Era um anúncio esperado desde o dia 30 de maio, altura em que se soube que o governo brasileiro tinha enviado um pedido oficial a Portugal para a trasladação temporária do coração de D. Pedro IV, no âmbito das cerimónias do bicentenário da independência do Brasil. Esta quarta-feira, Rui Moreira, autarca do Porto, chegou ao Salão Nobre dos Paços do Concelho, junto ao retrato de D. Pedro, e ao lado do púlpito colocou uma caixa de madeira com as cinco chaves que guardam o coração, depositado na Igreja de Nossa Senhora da Lapa, para dizer que autoriza o transporte daquele que considera ser “o tesouro da cidade”.

Rui Moreira começou por explicar que após o pedido surgiram preocupações quanto à vulnerabilidade da trasladação do coração para o Brasil, por isso mesmo contactou o Presidente da República e o Reitor da Universidade do Porto e decidiu solicitar ao Instituto de Medicina Legal uma peritagem que avaliasse as condições do coração, com o intuito de aferir o seu estado e se podia ser efetivamente transportado.

O Instituto de Medicina Legal constituiu uma equipa de cinco peritos, envolvendo um conjunto de investigadores da Universidade do Porto, nomeadamente da Faculdade de Medicina e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), das áreas da anatomia, medicina legal, da genética e da biologia forense, e realizaram um exame de mais de cinco horas no passado dia 31 de maio.

“O relatório da perícia ainda não está totalmente concluído, mas já nos foi assegurado que o coração poderá ser trasladado temporariamente para o Brasil, mediante a exigência de um transporte em ambiente pressurizado”, revelou Rui Moreira, acrescentando que será o próprio a acompanhar o transporte, assegurado pela Força Aérea Brasileira, realçando que todos os custos associados a esta operação ficarão a cargo do Brasil.

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“Irei assegurar que o vaso onde se encontra o coração seja devidamente selado, bem como um conjunto de garantias legais que terá de ser apresentadas ao Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, pois será exigido um compromisso de estado entre os dois países.”

A caixa com as chaves que guardam o coração de D. Pedro, geralmente guardadas na secretária do presidente da Câmara Municipal do Porto

Apesar de não saber exatamente quanto tempo o coração permanecerá no Brasil, o autarca do Porto acredita que “não ficará mais de um ano” e considera “muito provável” que chegue ao outro lado do Atlântico já em setembro. “Haverá uma comemoração em Brasília a 8 de setembro e o Presidente República estará presente e, certamente, nessa data o coração já lá estará.”

Questionado sobre o risco associado à viagem, Rui Moreira recorda que “não há viagens sem riscos” e sublinha que os acidentes aéreos “são raros”. “Não vamos levar o coração num contentor ou na mala do presidente da câmara. Estas coisas não são inéditas, há exposições que circulam para vários museus de avião, mas riscos existem sempre. Ainda assim, a prudência está garantida.”

Já sobre o facto de o assunto ser levado a discussão ao executivo municipal, o independente não teme opiniões divergentes. “Esta é uma competência minha que entendo que deverei levar ao executivo, mas não temo nada. Tenho a certeza que a cidade entenderá que esta é a melhor forma de nos associarmos à independência do Brasil.

Antes de morrer, a 24 de setembro de 1834, o rei D. Pedro IV manifestou, junto da imperatriz D. Amélia, o desejo de que o seu coração fosse entregue ao Porto como prova de reconhecimento da lealdade, resiliência e devoção dos portuenses à causa liberal durante o Cerco do Porto (1832 – 1833) e da intensa relação que criou com a cidade. Ficou decidido que o coração do rei ficaria depositado na capela-mor da Igreja da Lapa, num sarcófago protegido por cinco chaves que se encontram habitualmente guardadas na secretária do presidente da Câmara Municipal do Porto.