O ano de 2021 foi marcado pela intensificação da violência contra os povos originários do Brasil, com 305 casos de invasões de terras indígenas, exploração ilegal de recursos e danos ao património, informou esta quarta-feira o Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Segundo o relatório “Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil — dados de 2021”, o aumento de invasões e ataques contra comunidades e lideranças indígenas e o acirramento de conflitos refletiram, nos territórios, o ambiente institucional de ofensiva contra os direitos constitucionais dos povos originários.

Em 2021, o Cimi registou 305 casos de invasão ilegal, que atingiram pelo menos 226 Terras Indígenas (TIs) em 22 estados do país.

No ano anterior, 263 casos de invasão haviam afetado 201 terras em 19 estados. A quantidade de casos em 2021 é quase três vezes maior do que a registada em 2018, quando foram contabilizados 109 casos.

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Em seu terceiro ano, o Governo [do Presidente brasileiro] Jair Bolsonaro manteve a diretriz de paralisação das demarcações de terras indígenas e omissão completa em relação à proteção das terras já demarcadas (…) A consequência dessa postura foi o aumento, pelo sexto ano consecutivo, dos casos de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao património”, frisa o relatório.

“Além do aumento quantitativo de casos e terras afetadas pela ação ilegal de garimpeiros [mineradores], madeireiros, caçadores, pescadores e grileiros [pessoas que se apropriam de terras públicas], entre outros, os invasores intensificaram sua presença e a truculência de suas ações nos territórios indígenas. Essa situação ficou explícita em casos como o dos povos Munduruku, no Pará, e Yanomami, em Roraima e Amazonas”, acrescenta o documento.

O Cimi denunciou que na Terra Indígena Yanomami, onde é estimada a presença de mais de 20 mil mineradores ilegais, os invasores passaram a realizar ataques armados sistemáticos contra as comunidades indígenas, espalhando um clima de terror e provocando mortes, inclusive de crianças.

“Os ataques criminosos, com armamento pesado, foram denunciados de forma recorrente pelos indígenas — e ignorados pelo Governo federal, que seguiu estimulando a mineração nestes territórios. Os garimpos [área de mineração ilegal] serviram como vetor de doenças como a Covid-19 e a malária para os Yanomami”, lê-se no relatório.

Além das invasões, houve um aumento em 15 das 19 categorias de violência sistematizadas pela publicação em relação ao ano anterior, e uma quantidade enorme de vidas indígenas interrompidas.

Ocorreram 176 assassínios de indígenas — apenas menos seis do que em 2020, que registou o maior número de homicídios desde que o Cimi passou a contabilizar este dado com base em fontes públicas, em 2014.

Já o número de suicídios de indígenas em 2021 chegou a 148, o maior registado num ano.

A situação é particularmente alarmante nas áreas que abrigam povos indígenas isolados, ou seja, grupos que vivem na floresta e optaram por não ter contacto com a sociedade branca ou não indígena.

Segundo o Cimi, as invasões atingiram pelo menos 28 territórios onde há presença de povos indígenas isolados, colocando a própria existência desses grupos em risco.

Essas áreas concentram 53 do total de 117 registos de povos isolados mantidos pela Equipa de Apoio aos Povos Indígenas Livres do Cimi.

Destas, 11 áreas foram afetadas por casos de mineração ilegal, pelo menos sete pela atuação de caçadores e pescadores ilegais, 12 pela ação ilegal de lenhadores em ações de desflorestamento.