As dificuldades nas cadeias de abastecimento globais explicam 40% a 50% das pressões inflacionistas na zona euro, argumenta um estudo académico apresentado esta quarta-feira no Fórum Anual do BCE, em Sintra. Nos EUA, de acordo com o mesmo estudo, os problemas no comércio internacional justificam uma percentagem menor (30%) da inflação, já que aí os programas de estímulo orçamental – que incluíram cheques enviados aos cidadãos – terão tido um impacto maior.
No dia em que foi conhecido que a taxa de inflação superou os 10% em Espanha, Gabriel Felbermayr, diretor do Instituto Austríaco de Pesquisa Económica, veio suportar com a sua pesquisa económica a ideia de que o impacto das subidas da taxa de juro terá sempre um efeito limitado na contenção das pressões inflacionistas, já que quase metade da inflação se explica por fatores que não são sensíveis à política monetária.
“Os choques externos e as dificuldades nas cadeias de abastecimento tiveram um papel relativamente maior, em comparação com os choques sobre a procura interna, ao explicar a inflação na zona euro 2020-2021”, afirmou Gabriel Felbermayr, acrescentando que “nos EUA aconteceu o contrário“.
Os dados suportam aquilo que Christine Lagarde afirmou na terça-feira, também em Sintra, quando tentou relativizar as pressões inflacionistas (e o papel que a política monetária pode ter nessa matéria) e afirmou que “não estamos a enfrentar uma situação normal de procura excessiva generalizada ou sobreaquecimento”. O investimento continua “condicionado” e, “apesar do aumento dos gastos em serviços, o consumo privado na zona euro continua 2% abaixo do nível pré-pandémico”, sublinhou Lagarde.
É preferivel errar por estímulos a menos do que a mais, diz Fed de Cleveland
Na mesma manhã de debate, num painel sobre inflação, a presidente da Reserva Federal de Cleveland, Loretta Mester, sustentou que os bancos centrais devem ser “determinados” na missão de conter a subida dos preços, reconhecendo que problemas nas cadeias de abastecimento globais, como os que vivemos atualmente, podem “ameaçar a estabilidade das expectativas de inflação”, o que “obriga a uma intervenção por parte dos responsáveis pela política monetária”.
Ainda assim, sendo difícil medir com exatidão o que são “expectativas de inflação” e a forma complexa como este fenómeno se enraiza nas economias, Mester defendeu que é mais perigoso assumir que as expectativas de inflação estão bem “ancoradas” quando não estão do que, em contraponto, assumir que a subida dos preços está descontrolada (e agir em conformidade) quando esse fenómeno até nem estava a acontecer.
O primeiro cenário é mais perigoso porque, defendeu a responsável da Fed de Cleveland, corrigir um erro de análise no primeiro caso “tem mais custos” do que ajustar a política caso se confirme a segunda situação. Os bancos centrais “não podem ser complacentes quando as expectativas de inflação de longo prazo estão a subir”, defendeu Loretta Mester, que tem direito de voto no Comité de Operações no Mercado Aberto (FOMC), o organismo que decide a política monetária dos EUA.