos refinados como a portuguesa Galp.
O petróleo russo continua a atrair compradores, sobretudo quando tem vindo a negociar com um desconto considerável face ao preço médio nos mercados de Londres e Nova Iorque. De acordo com a agência Reuters, que cita dados da Agência Internacional de Energia, as exportações russas recuperaram em abril o nível pré-invasão depois do primeiro embate. E um dos grandes clientes é, sem surpresa, a China. De acordo com a Vortexa Analytics, citada pela Reuters, as importações chinesas de petróleo por mar devem saltar para mais de um milhão de barris por dia em maio, face 750 mil barris diários adquiridos no primeiro trimestre de 2022.
Segundo a Reuters, um dos maiores compradores é a Unipec, empresa de trading do grupo estatal chinês Sinopec que é a parceira da Galp Energia na exploração e produção de petróleo e gás no Brasil, em cuja unidade tem 30%. De acordo com traders citados pelas agências internacionais, o petróleo russo chega a um preço convidativo de até quase 30 dólares de desconto face à produção do Médio Oriente, África e Estados Unidos. Outros países asiáticos estão entre os compradores deste petróleo. De acordo com a informação dada pelo presidente da Petro-Logistics, Mark Gerber, à Reuters, o fluxo do petróleo russo com destino à Ásia aumentou pelo menos 50%.
Estes números tiram alguma força ao embargo europeu às compras de petróleo já que a Rússia está já a conseguir fintar as restrições às exportações de energia, ainda que recebendo abaixo do preço de mercado. A Índia tem sido outro cliente preferencial.
Não obstante, os novos destinos não chegam para escoar todo o petróleo russo que era vendido à Europa. As exceções ao embargo acordadas para países sem acesso ao mar e terminais portuários — Hungria, Chequia e Eslováquia — representam uma parcela pequena das importações europeias. A capacidade das refinarias da Índia já está perto do limite e a China abrandou as compras por causa dos confinamentos que afetaram a produção industrial. Há também efeito dissuasor das sanções europeias para os armadores de petroleiros não russos.
Para deixar cair as compras à Rússia, a Europa está a reforçar as suas aquisições em mercados alternativos. Á África ocidental, sobretudo Nigéria, Angola e Camarões aumentaram as suas vendas para o mercado europeu em cerca de 17%, ao mesmo tempo que estão a reduzir os envios para a Índia, segundo os dados Petro-Logistisc citados pela Reuters. A Europa está também a reforçar as aquisições junto do Norte de África e a Arábia Saudita. Tal como no gás natural, a fuga europeia ao petróleo russo está ainda a ser aproveitada pelos Estados Unidos com um crescimento das vendas.
A guerra na Ucrânia não está apenas a mudar a geografia dos compradores e fornecedores. O circuito e modelo de transporte também. Os petroleiros russos deixaram de ser bem vindos nos portos ocidentais, nomeadamente no Báltico e Mar do Norte, onde eram realizadas as descargas de crude entre barcos. A rota passa agora mais pelo Mediterrâneo e pelo canal do Suez com a transferência do petróleo a ser feita diretamente de barco para barco e não em portos. Este é um processo mais caro e que representa um risco acrescido de derrames durante as operações.